Produtor da peça de 'Harry Potter' é acusado de atrasar pagamentos após audições

O empresário Vinícius Munhoz, fundador da VME, uma produtora de shows e espetáculos de teatro, foi acusado de atrasar os pagamentos de quatro pessoas que trabalharam na pré-produção e nas audições da versão brasileira da peça "Harry Potter e a Criança Amaldiçoada", cancelada após conflitos entre a VME e a produtora britânica, dona dos direitos da obra.

Três delas foram registradas no Sated, o Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões de São Paulo, e dois dos casos já foram quitados. Munhoz, que não respondia ou demorava a responder às tentativas de contato dos denunciantes, foi cobrado pela entidade. Uma quarta pessoa, que foi à Justiça cobrar o pagamento por serviços de marketing, recebeu parte do acordo que firmou de forma extrajudicial com a VME.

O Sated diz ainda que o produtor não firmou contratos trabalhistas, tendo convidado os funcionários por meios informais, como WhatsApp —praxe para trabalhos de curta duração. Segundo o sindicato, um dos pagamentos, de R$ 5.000, foi atrasado em mais de um mês, e concluído apenas após a interferência da entidade.

Procurado por email, WhatsApp e no Instagram, Munhoz não se manifestou até a publicação deste texto. Em suas redes sociais, ele não comentou o cancelamento da peça e apenas tem divulgado um espetáculo de ilusionismo da sua produtora.

Rita Teles, presidente do Sated, afirma que, para além dos atrasos, o problema está na forma como a VME comunicou o cancelamento da peça aos atores que estiveram nas audições. Após deixá-los no escuro por dois meses, a produtora enviou um email na terça-feira da semana passada informando que a peça não aconteceria mais, na mesma tarde em que a Folha confirmou o fim da produção.

"Os atores podem ter reservado suas agendas na expectativa pela peça e perdido trabalhos que surgiram nesse meio-tempo. Muitos vieram de outros estados do país, e tiveram de pagar não só a viagem, mas também hospedagem", diz Teles.

Nas audições, além das cenas, houve ainda testes de voo, com atores presos em cabos. Em um deles, que exigiriam uma norma do Ministério do Trabalho, segundo o Sated, um ator caiu e machucou a língua.

Munhoz é considerado uma espécie de prodígio pelo setor. Tendo trabalhado antes em espetáculos como "Matilda" e "A Noviça Rebelde", ele criou a VME, sua primeira produtora, aos 30, no ano passado, e logo anunciou que traria "Harry Potter" ao Brasil, que exigiria uma tecnologia mais avançada que a disponível no país para esse tipo de produção.

As audições aconteceram em janeiro, no colégio Rio Branco, centro da cidade. Se inscreveram para o processo atores como Hugo Bonemer, escolhido para interpretar o bruxo Harry Potter, e Adriana Lessa, antiga apresentadora do programa TV Fama, que faria a personagem Hermione.

O Sated acompanhou um dia de audições a convite de Munhoz. O objetivo dele era mostrar que tudo corria dentro dos conformes já que, dias antes, o sindicato havia publicado uma nota de repúdio sobre problemas nas audições do espetáculo "Hair". Representantes do Sated que viram os testes atestam que tudo corria mesmo bem, mas não saibam que não havia contratos formais de trabalho.

O processo envolveu cerca de 17 funcionários, entre eles diretores de elenco, assistentes de palco, e coordenadores de marketing, incluindo nomes estrangeiros, como diretor da peça na Broadway.

A ideia era de que "Harry Potter e a Criança Amaldiçoada" estreasse neste ano e ficasse em cartaz até 2027, com exibições de terça-feira a domingo, no Teatro Renault, o que também gerou problemas. Como o espaço é tombado, sua fachada não poderia ser adaptada com elementos da produção.

A montagem custaria em torno de R$ 200 milhões, sendo que R$ 10 milhões seriam captados via Lei Rouanet. A maior parte do investimento viria do Banco do Brasil. Em nota, a instituição disse que "faz parte da rotina do Banco do Brasil avaliar projetos que reforçam os territórios da marca, e que neste caso específico optou por não concluir o patrocínio".