Convênio de Itaipu emprega aliados do PT

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Com remuneração de R$ 20 mil mensais, ao menos cinco pessoas que trabalharam ou são próximas de políticos do PT foram escolhidas para coordenar um programa da usina de Itaipu que prevê desembolsos milionários.

Entre os que acompanham a rotina da hidrelétrica, cresce a percepção de que o dinheiro da conta de luz, fonte do caixa da usina, está sendo usado para fazer política partidária. A gestão da usina nega com veemência que exista tal estratégia. Atualmente, o diretor-geral de Itaipu é Enio Verri. Eleito para o terceiro mandato como deputado pelo PT em 2022, renunciou para assumir a estatal.

A Folha teve acesso a parte dos convênios socioambientais da usina. Um projeto que gera desconforto entre quem acompanha a estatal é o convênio Governança Participativa para a Sustentabilidade – Itaipu Mais que Energia.

Ele prevê o desembolso de R$ 76,5 milhões, de dezembro de 2023 a dezembro de 2027, com uma meta de replicar para outras entidades no Estado a metodologia de trabalho do programa Itaipu Mais que Energia, a grande bandeira da gestão atual.

Lançado em 2023, o programa Mais que Energia é uma grande campanha de marketing que serve de guarda-chuva para centenas de convênios, firmados com inúmeras instituições, e sustenta gastos bilionários em projetos socioambientais.

Para aplicar a proposta, o convênio dividiu a área de influência de Itaipu —Paraná e sul de Mato Grosso do Sul— em 21 núcleos de cooperação socioambiental, sob o comando de sete coordenadores regionais. Para esses postos foram escaladas ao menos cinco pessoas que trabalharam ou são próximas de políticos do PT. Os nomes constam nos relatórios de atividades.

Entre os que assumiram coordenações está Bruno Goretti Tresse, que ficou conhecido como assessor do deputado estadual petista Arilson Chiorato, presidente estadual do PT e líder da oposição na Assembleia do Paraná —e considerado pelos petistas herdeiro político do ex-deputado André Vargas.

Outro coordenador é Arieto Conceição Alves, que integrou a equipe do vereador Angelo Vanhoni (petista que tentou a prefeitura de Curitiba) e foi deputado estadual e federal.

Rosselane Liz Giordani deixou o posto de secretária de Cultura em Toledo no início de 2024 para assumir uma coordenação. O prefeito era Beto Lunitti (PSD), mas pessoas do estado afirmam que Rosselane é próxima do deputado federal Elton Welter, do PT.

Também ocupa uma coordenação Élio Marques, que atuou como assessor parlamentar do próprio Enio Verri, quando ele foi deputado federal, de fevereiro de 2019 a março de 2023. Na sequência, Marques passou para o gabinete do Welter, onde ficou até março de 2024.

Há um coordenador que é do partido —Florisvaldo Raimundo de Souza, o Floris do PT, quadro histórico, ligado ao grupo da deputada federal e presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann.

A reportagem fez contato com todos. O único que falou sobre a função foi Marques, que disse ter ficado no posto apenas nos meses de maio e junho de 2024 e não ter nenhum vínculo com Itaipu, participando eventualmente de eventos do programa de maneira informal.

Marques aparece em filmagens oficiais do programa, em novembro do ano passado. Também é retratado em postagem numa rede social, em 8 de janeiro deste ano, durante visita a Colorado, no Paraná, quando é identificado como assessor do programa, posando ao lado da coordenadora regional Samireille Messias, baseada em Maringá, que também não deu retorno à reportagem.

CONVÊNIO É ACOMPANHADO POR AMIGA DE JANJA E EX-CHEFE DE GABINETE DE DEPUTADO DO PT

Todas as divulgações afirmam que o Governança Participativa vai criar um modelo de gestão para políticas públicas nacionais, tanto que o programa tem apoio do governo federal. A sua solenidade de lançamento contou com a presença do vice-presidente Geraldo Alckmin.

Pelo lado de Itaipu, quem acompanha o convênio de perto é a assessora da diretoria Silvana Vitorassi. No evento de integração dos trabalhos, em novembro de 2024, por exemplo, foi ela que fez o balanço. Há vídeos na internet em que ela explica a proposta.

Funcionária de carreira na estatal, com experiência em gestão socioambiental, Vitorassi participou da equipe de transição do governo Lula 3. É amiga da primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, com quem trabalhou em Itaipu. É tão próxima que, nas postagens do casamento de Janja e Lula, ela aparece no grupo de amigas. É vista com frequência em Brasília e identificada como olhos e ouvidos da primeira-dama na hidrelétrica.

Oficialmente, quem propôs e firmou o convênio foi o Parquetec, antiga Fundação Parque Tecnológico de Itaipu. Quem assina é o diretor de Negócios e Empreendedorismo do Parquetec, Eduardo de Miranda, mais conhecido como o Pinta. Jornalista, até assumir o posto no Parquetec trabalhava com o deputado Chiorato, a quem agradeceu os anos como seu chefe de gabinete no discurso de posse na entidade.

