Nos versos de Gilberto Gil, elas são as "joias da elevação espiritual, lágrimas engastadas em anéis de ouro, gotas de sangue cristalizadas em rubis". Nas quase 800 páginas dos livros "Preciosa Florinda" e "Joias na Bahia dos Séculos 18 e 19", que saem juntos agora na caixa "Florindas", vemos esse tesouro aflorar numa edição de luxo.
Charles Cosac, metade da antiga Cosac Naify, lança com esses primeiros volumes a nova Cosac Edições, ensaiando sua volta ao mercado editorial do qual ele diz nunca ter saído. É a documentação definitiva do que se convencionou chamar "joias de crioula" na coleção de um dos maiores antiquaristas de Salvador, Itamar Musse.
O acervo é retratado com precisão, mas Cosac, como fazia na antiga editora, buscou um verniz artístico para a obra. Vik Muniz, um dos nomes mais celebrados da arte contemporânea, trabalhou em cima de um retrato antigo para fazer reviver a figura de Florinda Anna, personagem central de um dos livros que foi dona de uma das maiores coleções dessas joias acumuladas como patrimônio pelas ex-escravizadas, as mulheres que ficaram conhecidas como sinhás pretas.
Gilberto Gil, a convite do colecionador, escreveu o poema que abre o livro e o artista Christian Cravo, agora com uma mostra em cartaz na galeria Casa Seva, em São Paulo, fotografou a atriz Zezé Motta usando as joias da coleção num ensaio que atravessa todo o segundo livro.
"Florindas" é o ponto de partida de uma série de livros que Cosac está organizando sobre a condição de vida dos negros do Brasil dos séculos 17 ao 19. Os próximos volumes vão retratar desde a Santa Inquisição em ação na Bahia a caçadores de baleias no litoral.
Em tempo, a coleção de Itamar Musse pode ser vista agora em Salvador numa exposição do Museu de Arte Contemporânea da Bahia, com um recorte desse acervo. Musse, para quem não conhece, é também famoso pela badalada festa que dá todos os anos no Dia de Iemanjá, no terraço de seu antiquário no Rio Vermelho.
NO PRELO Além dos livros sobre a história da vida negra no país, Charles Cosac já tem engatilhada a produção de outros volumes sobre arte. Nos planos estão uma série de obras sobre o cineasta italiano Pier Paolo Pasolini, uma reedição do clássico "L'Art Magique", do francês André Breton, na esteira do centenário do surrealismo, e monografias dedicadas aos artistas Carlos Fajardo e José Resende, dois dos maiores nomes da escultura no país.
MAIS BAHIA Também acaba de ser lançado, pela editora Capivara, o livro "Iconografia Baiana na Coleção Flávia e Frank Abubakir", que documenta a coleção do casal dedicada a destrinchar a história visual da Bahia. O volume reúne mapas, aquarelas, óleos e desenhos dos grandes artistas estrangeiros que esquadrinharam o território, entre eles o alemão Johann Moritz Rugendas.