Os malefícios provocados pelas queimadas não são novidades para a população brasileira que habita as regiões Norte e Centro-Oeste do país. No primeiro quadrimestre de 2024, o país registrou o maior número de focos de queimadas desde 2003. Desde a última sexta-feira, 23 de agosto, no entanto, os focos de incêndio tiveram saltos de 338% em São Paulo e 236% no Mato Grosso, criando uma névoa de cinzas que sobrevoa o país. De um lado, temos a destruição ambiental imensurável provocada pelos incêndios. De outro, a crise de saúde provocada pelas queimadas, que está lotando as salas de espera das Unidades de Pronto Atendimento dos principais estados atingidos pela fumaça.
Para o primeiro ponto, é urgente investigar as causas dos incêndios, punir os responsáveis e criar planos efetivos de monitoramento, que envolvam também a garantia de orçamento para as agências responsáveis por fazê-lo. Para o segundo ponto, uma solução imediata que se faz necessária, e que deveríamos ter aprendido ao longo da pandemia, é uma forma de comunicação mais eficiente em saúde, mais clara e direta, capaz de reduzir os inúmeros danos à saúde provocados pela fumaça das queimadas.
Desde sexta-feira, o Ministério da Saúde tem feito comunicados que parecem não incorporar, em suas estratégias, algumas das lições que deveríamos ter aprendido na pandemia. É o caso da recomendação de uso de bandanas e máscaras de pano para "melhorar o desconforto", por exemplo, quando deveriam orientar a população ao uso de máscaras do tipo PFF2, as mais indicadas para proteção em casos como esse.
A importância do uso correto de máscaras, da colocação ao tipo, foi evidenciada na pandemia, e essa mensagem tem sido propagada de forma importante por grupos de ativistas pela qualidade do ar, como é o caso da página Qual Máscara?, que oferece orientações baseadas em evidências. Os tipos de máscara indicados e a forma de utilização não são meros detalhes: são pontos essenciais para evitar problemas respiratórios graves.
Instruções claras que não deem margem para duplos sentidos também devem ser essenciais em momentos de crise. A confusão gerada pela grande quantidade de informações produzidas nesses momentos confunde a população, e é fundamental ter uma entidade de saúde confiável e central à qual as pessoas possam recorrer para uma orientação correta — algo que, infelizmente, o Brasil não teve durante a pandemia de covid-19.
É importante considerar a utilização e o aproveitamento de todos os canais possíveis para comunicar a situação, dando a ela o grau de importância necessário. Postagens em redes sociais e comunicados à imprensa são importantes, mas ocupar o horário nobre transmitindo as orientações apropriadas também é fundamental. A televisão continua sendo uma das principais fontes de informação dos brasileiros, e não devemos ignorar seu poder em tempos de crise, mesmo com a ascensão das plataformas digitais. As estratégias devem ser conjuntas.
A pandemia nos ensinou a importância da comunicação efetiva em saúde, comprometida com as evidências disponíveis em momentos de crise. Agora, cabe a nós relembrar essas lições no presente. É fundamental garantir que essas informações sejam propagadas pelas Secretarias Estaduais e Municipais em seus canais, seguindo as orientações federais. Planos para distribuição de máscaras nos locais mais afetados também deveriam ser articulados junto às Prefeituras, a fim de evitar danos mais graves e permanentes à saúde da população, especialmente dos mais vulneráveis, como crianças, idosos, pessoas com problemas cardíacos e outras comorbidades que podem ser agravadas com a má qualidade do ar.
Por fim, é fundamental que a população esteja vigilante e atenta: em outubro, teremos eleições municipais. Cabe a nós eleger representantes compromissados com a vida, com a saúde e com uma gestão responsável em momentos de crise nas cidades, locais que serão mais fortemente afetados pela crise climática e onde estratégias rápidas, eficientes e que ouçam as evidências científicas e as necessidades da sociedade sejam incorporadas nos planos de governo.