O anúncio pela chinesa Betavolt de uma bateria nuclear com tempo de vida de meio século, no ano passado, causou admiração e ceticismo, inclusive em mídia social no país. Em parte por ser uma startup desconhecida, formada em 2021.
A bateria foi prometida para dezembro último, mas agora seu presidente, Zhang Wei, diz por telefone que deve apresentar o produto aos investidores e compradores interessados em julho, em Pequim.
Não será uma bateria para o consumidor comum. Mas, acrescenta ele, o Brasil e toda a América do Sul estão na mira da empresa, após o lançamento chinês.
Baterias nucleares que duram décadas são usadas nos programas espaciais russo e americano desde os anos 1950 e mais recentemente no chinês, como no veículo lunar da missão Chang'e-3, que iniciou operações há 12 anos. No caso, o plutônio decai (desintegração radioativa) e emite calor, a ser usado por um conversor termelétrico.
Na bateria da Betavolt, BV100, a energia é obtida da própria radiação, antes de se tornar calor. O níquel-63 usado decai por emissão beta, liberando elétrons. Camadas finas dele são colocadas entre camadas de semicondutor, que capturam os elétrons e os transformam em eletricidade.
Segundo o material de divulgação da empresa, sua aplicação potencial, a depender do desenvolvimento, incluiria sustentar smartphones sem recarregar e drones sem aterrissar. Aguentaria temperaturas de 60 graus negativos a 120 graus positivos.
No futuro, pretende atender às necessidades de fornecimento de energia de longa duração de dispositivos aeroespaciais, de inteligência artificial, equipamentos médicos, sistemas microeletromecânicos, sensores, pequenos drones e micro-robôs.
O problema foi que o modelo apresentado inicialmente tinha potência de apenas 100 microwatts, e analistas da própria mídia oficial chinesa avaliam ser baixa demais em relação às baterias comuns.
A conta é que, limitadas a 100 microwatts cada uma, seriam necessárias 60 mil baterias BB100 para acender uma única lâmpada de 60 watts.
Zhang promete para julho uma bateria de 1 watt, 10 mil vezes mais poderosa, mas, no dizer do canal chinês CGTN, "ainda longe de ser a maior fonte portátil de energia no mundo". Uma bateria comum AA tem potência de cerca de 2,4 watts.
Além da duração —seus anunciados 50 anos ante cerca de uma hora da AA comum—, outra vantagem ressaltada na bateria da Betavolt seria o fato de ser mais segura. Suas emissões de elétrons afetariam menos o corpo humano e seriam barradas pelas próprias caixas de metal da bateria.
Uma das aplicações aventadas pela Betavolt, com o argumento de que sua bateria não deixa escapar radiação, é em marca-passos e implantes no próprio corpo. Também promete baixo impacto ambiental, argumentando que, após decair por décadas, o resultado não é mais radiativo —e a própria empresa responderia pela reciclagem.
Outras baterias de tecnologia semelhante, chamadas de betavoltaicas, vêm sendo desenvolvidas para aplicação comercial há anos, algumas com material considerado de maior segurança do que o níquel-63, como a americana CityLabs, com tritium.
O Brasil também está na corrida, mas ainda com tecnologia de bateria nuclear termelétrica. Dias antes da Betavolt, um grupo de pesquisadores do Ipen (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares) apresentou em São Paulo um protótipo, usando amerício.
O projeto é bancado, para eventual aplicação comercial, por uma empresa brasileira não nomeada. A estimativa dos pesquisadores é de alcançar uma bateria com duração de mais de 200 anos.