Análise: Em Berlim, Osesp se assume como uma orquestra modernista

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O Musikfest de Berlim abre sua programação 2024 neste sábado (24) com um concerto da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, a Osesp.

Ainda mais importante do que participar do festival de verão europeu —momento mais despojado e descontraído do ano, quando as temporadas regulares entram em prolongadas férias—, tocar para o público alemão na sede da cultuada Orquestra Filarmônica de Berlim é um momento para se guardar na memória.

A turnê europeia da orquestra paulista é breve: começou sábado passado (17) em Santander, na Espanha, seguiu para Edimburgo, na Escócia, onde tocou na segunda-feira, passou por Amsterdam, na Holanda (na quarta) e, já na Alemanha, em Wiesbaden (na quinta), para fechar sábado em Berlim. Decolaram do Brasil 124 pessoas (sendo 110 músicos), juntamente com cinco toneladas de instrumentos e equipamentos.

Turnês contribuem para a evolução de um grupo musical. Os dias passados juntos na estrada, os ensaios extras, a experiência com diferentes públicos e acústicas, tudo colabora para que, na volta à Sala São Paulo, a qualidade musical se intensifique.

Esta é a sétima vez que a Osesp vai à Europa, tendo se apresentado anteriormente lá em 2003 e 2007, quando era dirigida por John Neschling, em 2010 sob a regência de Yan Pascal Tortelier —com performances memoráveis no Musikverein de Viena e na Grande Sala do Mozarteum de Salzburg. Em 2013 e 2016, sob a condução de Marin Alsop, que a levou ao Festival de Lucerna, ao londrino BBC Proms e à própria Philharmonie de Berlim, .

A presente tour é, portanto, a primeira viagem internacional sob o comando de Thierry Fischer, regente titular e diretor musical da orquestra desde 2020. Como é natural nesses casos, há diferentes peças sendo alternadas nos programas, segundo as necessidades e características de cada local.

No programa de Berlim, a Osesp se assume totalmente como uma orquestra "do século 20" e "americana" —no sentido mais amplo da expressão, a saber, o de se identificar como uma voz importante da música de todas as Américas. Obras do alto romantismo, como a "Sinfonia Alpina" de Richard Strauss, especialidade da orquestra, presentes em outros concertos da turnê, não entram na programação de Berlim.

Com o cancelamento da violinista Hilary Hahn por motivos de saúde —ela seria a solista ao longo da turnê —, os solos dos programas foram divididos entre dois nomes: Daniel Lozakovich ficou responsável pelo "Concerto nº 3" de Saint Saëns (tocado em Amsterdam e Wiesbaden), e Roman Simovic foi escolhido como intérprete do "Concerto para violino" op.30 de Alberto Ginastera (programado para Edimburgo e Berlim).

Antes de Simovic atacar o "Concerto" composto em 1963 pelo argentino Ginastera, obra virtuosística, de caráter primitivista, com a cara do sul da América do Sul, a orquestra tocará a macabra e surpreendente "Central Park in the Dark" (de 1906), do americano Charles Ives.

A segunda parte abre com uma obra central do modernismo brasileiro, "Uirapurú", composição de 1917 de Heitor Villa-Lobos, com sua criativa evocação da floresta tropical, seus pássaros, cores, lendas e mistérios. O programa fecha com a ruidosa "Amériques" (na versão de 1929), que o francês Varèse escreveu ao chegar nos Estados Unidos, repleta de sirenes, fragmentos e blocos de sons urbanos.

A Grande Sala da Philharmonie de Berlim comporta cerca de 2.400 pessoas na plateia. Com projeto de Hans Scharoun, foi inaugurada em 1963. Seu formato totalmente assimétrico —inovador perante os mais tradicionais no modelo "caixa", como a Sala São Paulo— torna muito especial a experiência visual do público. Em termos sonoros, escuta-se tudo com clareza e presença, como nas melhores salas do mundo.

Fischer é um perfeccionista do som, e será bom acompanhar a repercussão internacional do trabalho que ele vem realizando em São Paulo. De seu lado, a Osesp é hoje uma orquestra bastante experiente. Por tudo isso, não há como não considerar o concerto deste sábado em Berlim como um ponto alto da música clássica brasileira neste ano.

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