Novo premiê da França avalia aumentar impostos para ricos e empresas

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Nos sete anos em que foi presidente da França, Emmanuel Macron apostou em reduzir os impostos para os ricos e para as empresas como receita para estimular a economia. Seu novo governo está prestes a rasgar esse manual.

Diante de uma rápida deterioração nas finanças do país, o recém-nomeado primeiro-ministro de Macron, Michel Barnier, cogita impostos mais altos sobre empresas e os ricos, em uma tentativa de tapar o crescente déficit orçamentário da França e tranquilizar investidores internacionais preocupados com a capacidade do governo de enfrentar o problema.

Macron está sob pressão para agir rapidamente. Os custos de empréstimos para a França, que tem a segunda maior economia da Europa depois da Alemanha, dispararam na terça-feira (24) para o nível mais alto desde a crise financeira de 2008, à medida que os investidores aumentaram o prêmio que exigem para manter a dívida francesa. O governo enfrenta uma batalha árdua para controlar a dívida e o déficit crescentes que se tornaram dos mais altos da Europa.

Após alertar que a situação financeira da França piorou rapidamente, Barnier disse no domingo (22) que voltaria a debater um assunto há muito tabu de reverter vários dos cortes de impostos emblemáticos de Macron, apesar das promessas do presidente, feita há apenas algumas semanas, de não aumentar os impostos.

"Não vou aumentar os impostos de todos os franceses", afirmou Barnier em uma entrevista na televisão francesa. "Mas não posso excluir os mais ricos e as empresas do esforço nacional para retificar a situação."

MACRON E A FAMA DE "PRESIDENTE DOS RICOS"

Desde que foi eleito pela primeira vez em 2017, Macron fez questão de sua presidência melhorar a reputação da França como um lugar para fazer negócios. Ele cortou impostos para as empresas e reduziu um imposto nacional sobre a riqueza, ganhando elogios dos investidores —e o apelido de "presidente dos ricos" de seus detratores.

As políticas fiscais de Macron incluíram a redução da taxa oficial de imposto corporativo de 33% para 25% e a redução de tributos para fabricantes e indústrias que antes estavam entre os mais altos da Europa. Ele transformou um generoso desconto fiscal único para empresas em um corte de impostos permanente. E ele introduziu um imposto fixo de 30% sobre a renda de investimentos.

Macron gerou controvérsia quando reduziu o imposto sobre a riqueza dos muito ricos, substituindo-o por um tributo sobre ativos imobiliários avaliados em mais de 1,3 milhão de euros (R$ 7,97 milhões).

O objetivo das políticas fiscais era estimular o crescimento fazendo com que os ricos investissem mais na economia e que as empresas aumentassem as contratações. Mas os críticos dizem que elas ampliaram principalmente a desigualdade econômica, enquanto drenavam a receita fiscal dos cofres nacionais. Um estudo do Instituto Montaigne, um think tank francês independente, descobriu que as medidas combinadas custaram ao Tesouro francês quase 15 bilhões de euros (R$ 92 bilhões) em receita perdida.

Barnier precisa obter impressionantes 110 bilhões de euros (R$ 674,61 bilhões) em receitas nos próximos anos para trazer a dívida e o déficit crescentes da França de volta aos padrões da União Europeia. Grande parte disso será alcançado com cortes nos gastos do governo.

Macron se opôs veementemente aos aumentos de impostos, classificando o ato como "uma doença muito francesa", mas Barnier sinalizou que não tem escolha. Até agora, o premiê não divulgou aumentos de impostos específicos. Mas em entrevistas nos últimos dias, ele e seu novo gabinete disseram que estão prontos para cruzar várias das linhas vermelhas de Macron.

Folha Mercado

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Entre as opções avaliadas estão aumentar o imposto fixo para até 35%, uma mudança que economistas franceses dizem que poderia trazer até 300 milhões de euros (R$ 1,84 bilhão) em receitas.

Também está sendo considerada uma taxa temporária sobre "superlucros" obtidos por empresas, um plano que Macron havia sugerido, mas abandonou quando os lucros das empresas de petróleo e alimentos dispararam após a pandemia. E alguns aliados de Barnier propuseram aumentar o imposto corporativo para mais próximo do patamar que estava antes de Macron reduzi-lo.

Quanto a aumentar o imposto sobre a riqueza, Barnier se recusou a dizer se isso está nos planos. Mas se seu governo o fizesse e reduzisse outras brechas fiscais, isso traria de 10 bilhões a 15 bilhões de euros R$ 61,3 bilhões a R$ 92 bilhões) anualmente, de acordo com a Terra Nova, um think tank francês.

As empresas francesas apoiam impostos mais altos, com condições.

Patrick Martin, presidente da Medef, a principal organização de empregadores da França, disse que estava "pronto para discutir" um aumento de impostos para empresas, com a condição de que o governo também reduzisse drasticamente os gastos e não implementasse políticas que penalizassem o investimento e o emprego.

Rodolphe Saade, CEO do império de transporte CMA CGM, afirmou que a empresa está disposta a contribuir com um pagamento único para ajudar a consertar as finanças desgastadas da França, em um sinal de que grandes empresas aceitam ajudar a tapar o buraco orçamentário —desde que não houvesse mudanças mais significativas no código tributário.

"Se houver uma contribuição de solidariedade por parte das empresas que geram lucro, a CMA CGM pagaria sua parte", prometeu nessa segunda-feira (23).

Os investidores estrangeiros permaneceram em silêncio por enquanto. Mas o novo governo está ansioso para não assustá-los. O novo ministro do orçamento de Barnier é Laurent Saint-Martin, um executivo que já chefiou a Business France, uma agência próxima do governo encarregada de atrair investimentos. Barnier também nomeou Antoine Armand, um político liberal próximo ao pensamento de Macron, como o novo ministro da Economia.

O QUE ACONTECE AGORA?

As finanças públicas estão se deteriorando mais rapidamente do que se pensava: o ministério das finanças francês agora espera que o déficit atinja 6% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2024, acima da previsão recente de 5,6%, se o governo não tomar medidas rápidas.

A dívida da França aumentou para 3 trilhões de euros (R$ 18,4 trilhões), ou mais de 110% do PIB, a mais alta da Europa depois das de Grécia e Itália.

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