Justiça bate cabeça em decisões sobre bloqueios de motoristas de aplicativo

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Em um caso analisado pela 25ª Câmara do TJSP, por exemplo, os juízes de segunda instância sustentaram que a Uber tem "liberdade contratual" e pode fazer o "desligamento sem justificativa e sem aviso prévio do motorista".

Em sentido contrário, a 36ª Câmara ordenou que a plataforma reativasse a conta de um profissional por entender que a empresa não havia comprovado a violação dos termos de uso.

Já a 30ª Câmara negou pedido de indenização porque a Uber teria demonstrado o motivo do bloqueio da conta: "cancelamentos excessivos" de corridas por parte do motorista, como se os condutores fossem obrigados a aceitar um número mínimo de viagens.

STF precisa decidir sobre vínculo CLT

Na avaliação de Edouard Dardenne Neto, professor da pós-graduação em Direito da PUC (Pontifícia Universidade Católica) e do Mackenzie em São Paulo, o passo mais importante para harmonizar a jurisprudência — ou seja, garantir decisões semelhantes — deve ser dado pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

Em processo relatado pelo ministro Edson Fachin, a corte vai bater o martelo sobre a existência ou não de vínculo empregatício, nos moldes da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), entre motoristas e aplicativos. O julgamento também vai determinar que ramo do poder judiciário terá competência para analisar os contratos entre profissionais e plataformas: Justiça do Trabalho ou Justiça Comum.

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No entanto, diz o professor, tanto os TJs como o STJ (Superior Tribunal de Justiça), segunda e terceira instâncias da Justiça Comum, poderiam estabelecer parâmetros para as ações que já vêm julgando.

Basicamente, há duas perguntas a serem respondidas: as plataformas podem descredenciar motoristas sem motivação? Em caso negativo, que critérios precisam seguir caso tenham de justificar o bloqueio de profissionais? "Isso precisa ser determinado, a gente precisa ter transparência", afirma Dardenne Neto.

Para o procurador do MPT (Ministério Público do Trabalho) e professor de Direito da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), há uma "confusão" de linhas de pensamento jurídico nas decisões da Justiça que reconhecem a liberdade das plataformas para descredenciar motoristas, sem justificativa.

Na opinião de Carelli, que defende o vínculo empregatício CLT entre motoristas e aplicativos, só um empregador de fato poderia romper unilateralmente um contrato, pagando os encargos da rescisão.

Já num contrato de natureza não trabalhista, como querem as plataformas, a relação não poderia ser extinta sem cláusulas claras previstas em contrato. "É toda uma confusão que vai causar cada vez mais confusões. Qualquer um — que queira ver — vai ver que o motorista é um trabalhador", afirma.

O que dizem motoristas e plataformas

Reclamações sobre punições injustas e desligamentos arbitrários impostos por plataformas são recorrentes entre motoristas.

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Não à toa, o tema da "transparência" foi um dos mais debatidos na comissão montada em Brasília pelo governo federal, no ano passado, para tentar construir uma nova regulamentação para a categoria. O grupo de trabalho deu origem ao Projeto de Lei Complementar 12/2024, atualmente em tramitação no Congresso.

"As plataformas têm que justificar e, mais do que justificar, informar que o motorista vai ser bloqueado", defende Carina Trindade, presidente do Sindicato dos Motoristas por Aplicativos do Rio Grande do Sul e integrante da comissão montada na capital federal. "Aquele motorista que comprou um carro ou investiu num carro mais caro para trabalhar precisa saber que vai ser bloqueado e ter uma chance de se defender", complementa.

Em nota, a Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia) afirma que as decisões judiciais divergentes causam "insegurança jurídica". Segundo o texto, uma decisão da terceira turma do STJ já estabeleceu que "não existe impedimento para que a plataforma de aplicativo de transporte individual suspenda imediatamente a conta de motorista em razão de ato considerado grave".

Por fim, a nota informa ainda que a entidade defende a "evolução da relação entre plataformas e motoristas parceiros em direção a uma maior transparência, incluindo o estabelecimento de critérios claros para todos". Porém, sustenta que eventuais "regulamentações não devem incluir dispositivos que venham a promover a intervenção direta na operação das empresas".

Reportagem

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