Maioria dos fundos multimercados rende menos que o CDI em 2 anos

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Nos últimos dois anos, a maioria dos fundos multimercado rendeu menos que a renda fixa, aponta levantamento de William Eid Júnior, diretor do FGVcef (Centro de Estudos em Finanças da Fundação Getulio Vargas).

O estudo levou em conta 510 fundos multimercados brasileiros abertos a captação nos 26 meses encerrados em janeiro deste ano, o que representa 20% da indústria total. Dessa amostra, 60,2% dos fundos tiveram rendimentos abaixo do CDI, indicador que segue a taxa Selic e baliza a indústria de renda fixa.

Multimercados são fundos que podem investir em diversos ativos, como ações, moedas, renda fixa e investimento no exterior.

"As maiores rentabilidades foram de fundos que investem em criptomoedas, apesar de eu não achar que sejam investimento de fato, e dos que investem no exterior. O que é esperado, pois o câmbio desvalorizou muito no período", diz Eid.

Já os piores desempenhos foram de fundos que apostaram em títulos prefixados antes do ciclo de alta da Selic, o que fez com que o seu valor despencasse.

Muitos desses fundos estavam comprados no chamado "pacote Brasil", apostando na queda dos juros e do dólar e na alta da Bolsa com a melhora no crescimento econômico e no desemprego. No entanto, a mudança na meta fiscal, em abril de 2024, reverteu o cenário. Com o aumento do risco fiscal, o contrário do apostado aconteceu.

"São poucos os fundos multimercado que têm bom desempenho, e mesmo esses não têm consistência. Há quanto tempo o fundo Verde não entrega alguma coisa decente? O Luis [Stuhlberger] é um gênio, e não está dando certo, está entregando o CDI, o que não é o esperado para um fundo como esse", diz o professor.

O fundo Verde, gerido por Stuhlberger, ganhou fama por ter uma rentabilidade acumulada de 27.874% desde sua criação, em 1997. Em 2024, ele rendeu 12,1%, levemente acima dos 10,87% acumulados pelo CDI no período.

Para melhorar a rentabilidade, o fundo mudou sua estratégia ao fim do ano passado e passou a apostar na queda da Bolsa brasileira pela primeira vez na sua história.

Dados da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) vão ao encontro do levantamento de Eid. Em 2024, apenas os fundos multimercados que investem mais que 40% do patrimônio líquido no exterior tiveram rentabilidade acima do CDI, com uma média de ganho de 11,54%.

"Com real se valorizando, juros baixos e Bolsa subindo, multimercados se dão bem. No contrário, tendem a ir mal. Com Selic de 15%, não há fundo multimercado que consiga superar isso", diz Eid.

Em um ciclo negativo desde que a Selic voltou a dois dígitos, em 2022, os fundos multimercados têm mais resgates que investimentos. Em 2024, a captação líquida negativa de R$ 350 bilhões foi recorde. Com a sangria, os fundos estão com o menor patrimônio líquido real desde 2016, quando o país viveu sua pior crise econômica.

Para Pedro Rudge, sócio da Leblon Equities e diretor da Anbima, a sequência de anos negativos para a indústria está ligada não só à alta da Selic e às incertezas sobre as economias brasileira e global mas também à migração de investidores para títulos de renda fixa isentos de Imposto de Renda, como CRI e CRA (certificados de recebíveis de infraestrutura e do agronegócio), LCI e LCA (letras de crédito de infraestrutura e do agronegócio) e debêntures incentivadas.

"Para o apetite voltar, a rentabilidade tem que melhorar, além de a aversão a risco dos investidores diminuir, o que seria possível com melhora no panorama fiscal do Brasil", diz Rudge.

Outro produto que recebeu esse fluxo foi a previdência privada. Nestes últimos três anos, os fundos multimercado perderam o segundo lugar do Brasil em termos de maior patrimônio líquido os fundos de previdência —a liderança segue com os de renda fixa.

"Hoje, os fundos de previdência são mais flexíveis, a legislação deles avançou e aumentou a oferta de produtos, os últimos cinco anos foram de crescimento desses fundos", diz Rudge.

O gestor, no entanto, vê que essa migração está chegando ao fim. "A maior parte desses investidores que quis mudar já foi. Devemos achar um ponto de equilíbrio."

Mesmo que estanque, a saída massiva de capital dos multimercados deve provocar mudanças nessa indústria neste ano, com o fechamento e a junção de fundos e reabertura para captação de grandes fundos que estavam fechados para novos cotistas, avaliam os especialistas.

Folha Mercado

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"Alguns gestores que ficaram muito pequenos, ou fecham o capital e devolvem o dinheiro aos cotistas, ou tentam ser comprados, ou incorporados, por gestores maiores. Em momentos difíceis, pequenas não têm fôlego", diz Rudge.

Com a queda da Selic durante a pandemia, houve um crescimento exponencial no número de fundos. Hoje, com 12.583 fundos, uma quantia que não condiz com o baixo percentual de investidores no país, o mercado brasileiro está entre os dez maiores do mundo.

"A barreira de entrada para constituir gestora é relativamente baixa. É normal e saudável termos ciclos de crescimento e de enxugamento. É um pouco de seleção natural", afirma Rudge.

"Com certeza veremos fechamentos de fundos e gestoras em razão do desempenho ruim. Na renda fixa, o investidor vai para os grande bancos", diz Eid, da FGV.

Para Daniel Miraglia, economista-chefe da Integral Group, hoje é mais vantajoso para o investidor consultar um profissional para fazer a própria diversificação da carteira do que ter um fundo multimercado.

"Esse produto tenta fazer a melhor alocação, com um risco-retorno melhor do que se o investidor fosse fazer isso sozinho, mas se pagam 2% de taxa de administração e 20% do que exceder o CDI."

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