Peça em cartaz no Sesc Pinheiros explora a vida e a obra de Tennessee Williams

há 1 mês 4

A peça "Tennessee Williams Deve Morrer", encenada pela companhia Filhos do Dr. Alfredo, é uma obra que se destaca pela abordagem provocativa e pelo diálogo com a tradição teatral. Inspirada na obra e no universo do dramaturgo norte-americano Tennessee Williams (1911-1983), a peça não apenas homenageia, mas também questiona os limites do teatro e a relevância de temas como identidade, trauma e decadência, recorrentes nos textos de Williams.

A dramaturgia de Marcelo Braga e Luís Filipe Caivano mistura referências explícitas à obra de Tennessee Williams com uma visão contemporânea e crítica sobre a sociedade e o próprio fazer teatral. Transitando entre elementos da vida do escritor – como sua relação com a sexualidade, os traumas familiares e o alcoolismo – e os personagens que povoam suas peças, especialmente os marginalizados e os que vivem à beira do colapso emocional.

Apoiada no conceito de metateatro, a encenação toma corpo quando os dois intérpretes entram no espaço de jogo, ou seja, quando atuam na "peça dentro da peça". Essa sobreposição de camadas permite uma leitura multifacetada, onde a biografia e a ficção se encontram e se transformam mutuamente.

Os atores Luciano Schwab e Vivian Bertocco entregam performances intensas, oscilando entre o melodrama e a ironia. Essa dualidade é essencial para a proposta da peça, que parece querer desconstruir as expectativas do público em relação ao teatro clássico e, ao mesmo tempo, prestar tributo ao trabalho de Williams.

A escolha do título é, por si só, um manifesto que incita à reflexão: o que significa "matar" Williams? Seria uma ruptura com os paradigmas estabelecidos pelo dramaturgo ou uma tentativa de reinventá-lo para um público e uma estética contemporâneos? Esse tensionamento é central na peça, que explora a dicotomia entre o respeito reverencial aos clássicos e a necessidade de subvertê-los.

Três perguntas para…

… Marcelo Braga

A trilogia metateatral que começa com "Montanha-Russa" abordando o transtorno bipolar e inspirada em seu pai e "Quem Fica Com Quem", que trata principalmente da solidão, se encerra com "Tennesse". O que te levou a essa escolha?

O metateatro parte da autorreflexão. Em "Montanha-Russa", o meu olhar de dramaturgo estava focado nas minhas próprias e próximas vivências; já em "Quem Fica Com Quem", esse olhar se ampliou para os dramas do meu cotidiano e em "Tennessee", o foco recaiu sobre minha análise acerca do processo criativo no teatro e de como Tennessee Williams foi, e ainda é, capaz de radiografar a alma humana. Essa característica me fascinou e me impulsionou a mergulhar na sua vida e obra, a partir da curiosidade que eu nutria sobre a relação dele com sua irmã Rose.

O ator Luciano Schwab está muito parecido com Tennessee Williams em cena, pensou nisso na hora de escolhê-lo como protagonista?

Conheci Luciano Schwab quando éramos alunos da EAD-ECA-USP (Escola de Arte Dramática). Sempre admirei seu trabalho no teatro e de como ele construía, como um arquiteto minucioso, seus personagens nos diversos trabalhos que ele fez tanto dentro como fora da escola. A proximidade física com Tennesse faz parte do trabalho delicado que Luciano fez durante o processo, optando por usar bigode que o tornou bastante parecido com o dramaturgo estadunidense.

Como está sendo para a companhia o processo de fazer teatro no momento político atual?

Após a pandemia, as pessoas parecem ter ficado sedentas pelo "encontro com o outro" e o teatro é campo fértil para esses encontros. Estamos felizes por propiciar esses encontros para discutir o ser humano. Porém, o momento atual está emoldurado por um conservadorismo tacanho que, em muitas questões, quer retroceder os vários passos a frente e em direção a civilidade e diversidade que já tínhamos dado como sociedade. Tennesse Williams foi um autor que desafiou o conservadorismo de seu tempo, inclusive a censura imposta aos artistas da época pelo Código Hays e pelo Macartismo. Acho muito relevante trazer à cena suas ideias e apresentar ao público brasileiro o lado menos conhecido do dramaturgo.

Sesc Pinheiros - r. Paes Leme, 195, Pinheiros, região oeste. Qui. a sáb., 20h. Até 14/12. A partir de R$15, em sescsp.org.br. e nas bilheterias das unidades do Sesc.

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