A decisão do presidente Lula (PT) de ir a Roma para o funeral do papa Francisco incluirá mais uma viagem internacional a uma concorrida agenda do petista nas próximas semanas, que impõe dificuldades para a resolução de uma lista extensa de assuntos pendentes no Brasil, como a crise na Abin (Agência Brasileira de Inteligência), reforma ministerial, indicações para tribunais e agências reguladoras.
A semana após feriado prolongado já era vista por aliados como curta e desafiadora, mesmo antes da morte do pontífice. Mas a viagem para Roma, que ocorre nesta semana (ainda sem data definida), deve tirar Lula de Brasília por mais alguns dias —o que se somará a viagens já previstas para a Rússia e China, entre 9 e 13 de maio.
O governo aguarda a data exata do funeral para decidir o roteiro da viagem. A expectativa é de que ocorra entre sexta-feira (25) e domingo (27).
O petista ocupará grande parte da nesta terça-feira (22) com a visita do presidente do Chile, Gabriel Boric, e de empresários do país vizinho. Na semana seguinte, o feriado de 1º de Maio na quinta-feira deve esvaziar novamente Brasília, a exemplo do que ocorreu por causa da Páscoa e Tiradentes.
Da lista de pendências de Lula, a resolução sobre a Abin é vista como uma das mais delicadas. A agência teria monitorado autoridades paraguaias de alto escalão em meio a negociações sobre os valores pagos ao país vizinho pela energia da usina de Itaipu —a ação foi revelada pelo UOL em março. Na quinta-feira (17), o diretor-geral da instituição, Luiz Fernando Corrêa, prestou depoimento por cinco horas à PF (Polícia Federal), que investiga o caso.
Apesar do apreço pessoal de Lula pelo chefe da agência, aliados apostam na saída do diretor-geral. Essa expectativa ganha força especialmente se confirmada a disposição do diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, para pedir seu indiciamento e afastamento.
Dentro do governo, Corrêa e Rodrigues são considerados rivais. A principal divergência é relacionada ao inquérito da PF sobre a chamada "Abin paralela". O grupo de Corrêa afirma que a investigação tem motivações políticas, enquanto policiais enxergam movimentos dele para obstruir apurações.
O presidente, que desistiu de passar a Páscoa em São Paulo e retornou para Brasília no sábado (19), também é aconselhado a se debruçar sobre a reforma ministerial para encerrar esse capítulo. Assim, daria fim à fritura a que alguns ministros têm sido submetidos com meses de especulações sobre uma eventual saída do governo.
É o caso de Márcio Macedo (Secretaria-Geral da Presidência), Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar), Wellington Dias (Desenvolvimento e Assistência Social) e Cida Gonçalves (Mulheres).
Indefinições pairam também sobre os ministérios que não estão sob o controle do PT. Há cobrança do PSD por mais espaço e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), pressiona pela demissão de Alexandre Silveira (Minas e Energia).
Ainda há a indefinição sobre o Ministério das Comunicações. Juscelino Filho deixou a pasta há duas semanas, após ser denunciado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) por suspeita de desvio de emendas parlamentares.
O deputado Pedro Lucas Fernandes (União Brasil-MA) chegou a ser anunciado como novo ministro, mas ele divulgou nota, no dia seguinte, em que falava em consultar a bancada. Como a Folha mostrou, ele já disse a aliados que deve recusar o convite.
Outra disputa que Lula precisa dirimir é pelas cadeiras do STJ (Superior Tribunal de Justiça). São duas vagas, uma para representante da magistratura e outra para o Ministério Público. As listas tríplices de cada categoria foram votadas em 15 de outubro, mas seis meses se passaram sem que o presidente tenha feito as escolhas.
Para a vaga destinada aos juízes, foram selecionados Carlos Pires Brandão e Daniele Maranhão, do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), sediado em Brasília, e Marisa Santos, do TRF-3, com sede em São Paulo.
Apoiado pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Kassio Nunes Marques, Carlos Brandão é visto como favorito. Mas o nome de Marisa ganhou o apoio do ministro Flávio Dino, também do Supremo, e de aliados paulistas do presidente.
A segunda lista tem o procurador de Justiça Sammy Barbosa, do Ministério Público do Acre, a procuradora de Justiça Marluce Caldas, do Ministério Público de Alagoas, e o subprocurador-geral da República Carlos Frederico Santos, do Ministério Público Federal.
Para essa vaga, Marluce Caldas é apontada como favorita. Ela é tia do prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (PL), e a nomeação selaria a aproximação do JHC, como ele é conhecido, com governo Lula. Há expectativa que ele se filie a um partido da base.
A definição dos diretores das agências reguladoras também está em pauta. O presidente indicou 14 nomes em dezembro para preencher os postos vagos em oito agências, mas o Senado ainda não as aprovou.
Um dos problemas para essa confirmação está na resistência ao ex-deputado Wadih Damous (PT) como diretor-presidente da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), que tem como função principal regular e fiscalizar as operadoras de planos de saúde.
Atual secretário Nacional do Consumidor, órgão do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Damous é amigo do presidente e tem apoio de grupos da área de saúde, mas sofreria ressalvas de outra ala do setor. O presidente do Senado já teria alertado Lula sobre dificuldades para aprovação na Casa.
O próprio Alcolumbre trava disputa com o ministro Alexandre Silveira sobre indicações para agências do setor de energia. O presidente do Senado tem buscado convencer Lula a substituir o ministro e as indicações.
Ainda no Congresso, Lula também é pressionado para decidir se o governo entra com maior intensidade no debate sobre o projeto de anistia aos condenados pelos atos golpistas do 8 de janeiro de 2023. Partidos da sua base aliada deram mais da metade das assinaturas para a urgência da matéria na Câmara.