Marcado por desavenças entre os Poderes, 2024 terminou deixando para o ano que ora se inicia uma herança de pontas soltas. Arestas a serem aparadas ao longo de um 2025, cujas perspectivas não são das melhores.
Judiciário em conflito aberto com o Legislativo por causa das emendas parlamentares —entre outras querelas— com um Executivo procurando se equilibrar entre os dois sem ser atingido pelo tiroteio. Não tem dado certo, porque atraiu a desconfiança do Congresso.
Suspeição em boa medida fundamentada, pois o Palácio do Planalto não disfarçou o investimento numa aliança com o Supremo Tribunal Federal como forma de driblar os obstáculos no trânsito de seus interesses num Parlamento de maioria arisca.
E não há acertos na comunicação que deem jeito nessa rivalidade porque é na tensão permanente que se sustenta o poder de deputados e senadores sobre o presidente da República.
O único fator que poderia mudar a situação seria uma popularidade alta do chefe da nação. Foi assim nos mandatos anteriores de Luiz Inácio da Silva (PT).
Na época, o Parlamento era também, como hoje, de composição majoritariamente oposicionista com forças do centro à direita prevalecendo sobre a esquerda. Só que lá a população manifestava nas pesquisas apoio ao presidente por larga margem.
Em meados do segundo governo, eram 70% os que aprovavam Lula contra os atuais 35%. Isso faz toda a diferença. É a distância que separa a solicitude da hostilidade dos congressistas. Eles vivem de votos e, portanto, preferem a companhia de quem lhes possa render vantagem eleitoral.
Percebem no ar para onde vai essa tendência. Sempre foi assim. No estertor da ditadura, nos idos da década dos anos 1980, os dissidentes da Arena sentiram o cheiro de queimado da rejeição popular e abandonaram o candidato do regime, Paulo Maluf, para aderir a Tancredo Neves no colégio eleitoral de 1985 que marcou o início da redemocratização.
Lá se vão 40 anos. Muita coisa mudou, mas o pragmatismo segue no comando da política e nas escolhas do eleitorado que responde bem quando motivado por algo que lhe pareça estimulante e com potencial de render benefícios.
Isso, nesta passagem pelo Planalto, Lula não está conseguindo oferecer. A recauchutagem de bons programas sociais não satisfaz. A população com o tempo tende a incorporá-los como patrimônio próprio; um dever, não uma benesse do poder público.
Um Voa Brasil aqui, um Desenrola ali, um Acredita ou um Pé de Meia acolá são iniciativas bem-recebidas que, no entanto, não têm o efeito que o presidente imaginava e gostaria que tivessem. São ações vistas como mais do mesmo. O público, com razão, sempre quer mais.
Se não há renovação, fica vencido o prazo de validade da reciprocidade popular. Aconteceu com o Plano Real e várias realizações do governo Fernando Henrique (PSDB). Ele foi eleito e reeleito em primeiro turno, mas não fez o sucessor.
O preço da recompensa político/eleitoral é a eterna vigilância sobre quais são as demandas da sociedade no presente. Atualmente o anseio maior é por alguma solução que reduza o ambiente de insegurança frente ao avanço da criminalidade.
Não é fácil de resolver, mas o combate à inflação e o desmonte da ditadura também não eram. Foi preciso coragem, disposição ao enfrentamento, capacidade de articulação política, desprendimento partidário, renúncia ao personalismo entre outros atributos que não compõem o portfólio do governo Lula 3.