Entenda modalidades de intervenção do Banco Central no câmbio e seus riscos

há 5 dias 3

O final do ano costuma ser uma temporada de escassez relativa de dólares no mercado brasileiro. A procura da moeda americana é habitualmente maior porque empresas remetem lucros, dividendos. Neste ano, teria havido um aumento atípico dessas remessas, devido ao melhor resultado das empresas em 2024, de resto "com saída maior de pessoa física e, mais recentemente, de plataformas, que são volume de operações menores", disse na semana passada o ainda presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.

Essas saídas extraordinárias podem provocar aumentos súbitos e grandes da cotação do dólar, altas que podem ser enquadradas na categoria de "disfuncionais", segundo o BC.

No entanto, além do dezembro habitualmente "seco" de dólares, pode ter havido também saídas de dólares motivadas por vendas de ativos financeiros brasileiros por parte de investidores que preferem se desfazer de aplicações no país devido a insatisfações com o destino da política econômica ou da economia em geral.

Isto é, mais precisamente, com a política de gastos do governo.

Essas pressões compostas, remessas pontuais de dezembro mais desconfiança, podem impulsionar o preço do dólar. A desvalorização mais acentuada do real pode suscitar outras operações, destinadas a obter ganhos com a perspectiva de alta da moeda americana.

Isso posto, como deve agir o Banco Central?
Como diz o comando do BC, o câmbio é flutuante —a autoridade monetária não vai agir a fim de fixar uma taxa de câmbio, a fim de se contrapor a uma tendência relacionada aos fundamentos da economia e do crédito do país.

Por outro lado, o estrangulamento do mercado, por falta de liquidez (quantidade de dólares disponíveis para a venda), pode encarecer o dólar de forma anormal, mesmo em operações relativamente pequenas. Altas súbitas podem provocar danos por si só —na situação de empresas e instituições que dependem de operações com dólares, em altas de taxas de juros, talvez em uma sucessão de problemas.

Não há manual para a ação e não é simples discernir as causas do impulso da desvalorização. Depende de avaliação das condições econômicas domésticas e internacionais, das demandas pontuais de compra de dólar, do que se passa nos mercados futuros da moeda etc.

Em consultas com instituições financeiras e na observação dos movimentos de capital, o BC notou demanda atípica de dólar à vista, para operações de remessas, como acabou por se notar também nas estatísticas de fluxo cambial (diferença entre saídas e entradas de dólares do país).

Nesse caso, a opção foi de intervir a fim de atender a demanda excepcional de dólar à vista (compra com objetivo de fazer remessas), moeda que foi vendida em leilões para instituições financeiras.

Portanto, houve vendas de dólares à vista e nos chamados leilões de linha (vendas com compromisso de compra em data futura determinada, na prática um empréstimo temporário para empresas financeiras).

Tais vendas acabam por ter efeitos em outras operações de dólar e em outros mercados financeiros, como o de juros. Mas o objetivo principal era atender àquela demanda específica e atípica de dólares à vista.

Existem outros tipos de intervenção?
O BC pode fazer outras formas de intervenção, diretas e indiretas.

A mais comum, recorrente e maciça ocorre por meio de uma operação chamada de "swap cambial", nas quais a autoridade monetária não vende dólares. Trata-se de uma operação financeira, um contrato, em que o BC oferece pagar à outra parte a variação do dólar em determinado período; em troca ("swap") recebe a variação da taxa básica de juros. A outra parte do contrato assim pode se proteger da variação do dólar —é uma espécie de seguro.

A depender da variação de cada uma das duas taxas, o BC e sua contraparte podem perder ou ganhar dinheiro.

Folha Mercado

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Neste caso, o BC não gasta dólares das reservas internacionais, aplicações em dólares ou equivalentes que acumula a fim de fazer intervenções ou, em geral, ter recursos bastantes em caso de falta extrema de recursos para o pagamento de contas externas.

As operações são liquidadas em reais.

Quando recorrer a esse tipo de operação de swap?
O debate é ainda mais controverso em se tratando de câmbio flutuante. Nesse caso, não se trata de satisfazer uma demanda excepcional e pontual de moeda à vista. Mas pode haver um ambiente disfuncional, provocado, por exemplo, por grandes operações no mercado futuro (contratos de compras de dólares a determinada taxa no futuro). No Brasil, o mercado futuro de dólar é bem maior do que o mercado à vista e costuma determiná-lo.

Quando cogitar intervenções?
Quando há volatilidade (variação grande e frequente) de preços. Quando a taxa de câmbio parece, a depender do juízo, descolada das condições econômicas e financeiras (por exemplo, mesmo quando há fluxo cambial positivo, quando não há degradação das contas externas, inflação descontrolada ou piora significativa da situação fiscal).

Se o preço do dólar tem alta rápida, pode haver então piora das expectativas inflacionárias, o que tende a elevar as taxas de juros de mercado, o que costuma implicar baixas no preço das ações. Essas mudanças de preços e taxas podem se realimentar ou mesmo suscitar especulações que intensificam tais movimentos.

Se o BC oferece swaps cambiais, tal movimento pode ser atenuado (se oferece proteção para quem apenas quer evitar perdas maiores com a desvalorização ou contém possível especulação). Pode, assim, conter o preço no mercado à vista; aumenta o risco de quem aposta na variação unidirecional (apenas para cima, no caso). O BC age, então, a fim de conter essa espiral negativa e, em tese, descolada dos "fundamentos" (sempre uma avaliação controversa), ou uma volatilidade excessiva de preços (que pode até paralisar decisões e operações).

Se não intervém, o BC pode contribuir para desvalorização adicional ou descontrolada da moeda, com prejuízos para a economia dita real e tumultos nos mercados financeiros. No entanto, por outro lado, uma intervenção mal fundamentada pode suscitar a ideia de que a autoridade monetária pretende fixar a taxa de câmbio em algum nível, talvez de modo a evitar efeitos na inflação, o que pode suscitar altas nas taxas de juros e outros sinais de descrédito.

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