Como instituição privada, sem fins lucrativos, o Parquetec deveria ser independente. No entanto, os diretores são nomeados pelo comando de Itaipu. Advogados que acompanham a binacional tratam isso como uma anomalia, pois, como firma contratos com Itaipu, não poderia ter uma diretoria nomeada pela própria usina.

O Parquetec é parceiro forte da usina em projetos socioambientais. A assessoria de imprensa informou à reportagem que, em 2023 e 2024, o Parquetec firmou 28 convênios com Itaipu, que totalizaram R$ 494,7 milhões, a serem executados e repassados em até cinco anos.

Os convênios do Parquetec têm como característica reservar uma boa parcela do orçamento para pessoas. Cerca de 33% do montante global foi para serviços de terceiros, outros 28% para pessoal e encargos, ou seja, 60% em média. Quase todos os projetos incluem pagamento por móveis e equipamentos, cerca de 8% do valor total.

Em linhas gerais, a disseminação da "governança", que dá título ao projeto, é feita em eventos, como seminários, webinars, oficinas e campanhas educativas, cujo público são representantes de entidades, instituições educacionais e órgãos públicos. No orçamento, o gasto médio mensal com café e alimentação é de quase R$ 400 mil —totaliza R$ 7 milhões ao final dos quatro anos de validade do projeto.

Ao mesmo tempo em que lançou o programa Mais que Energia, Verri expandiu a área oficial de influência de Itaipu, onde esse recurso pode ser gasto. De 55 municípios nas proximidades da hidrelétrica, passou a atender 434 —todos os 399 do Paraná e 35 no sul de Mato Grosso do Sul.

O dinheiro para financiar esses e outros projetos vem da tarifa de energia da usina, que é obrigatoriamente cobrada de todos os brasileiros que moram nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste —tarifa essa que tem sido mantida elevada justamente para gerar esse extra bilionário voltado a obras e projetos socioambientais. Só em 2024, Itaipu no Brasil teve US$ 450 milhões (o equivalente a R$ 2,5 bilhões) para este fim.

OUTRO LADO: Instituição especializada escolheu coordenadores, diz usina e Parquetec

Apesar de a reportagem ter procurado Itaipu e Parquetec separadamente, ambos enviaram a mesma reposta, destacando que os coordenadores, chamados técnicos regionais, ficaram a cargo de outra empresa.

"Os técnicos regionais [coordenadores] foram contratados como pessoas jurídicas e selecionados por meio de uma instituição especializada, conforme estabelecido no convênio com o Parquetec, e são qualificados para a atividade", afirmam as notas.

A entidade em questão é o Itai (Instituto de Tecnologia Aplicada e Inovação). Trata-se de associação civil, sem fins lucrativos, que possui qualificações de Oscip (Organização de Sociedade Civil de Interesse Público). No entanto, o Itai fica baseado na área do Parquetec e, na prática, é mantido com recursos repassados por Itaipu.

No que se refere ao valor da remuneração mensal, Itaipu e Parquetec responderam que ele inclui gastos com translado e alimentação.

"Os técnicos atuam nos 21 núcleos de cooperação socioambiental composto por todo o estado do Paraná e o sul de Mato Grosso do Sul, uma área de 200 mil quilômetros quadrados", destaca o texto.

"O orçamento para o trabalho, que engloba todas as despesas operacionais relacionadas à prestação de serviços, desde a locomoção, alimentação, hospedagem e outras despesas diretamente associadas à execução do projeto, que tem uma característica de execução em campo, é de R$ 20 mil mensais."

Parquetec e seu diretor de Negócios e Empreendedorismo, Eduardo de Miranda, enviaram a mesma declaração à reportagem, destacando que o projeto Governança Participativa tem foco na disseminação de práticas sustentáveis e culturais, áreas em que Miranda tem qualificação. Tem MBA em gestão de projetos pela PUC-RS e aperfeiçoamento internacional no Emerald Culture Institute.

A assessoria de Chiorato enviou nota em nome do deputado, validando a capacidade técnica dos antigos assessores.

"São pessoas competentes com qualificação técnica, experiência profissional e vivência social. Quando estiveram comigo no mandato prestaram um grande serviço", diz o texto. "Agora que pertencem à equipe e passaram pelo crivo técnico da Itaipu, tenho certeza que terão o mesmo comprometimento para realizar os projetos que a Binacional designar a ambos."

O deputado Welter afirmou que, por acaso, mora na mesma cidade que Rosselane, Toledo, e ela foi convidada pela estatal por sua qualidade técnica. "Tem excelente formação. É doutora em letras --um baita de um quadro."

O Itai não enviou posicionamento até a publicação deste texto. Silvana Vitorassi orientou a Folha a procurar a assessoria de Itaipu. A assessoria da primeira-dama respondeu que não se manifestaria. A reportagem também fez contatos com o vereador Vanhoni, que não respondeu.

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