Dirigir um carro movido a hidrogênio é como estar ao volante de um modelo elétrico, mas com as facilidades de um automóvel a combustão. Essa é a impressão deixada já nos primeiros quilômetros ao volante do Hyundai Nexo. Seria o mundo perfeito, mas aí vem a realidade.
O modelo que chegou ao Brasil para participar de testes só pode ser plenamente abastecido na Unifei (Universidade Federal de Itajubá). A instituição mineira é a única que oferece um posto com a pressão de 700 bar exigida pelos cilindros do SUV sul-coreano.
A inviabilidade de uso cotidiano desfaz o encanto, mas há caminhos. Grupos como o conglomerado Hyundai —que domina toda a cadeia do hidrogênio, da produção à distribuição—, pretendem viabilizar seu uso no transporte.
O sul-coreano Nexo é o veículo de passeio de maior sucesso nessa categoria. Foram comercializadas 38 mil unidades desde seu lançamento, em 2018. É um SUV de porte médio que traz elementos presentes em modelos atuais da marca, como a barra de LEDs que interliga as luzes diurnas e uma tela digital que agrega quadro de instrumentos e central multimídia.
Na prática, é um veículo elétrico, já que o motor que o coloca em movimento é semelhante a outros tantos disponíveis em modelos a bateria. A diferença é que não há bateria.
Os acumuladores de energia são substituídos pelos cilindros de hidrogênio, que comportam pouco mais de seis quilos do gás. Ao ser combinado com o oxigênio da atmosfera, há geração de energia elétrica, que alimenta os motores.
O escapamento emite apenas vapor d’água —que é justamente o resultado da combinação do hidrogênio com o oxigênio. Segundo a Hyundai, o ar que sai é mais limpo do que o que entrou pelo sistema de admissão.
Isso ocorre devido à necessidade de purificar o ar atmosférico. A combinação precisa ser livre de impurezas, por isso há um filtro de alta capacidade instalado no veículo.
É um sistema complexo, mas leve. Todo o conjunto, incluindo os cilindros de hidrogênio, pesa 110 quilos, de acordo com a fabricante. A autonomia é de aproximadamente 600 quilômetros.
Para ir tão longe, um carro 100% elétrico do mesmo porte precisaria carregar cerca de 800 quilos de baterias. Além de elevar o custo, isso comprometeria a dinâmica do veículo. É nesse ponto que o Nexo se destaca.
Com cerca de 1.800 quilos e 4,67 metros de comprimento, o SUV da Hyundai não se distancia tanto de modelos de mesmo porte a combustão, como o Volkswagen Tiguan (1.794 quilos). Portanto, não é preciso muita potência para se obter bom desempenho.
O Nexo tem 163 cv e arranca como um carro elétrico. O torque imediato permite ir do zero aos 100 km/h em 9,2 segundos, bom número para a categoria.
Não há barulho nem fumaça tóxica. O motorista logo esquece que está sentado sobre um sistema caríssimo e segue seu caminho como se dirigisse um dos tantos carros a bateria disponíveis hoje no país.
O teste começou com o marcador de autonomia indicando 280 km de alcance. A capacidade de hidrogênio estava na metade, o que condiz com o alcance de 600 km estimado pela Hyundai. Era o suficiente para chegar a Vinhedo (interior de São Paulo), uma viagem de aproximadamente 80 quilômetros.
O interior claro e os muitos botões do console central estão meio datados, já que se trata de um modelo lançado em 2018. Fora esses detalhes, tudo tem cara de amanhã. O problema é o preço do futuro.
Os cilindros, por exemplo, são tratados como peças de espaçonave. Ultrarresistentes, trazem sistemas que monitoram falhas e reduzem riscos de vazamento e incêndio. O conjunto responsável pela reação eletroquímica também é caro e precisa de escala para se tornar mais acessível. Caso chegasse ao Brasil, o Nexo atual custaria cerca de R$ 700 mil.
Outro problema é o preço do hidrogênio. Nos EUA, por exemplo, um quilo do gás nos raros postos da Califórnia chegou a custar o equivalente a R$ 200, segundo cálculo feito em outubro pela S&P Global Commodity Insights.
No Brasil, a possibilidade em estudo é a geração de hidrogênio por meio de reformadores alimentados por etanol. A tecnologia está sendo desenvolvida pela Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo) com o apoio da Hyundai, da Toyota e da Raízen, entre outras empresas.
O objetivo é que, no futuro, o sistema seja instalado em postos de combustível. O hidrogênio gerado não chega a ser verde, mas é considerado de baixo carbono.
Ainda é algo distante das ruas, mas abre possibilidades para o transporte de cargas, por exemplo. Um caminhão com célula de combustível a hidrogênio pode ter uma autonomia muito maior que um modelo a bateria, além de ser rapidamente recarregado.
No caso do Hyundai Nexo, os cilindros são carregados em cerca de cinco minutos no equipamento disponível na Unifei (Universidade Federal de Itajubá).