Ig Nobel premia estudos sobre redemoinho capilar, plantas de plástico e respiração anal

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Por que algumas pessoas têm um redemoinho no cabelo para o lado direito e outras para o lado esquerdo? Como uma planta consegue imitar folhas de outras plantas à sua volta? Qual o segredo daqueles que vivem mais de 100 anos? Como melhorar a circulação de oxigênio em quem tem problemas respiratórios?

São perguntas curiosas e inusitadas como estas que motivaram os pesquisadores vencedores do 34° prêmio Ig Nobel deste ano, entregue na noite desta quinta-feira (12) no campus do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), nos Estados Unidos.

Entre os destaques, está a pesquisa do brasileiro Felipe Yamashita, que estudou a planta sul-americana Boquilha trifoliolata, conhecida por botânicos por ser capaz de mimetizar outros tipos de plantas ao seu redor. Em seu experimento, a espécie copiou folhas de plantas de plástico.

Por meio do estudo, ele e seu grupo avaliam a hipótese de que as plantas podem ter uma espécie de percepção visual. "Não é uma visão como a humana, mas pode ser um tipo de visão primitiva", afirma Yamashita em entrevista à Folha. "É interessante receber o prêmio porque dá visibilidade ao nosso trabalho", comemora.

Um artigo de pesquisadores japoneses também foi premiado por estudar a respiração através do ânus em mamíferos. A ideia surgiu durante a pandemia de Covid-19 para auxiliar pacientes que precisam respirar com ajuda de aparelhos. O experimento injetou oxigênio em roedores e porcos para testar a absorção de oxigênio pelo intestino – e deu certo.

A pesquisa, agora, entrará em fase de ensaio clínico em pessoas para avaliar se pode ajudar aquelas que têm insuficiências respiratórias.

Outro premiado foi um artigo que avaliou condições genéticas da formação dos redemoinhos capilares de pessoas do hemisfério norte e do hemisfério sul. Os resultados mostraram que, no norte, há mais redemoinhos capilares para o sentido horário, enquanto no sul, para o sentido anti-horário.

Reconhecimento da criatividade

Esta foi a primeira edição presencial do evento desde 2020, quando eclodiu a pandemia de Covid-19 no mundo. O prêmio é uma sátira ao Nobel, entregue anualmente desde 1901 para pessoas e instituições com grandes contribuições à ciência e à humanidade. O Ig Nobel foi criado em 1991 pelos editores do periódico de humor científico Annals of Improbable Research (Anais da Pesquisa Improvável, em português).

Os vencedores levam para casa um tipo de troféu inusitado e exclusivo, que tem alguma relação com o tema da pesquisa. A entrega dos prêmios é sempre feita por laureados reais do Nobel. Neste ano, participaram da cerimônia os economistas Esther Duflo e Abhijit Banerjee (2019), Eric Maskin (2007), o químico Moungi Bawendi (2023) e o sociólogo Robert Merton (1997).

Ao receberem o prêmio, os homenageados são desafiados a explicarem seus artigos em 60 segundos para a audiência. Dois dias depois da cerimônia acontece um encontro entre os pesquisadores e o público interessado em conhecer melhor os seus trabalhos com mais tempo de exposição.

Assim como o Nobel, o Ig Nobel é dividido em categorias – mas mais flexíveis do que o grande prêmio. Neste ano, foram premiados dez estudos nas áreas de botânica, anatomia, medicina, psicologia, física, química, probabilidade, biologia, demografia e um "prêmio da paz". Em anos anteriores, também foram destacadas pesquisas nas áreas de arte, literatura, economia, engenharia, antropologia, entre outras. A cada edição é apresentado um tema geral para o evento. Neste ano, foi a Lei de Murphy, que diz que se algo pode dar errado, dará.

A ideia da brincadeira é destacar pesquisas que provocam o riso, em um primeiro momento, e depois a reflexão. "Não é um prêmio depreciativo nem equivalente ao Framboesa de Ouro [que se contrapõe ao Oscar e premia os piores trabalhos de Hollywood], mas é um prêmio para exaltar a criatividade na ciência", afirma a bióloga Maria Mercedes Okumura, curadora do Ig Nobel, professora de bioarqueologia e evolução humana no Instituto de Biociências da USP (Universidade de São Paulo) e coordenadora do Laboratório de Estudos Evolutivos Humanos do Instituto de Biociências.

Para ela, pesquisas mais criativas, que desafiam o padrão que se espera de cientistas e da ciência podem sofrer preconceito por parte de acadêmicos tradicionais. Por isso, o prêmio é uma forma de valorizar o pensamento fora da caixa e dar visibilidade a trabalhos diferentes. "A criatividade pode levar um pesquisador a ter grandes sacadas", defende a bióloga.

Não há critérios rígidos de mérito científico para a escolha dos premiados, e também o estudo não precisa ser tão recente. "Escolhemos por meio do título e dos resultados inusitados, mas todos são publicados em revistas de verdade, periódicos com revisão de pares e outros critérios", diz Okumura. "Mas é tudo bem informal e divertido", conta.

Veja abaixo a lista dos vencedores em cada categoria:

Paz: O psicólogo B.F. Skinner estudou se pombos podem ser usados em mísseis para guiar os projéteis até seus alvos. O experimento foi bem-sucedido no treinamento das aves, mas o projeto não seguiu adiante.

Botânica: Felipe Yamashita e Jacob White descobriram que a planta Boquila trifoliolata pode imitar folhas de plantas de plástico, o que sugere que elas podem ter percepção visual

Anatomia: Roman Khonsari investigou redemoinhos capilares em pessoas do hemisfério norte e do hemisfério sul

Medicina: Pesquisadores suíços, alemães e belgas mostraram que medicamentos falsificados com efeitos colaterais dolorosos podem ser mais eficientes do que remédios que não causam efeitos colaterais aos pacientes

Física: James Liao, da Universidade da Flórida, investigou como as trutas mortas podem influenciar o comportamento de outros peixes em rios, mostrando o impacto ambiental dos animais mortos sobre outras espécies.

Psicologia: Pesquisadores japoneses descobriram que mamíferos são capazes de respirar por meio do ânus. A expectativa é de que o achado possa auxiliar no tratamento de doenças respiratórias em humanos.

Probabilidade: Um grupo de 50 cientistas jogou moedas para cima 350.757 vezes para comprovar que elas têm uma leve tendência de cair com o mesmo lado para cima, comprovando o teorema do matemático Persi Diaconis

Química: Cientistas de Amsterdã usaram uma técnica chamada cromatografia para separar vermes "bêbados" dos "sóbrios". O artigo foi parte de uma pesquisa sobre polímeros.

Demografia: Intrigado com os centenários pelo mundo, Saul Newman investigou certidões de nascimento de pessoas muito idosas em vários lugares do mundo e mostrou que há falhas nos registros muito antigos, o que coloca em dúvida a verdadeira idade de pessoas acima dos 100 anos.

Biologia: Dois pesquisadores foram premiados por mostrar, nos anos 1940, que vacas produzem menos leite quando têm um gato sobre suas costas e quando ouvem sacos de papel sendo estourados por perto

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