Manter expectativas ancoradas é crucial para o controle da inflação. Esse é o principal ponto do sistema de metas de inflação. Se tiver credibilidade, o Banco Central faz com que os reajustes de preços se coordenem em torno do valor estipulado, o que ajuda a manter a inflação sob rédeas.
Caso não haja credibilidade, porém, os agentes econômicos ignoram a meta em suas decisões de preços e salários. A inflação desgarra e, para trazê-la de volta, é preciso aplicar o remédio amargo dos juros altos.
Desde o início do seu mandato, o presidente Lula vem travando embates com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, o que contribui para desgastar essa credibilidade. Campos Neto foi indicado pelo ex-presidente Bolsonaro. Pela reforma aprovada há alguns anos, os mandatos dos presidentes da República e do Banco Central passaram a ser intercalados. Isso significa que chegou a hora de Lula indicar o sucessor de Campos Neto.
A escolha vinha rodeada de incertezas, especialmente pela possibilidade de Lula indicar alguém muito diferente de Campos Neto – leia-se, mais leniente com a inflação. As pesadas críticas à atual gestão do Banco Central sugeriam boas chances de isso ocorrer. Essas dúvidas ainda alimentavam a volatilidade em mercados financeiros e no dólar.
No fim das contas, Lula anunciou Gabriel Galípolo. O primeiro ponto positivo foi eliminar a incerteza. Mas, por se tratar de alguém próximo ao presidente, ainda há a chance de a política contaminar as decisões do Banco Central – prejudicando a ancoragem das expectativas e o controle da inflação.
Há, entretanto, um ponto positivo que indica o contrário. Nas últimas reuniões do Comitê de Política Monetária, o Banco Central interrompeu a queda de juros, mantendo-a em um patamar elevado para combater uma inflação que voltou a assustar – e ainda disse que não hesitaria em subir a Selic se julgasse necessário. Essas decisões foram unânimes, ou seja, contaram com o voto de Gabriel Galípolo.
As coisas parecem caminhar bem, com certa continuidade entre a gestão atual do Banco Central e a próxima. O verdadeiro teste ocorrerá quando a instituição for instada a aumentar a taxa de juros em resposta a um aumento na inflação, principalmente se houver reação contrária por parte do Executivo.
Folha Mercado
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