A crise do cinema é o mote central da boa "A Franquia", série da HBO que acaba de concluir sua primeira (e curta) temporada. Mas os personagens que enchem o set de mais uma produção de uma dessas intermináveis franquias de super-heróis poderiam habitar qualquer local de trabalho.
A série foi criada por Jon Brown, roteirista que participou da elaboração de dois clássicos do streaming, "Succession" (2018-2023) e "Veep" (2012-2019). Nesta última, como produtor, esteve sob a batuta de ARMANDO IANNUCCI, uma das cabeças mais ágeis da TV e que agora assina como produtor executivo de "A Franquia".
Ainda que haja muitas marcas das duas séries citadas em "A Franquia", como o humor perverso e os diálogos rápidos, ela está aquém dos dois sucessos. Sem esperar algo memorável, no entanto, é possível se divertir bem com os oito episódios de meia hora e, com uma frequência atordoante, se identificar com o personagem central, o diretor assistente Dan (Himesh Patel, de "Estação 11"), e seu braço-direito, Dag (Lolly Adefope).
Os dois representam o conflito entre idealismo —com a crença dela no cinema como arte maior— e pragmatismo —com a fé dele no cinema nos moldes que o mercado consumidor de "conteúdo", adolescentes e pós-adolescentes, delimita.
Dan é quem sustenta a produção para não desmoronar, oprimido por um orçamento que encolhe e as limitações de um roteiro que precisa se encaixar em um "universo cinematográfico" cheio de sequências, preâmbulos e sequências e preâmbulos.
Ainda lida com um diretor-estrela (Daniel Brühl, o adorável garoto de "Adeus, Lenin") cuja empáfia supera de longe seu talento, uma assistente ineficiente (Jessica Hynes) para quem o diretor é uma divindade suprema.
Também serve como quase uma babá para atores com egos deformados e fora de sintonia com a realidade —Richard E. Grant faz o astro decadente convocado a interpretar o antagonista, e Billy Magnussen está na pele do inseguro galã da série B. Dan ainda tenta driblar uma produtora impiedosa (Aya Cash) com a qual teve um caso no passado e um produtor-executivo (Darren Goldstein) que trata todos feito lixo.
Os conflitos entre esses personagens, seus ideais e ambições, são facilmente encontráveis em outros ambientes, o que torna "A Franquia" imediatamente identificável e divertida (quando não assustadoramente familiar).
A ironia fina e os diálogos afiados, que por vezes parecem ser levados pelos atores sem mais do que algumas orientações do roteiro, também embalam de graça uma história que, registrada de outra forma, poderia soar passadista e deprimente.
Há algo de brancaleônico na trupe, ainda que a crítica fácil a uma indústria do entretenimento cada vez mais repetitiva e infantilizante soe um tanto óbvia, especialmente entre os cenários cheios de telas verdes e figurinos espalhafatosos. Mas o humor cortante característico das produções britânicas prevalece.
Curiosidade, o primeiro episódio é dirigido por Sam Mendes, cuja carreira abraça tanto "Beleza Americana", uma preciosidade da observação social arguta, como... franquias ("007", no caso).
Nada imperdível, mas seguramente divertido e provocador o bastante para compensar a visita.
Os oito episódios de "A Franquia", da HBO, estão disponíveis também no Max.