Insuficiência socioeconômica multidimensional

há 6 horas 2

Imagine viver em um lugar onde o acesso à saúde, educação e até mesmo à água potável não seja garantido. Agora, imagine que essa realidade não se resume apenas à falta de dinheiro, mas a uma teia de privações que afeta sua vida cotidiana. Essa é a insuficiência socioeconômica —um fenômeno que vai além do conceito tradicional de pobreza e desigualdade e que tem ganhado contornos preocupantes no Brasil.

Foi pensando nisso que criamos o Observatório ISM, uma iniciativa dedicada a investigar e divulgar esse fenômeno, com a participação de professores e estudantes de economia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). O nome pode soar técnico, mas a missão é simples: traduzir números e estatísticas em histórias compreensíveis. Afinal, quem nunca ouviu falar de alguém que, mesmo trabalhando ou recebendo alguma renda, não consegue garantir condições dignas de vida?

O principal instrumento do Observatório é o Índice de Insuficiência Socioeconômica Multidimensional (IISM), que mede o grau de privação em várias dimensões essenciais para a vida em sociedade. Quanto mais próximo de um, maior a insuficiência socioeconômica; quanto mais perto de zero, menor. Diferente do conceito tradicional de pobreza, que costuma ser associado apenas à renda, o IISM revela uma realidade mais ampla: famílias que enfrentam dificuldades para acessar serviços básicos, como escolas, água tratada, energia elétrica, ou que vivem em moradias precárias, sem coleta de lixo ou saneamento básico.

Nos últimos anos, crises econômicas, sociais e sanitárias —como a pandemia de Covid-19— destacaram a urgência de compreender a insuficiência socioeconômica. Ela não é estática; muda conforme a sociedade se transforma. E, para combatê-la, é preciso enxergá-la com clareza.

Os dados do Observatório mostram uma realidade preocupante: a insuficiência socioeconômica multidimensional atinge regiões, gêneros e raças de maneira desigual. No Nordeste, por exemplo, os índices são mais altos, enquanto mulheres e pessoas negras enfrentam privações ainda maiores em todas as dimensões. Esses números representam vidas reais, histórias de quem luta diariamente contra a insuficiência de acesso ao mínimo necessário para garantir dignidade.

Nosso objetivo não é apenas mapear a insuficiência socioeconômica, mas também transformá-la em um debate público qualificado. Por meio do nosso site e redes sociais, compartilhamos descobertas com formuladores de políticas públicas, ativistas e a população. Como construir um país mais justo sem conhecer as raízes dos nossos problemas?

Queremos incentivar a pesquisa sobre o tema e, para isso, deixamos uma reflexão: será que estamos conscientes do real nível de privação e da desigualdade que afeta nossa vida cotidianamente? Talvez seja hora de ampliar nossa visão e enxergar não apenas a falta de dinheiro, mas também a insuficiência de acesso a oportunidades, direitos e dignidade. O Observatório ISM está aqui para nos ajudar nessa jornada — e, quem sabe, inspirar soluções que realmente façam diferença.

O editor, Michael França, pede para que cada participante do espaço "Políticas e Justiça" da Folha sugira uma música aos leitores. Nesse texto, a escolhida por Cassiano Trovão e Rafael Montenegro foi "É Fim de Mês", de Raul Seixas.

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