O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), usou uma aeronave da FAB (Força Aérea Brasileira) para viajar de Brasília a São Paulo na última quarta-feira (26), um dia antes de acompanhar o título conquistado pelo Corinthians no Campeonato Paulista no clássico contra o Palmeiras.
A viagem foi mobilizada por razões de segurança e teve apenas um passageiro transportado, segundo informações disponíveis no site da FAB. O órgão que solicitou o voo e a identificação de quem viajou, porém, não foram divulgados na mesma página.
A Folha confirmou a presença do ministro com autoridades que acompanham a agenda de Moraes. Ele decolou da capital federal horas após participar da sessão da primeira Turma do STF que decidiu tornar réus o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete acusados de integrar o núcleo central da trama golpista de 2022. Na tarde do dia seguinte, já em São Paulo, o ministro participou por vídeo dos julgamentos da corte.
Torcedor do Corinthians, Moraes acompanhou o jogo à noite na Neo Química Arena, ao lado do ministro Flávio Dino, que é botafoguense, mas vestia a camisa do alvinegro paulista. A partida teve mais de 48 mil torcedores presentes.
Na sexta-feira (28), Moraes participou em São Paulo do seminário "Democracia, Justiça, Política e o Futuro do Ministério Público na Perspectiva Feminina".
Questionado, o STF, a FAB e o Ministério da Defesa não se manifestaram sobre a viagem de Moraes.
Dino também acompanhou presencialmente a sessão do STF no dia 26 e, por vídeo, na data seguinte. A assessoria do ministro disse que ele não usou aeronave da FAB para viajar a São Paulo.
Imagens divulgadas nas redes sociais mostram Moraes acompanhando a partida com a camisa do Corinthians e boné, ao lado de sua esposa, a advogada Viviane Barci, e de Flávio Dino.
O Corinthians conquistou o Campeonato Paulista pela 31ª vez em sua história. Depois de ganhar na casa do Palmeiras, por 1 a 0, o time alvinegro segurou em casa um empate sem gols.
Antes de 2023, apenas o presidente do STF tinha um avião oficial à sua disposição, enquanto os demais magistrados costumavam embarcar em voos solicitados por outras autoridades, como ministros do governo federal.
Os ataques do 8 de janeiro fizeram o STF passar a solicitar com frequência aviões da FAB para transportar os ministros que não ocupam a presidência da corte, sob argumento de garantir a segurança dos demais ministros.
Os detalhes desses voos, como lista de passageiros, porém, são mantidos em sigilo. As viagens são classificadas como "à disposição do Ministério da Defesa" no site da FAB, sem apontar que o Supremo solicitou as aeronaves.
"Obviamente a segurança não seria uma justificativa cabível: se foi a um estádio com 50 mil pessoas, poderia tranquilamente ter usado um avião comercial para a viagem", avalia Marina Atoji, diretora de programas da Transparência Brasil.
O advogado Bruno Morassutti, diretor de advocacy da Fiquem Sabendo e colunista da Folha, considera que o caso prejudica a imagem de Moraes.
"Por mais que o ministro tenha direito a ter uma vida particular, dado a atenção pública em relação à conduta dos ministros do STF, o ideal seria que ela refletisse aquilo que a sociedade brasileira espera como utilização adequada dos bens públicos."
A brecha nas regras foi ampliada em abril de 2024, quando o TCU (Tribunal de Contas da União) deu aval para colocar sob sigilo os detalhes dos voos realizados em aviões da FAB por altas autoridades por razões de segurança.
A decisão tem sido usada para omitir os nomes dos passageiros, inclusive para os casos em que os juízes pegam caronas em voos solicitados por outras autoridades.
Em manifestações anteriores sobre o uso das aeronaves da FAB, o Supremo havia dito que pedidos de "apoio" feitos à Força Aérea "seguem rigorosamente a legislação vigente, com base no decreto nº 10.267/2020". "A principal motivação para solicitações é a garantia da segurança das autoridades com base em análises técnicas", afirmou o tribunal à Folha no fim de março, antes da viagem de Moraes.
As investigações sobre a trama golpista contra a posse de Lula, em 2022, indicam que Moraes teve a localização monitorada por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Em 2023, o ministro foi hostilizado no aeroporto de Roma. Em novembro de 2024 um homem morreu ao se explodir em frente ao STF, depois de tentar entrar no tribunal, e colocou novamente em alerta os Poderes.