Numa indústria que deixa bem clara a divisão entre grupos femininos e masculinos, a do k-pop, o Kard surge com uma proposta diferente. O quarteto mistura integrantes mulheres e homens, que cantam e dançam juntos no palco. Atualmente, eles são os únicos em atividade nesse formato com carreira consolidada.
O grupo misto, fundado há oito anos, vem ao Brasil pela quinta vez para show em São Paulo, no dia 17 de janeiro, três anos após a última passagem. A relação do Kard com o país é de longa data: eles se apresentaram por aqui antes mesmo de debutarem oficialmente na Coreia do Sul, em 2017.
Menos de um ano depois, em 2018, o quarteto formado por J.Seph, BM, Somin e Jiwoo retornou. Vieram em 2019 e em 2022 e já visitaram São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza, Recife, Porto Alegre, Curitiba, Brasília, Salvador e Belo Horizonte, em shows ou sessões de autógrafos.
Depois de tantas viagens pelo Brasil, os ídolos de k-pop já conhecem bem a cultura. "As pessoas são muito amigáveis e o churrasco é delicioso", disse BM à Folha durante uma das turnês. O rapper de 32 anos tem uma relação ainda mais especial com o país –seu pai foi naturalizado brasileiro quando morou aqui. Ele, que nasceu nos Estados Unidos, até fala um pouco de português.
A gravadora que os lançou, DSP Media, apostou em criar uma base de fãs no Brasil e em outros países da América do Sul, que aceitariam melhor a mistura de gêneros, e com quem flertam na música.
O quarteto combina ritmos latinos ao pop sul-coreano, como em "Hola Hola", canção de estreia, e "Ring the Alarm", single de 2022, que trazem influências do reggaeton e moombahton. Eles até cantam trechos em espanhol, como em "Dímelo" e "Red Moon". Com frequência, fazem covers de músicas brasileiras.
O Kard conseguiu fazer sucesso com o público ocidental, mas não deslanchou na terra natal, apesar do talento e das turnês internacionais no currículo.
Um dos motivos pode ser o preconceito com grupos mistos, segundo J.Seph, 32. "No entanto, acho que conseguimos quebrar esse preconceito através das músicas e performances. Só de ver vários hidden cards [nome do fã-clube] irem aos nossos shows, ele já está sendo quebrado", diz o rapper.
Grupos que unem homens e mulheres são raros nessa indústria. Outros foram criados antes, mas não duraram muito tempo. Para formar as bandas de k-pop, os integrantes treinam por anos e costumam dividir quartos no mesmo dormitório, para facilitar acompanhar a agenda puxada. Até atingirem a fama, eles continuam a morar juntos.
Qualquer interação entre artistas homens e mulheres, no entanto, pode acender rumores de namoro, algo mal visto pelos fãs.
"Existem aspectos culturais na sociedade coreana que ditam ‘regras’, entre elas, a de não existir amizade entre pessoas de sexo oposto", explica um fã-clube brasileiro do Kard. "Além disso, a indústria do k-pop tem como objetivo criar homens e mulheres que são modelos de namorados/namoradas para os fãs. Se tem um grupo misto, no qual é possível criar essa química de casal, isso acaba afastando os fãs coreanos."
Essa segregação também aparece entre os fãs. Na Coreia do Sul, o esperado é que homens acompanhem girlbands, e que garotas torçam por boybands.
A cantora e rapper Jiwoo, 28, afirma que são frequentes as perguntas sobre se eles namoram. "Ou se temos uma quedinha por alguém. Só que não. É difícil aceitarem que somos apenas um grupo trabalhando e que nos damos bem. Não somos casais."
Somin, 28, a vocalista principal, conta que, como os quatro passam muito tempo juntos, ela não pensa nas inconveniências. "A vantagem de sermos um grupo misto é que a coreografia sexy ou poderosa pode criar uma sinergia entre os membros masculinos e femininos", diz.
O desafio do Kard é justamente criar equilíbrio sem reforçar estereótipos de gênero, como só as garotas terem de dançar de forma sexy. Quando tem que rebolar, os garotos também rebolam.
Poucas semanas antes da apresentação em São Paulo, o quarteto lançou o single "Detox". Outra música recente, que vai aparecer no setlist, é "Tell My Momma", com clipe inspirado no filme "Saltburn".
O Kard abre a agenda de shows de k-pop no Brasil em 2025 com a turnê "Where To Now?". Ainda há ingressos à venda.
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