Retomando as lágrimas, digo, o texto, Adolescência viralizou. O assunto tira o sono dos pais há muito tempo e eles não sabem mais o que fazer.
Na Inglaterra, onde foi feita essa série da Netflix, são os meninos assassinando meninas movidos por algoritmos misóginos.
Em Los Angeles, onde foi gravado o documentário Social Studies (em cartaz na Disney+ desde setembro do ano passado), são os adolescentes iniciando a vida sexual influenciados pela exposição precoce à pornografia e achando que comportamentos abusivos são normais. Ou meninos e meninas sendo levados a sites que ensinam como se suicidar, driblando a supervisão dos pais. (Sim, podem arrancar os cabelos porque isso existe).
O grave da situação é que crianças e adolescentes chegam nestes conteúdos tóxicos em poucos cliques, sem estar buscando. Não importa se é TikTok, Instagram, Youtube, Kwai. É como mostra o diálogo do início do texto: o pai só estava procurando um produto de academia e acabou tendo aulas de como tratar mulheres como lixo.
Banimento
Ok, mas esta discussão sobre algoritmos tóxicos é "antiga". (O Dilema das Redes já viralizou lá em 2020 tratando disso). Qual é a grande novidade então?
A novidade é que agora a discussão por trás de Adolescência está em um novo patamar: a proibição.
Sim! Proibição.
Na Austrália, em novembro, o parlamento aprovou uma lei para proibir o uso de redes sociais por adolescentes menores de 16 anos e vai obrigar as redes sociais a tomar providências sobre isso.
Em janeiro, começou a tramitar o Kids Off Social Media Act no congresso americano para banir crianças menores de 13 anos das redes e exigir autorização dos pais para adolescentes entre 13 e 17 anos.
Como fica o jogo?
A Bia Granja, que entende de creator economy como ninguém, criou um GPT com as 15 principais palestras sobre creators que rolaram no SXSW (o maior evento de inovação e criatividade do mundo, que aconteceu em Austin, no Texas, no início do mês). E adivinha? O tema do banimento de adolescentes estava lá, com todas as conclusões do impacto que isso poderá ter sobre o futuro dos negócios nas redes.
Os adolescentes são um dos grupos mais engajados e influentes no consumo nas redes sociais. Se eles saírem, o jogo muda. (O sucesso do TikTok se deu como? Como? Geração Z.)
Oito insights sobre a influência dos adolescentes, diretamente do GPT da Bia sobre a Creator Economy do SXSW 2025:
1. Plataformas ajustam seus algoritmos para favorecer conteúdo jovem porque sabem que esse público tem maior probabilidade de interagir e compartilhar.
2. Se um produto ou ideia se torna popular entre adolescentes, ele automaticamente ganha tração em outras faixas etárias.
3. O engajamento jovem não é só passivo - eles pegam um vídeo ou meme e adicionam sua própria interpretação, tornando-o ainda maior.
4. São os principais impulsionadores do social commerce. 80% dos adolescentes descobrem novos produtos por meio do TikTok e Instagram.
5. Artistas emergentes viralizam primeiro no TikTok, impulsionados pelo engajamento adolescente.
6. Garrafas Stanley? Adolescentes criaram a demanda, forçando até marcas tradicionais a se adaptarem à estética viral. A cor rosa da garrafa Stanley virou um item desejado porque representava um lifestyle jovem e trendy.
7. O social commerce foi totalmente redefinido - em vez de anúncios pagos, a validação dos adolescentes é o que impulsiona as vendas.
8. As tendências começam no TikTok, mas rapidamente se espalham para YouTube Shorts e Instagram Reels.
E a regulação das redes no Brasil?
Por aqui, finalmente separaram a parte política da regulação das redes (que gerou a briga polarizada em torno da liberdade de expressão), da que trata apenas dos direitos de crianças e adolescentes. O que poderá fazer com que o projeto caminhe (se a Câmara resolver começar de fato os trabalhos de 2025).
Segundo o Instituto Alana, no projeto que tramita hoje no Congresso não se fala em proibição de uso para adolescentes. Eis o que está previsto:
- a vedação de direcionamento de anúncios baseados em dados pessoais.
- remoção imediata de conteúdos que violem direitos de crianças e adolescentes.
- exigência de que as empresas detalhem riscos e impactos de seus algoritmos e conteúdos.
- e ainda obriga as plataformas a disponibilizarem ferramentas para que os pais possam monitorar e supervisionar o uso por parte de crianças e adolescentes.
E as marcas?
Maria Mello, do Instituto Alana, diz que as marcas têm um papel crucial na discussão sobre a regulação das plataformas digitais, mas até agora estão ausentes do debate. Zero participação.
E as redes?
A Meta, por exemplo, lançou no início deste ano uma campanha de marketing nas suas próprias redes para divulgar a conta de adolescentes em que os pais conseguem determinar o que seus filhos podem ver dentro delas. Mas fiquei chocada com o fato de a empresa nem querer passar informações mais detalhadas sobre a tal campanha. (Eu mesma só fui impactada com as postagens no Instagram depois de tratar do assunto pelo WhatsApp com a assessoria de imprensa da Meta.)
Maria, do Alana, diz que não só a Meta, mas outras empresas oferecem ferramentas para controle dos pais. Mas ela critica o quão pouco essas redes divulgam esses instrumentos, que na maioria das vezes são difíceis de acessar ou de entender. "A maioria dos pais desconhece essas ferramentas", diz.
A culpa é de quem?
Se na série fictícia da Netflix, os pais se culpam porque podiam ter feito mais, no mundo real, parece que está na hora de todo mundo fazer mais.
Reportagem
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