Ed Sheeran surge de repente, só com o violão, para apresentar o seu show no Rock in Rio Lisboa. O cantor britânico, que encabeça o Rock in Rio no dia 19 de setembro na capital fluminense, dispensa a decoração no palco. Seu principal aparato é o telão, como se recusasse a teatralidade que hoje domina os shows de música pop, cada vez mais megalomaníacos, como os de Taylor Swift e The Weeknd, que competem para ter a turnê mais enfeitada.
Sheeran sabe que seu principal atributo para encantar as plateias está na voz e nas baladas românticas como "Thinking Out Loud" e "Photograph", que embalaram muitos romances na última década. Dessa forma, ele guia a multidão à catarse, aos berros, com muitas lágrimas e beijos.
Foi assim no Rock in Rio Lisboa, há dois meses, onde o britânico encabeçou o dia mais meloso da programação, cantando para 80 mil pessoas.
No entanto, demora para o cantor chegar aos seus sucessos. Até lá, o público precisa aguentar uma série de músicas pouco conhecidas, que se arrastam. Sheeran não emplaca um megahit há pelo menos dois álbuns e está distante do auge que viveu entre os anos de 2014 e 2018, quando seus singles viviam no topo das paradas e tocavam à exaustão em rádios de música pop.
O cantor é tido como a voz dos eternos apaixonados. Em "Shape of You", um dos videoclipes mais vistos do YouTube, com cerca de 6 bilhões de visualizações, o cantor narra um amor à primeira vista, carnal e arrebatador. Pela canção, ele ganhou o Grammy de melhor performance pop solo.
Quem gosta de sofrência também tem o artista como ídolo. "Photograph", lançada há dez anos, trata de um amor que perdura por meio das memórias, enquanto "Give Me Love", de 2011, versa sobre a abstinência de uma paixão.
No entanto, depois de lançar "Divide", o disco mais celebrado de sua carreira pela crítica, Sheeran quis deixar de ser o centro das atenções. Sua discografia seguiu em um tom menos radiofônico e mais melancólico, que culminou no seu penúltimo álbum, "Subtract", do ano passado.
O projeto sintetiza uma série de traumas que o cantor viveu nos últimos anos —a descoberta do tumor de sua mulher, que estava grávida, a morte de um de seus melhores amigos e uma acusação de plágio. "O sentimento de perda simplesmente do- minou minha vida", afirmou o cantor no documentário "Ed Sheeran: A Soma de Tudo".
O amor não deixou de ser um tema central de "Subtract", mas surgiu embalado numa tônica tristonha, quase mórbida. Há letras que tocam em temas como suicídio, caso de "Salt Water", e automutilação, caso de "Curtains". O disco soa mais limpo, sem tantos elementos sonoros como nos trabalhos anteriores. Sheeran deixa a voz ecoar sobre os instrumentos, à semelhança de como prefere cantar ao vivo.
Meses depois, ele lançou "Autumn Variations", seu primeiro disco fora de uma gravadora. O cantor disse que fez a mudança justamente para fugir da pressão de lançar um hit atrás do outro. Queria cantar sobre o que sentisse vontade e só quando quisesse.
Assim, o cantor vem deixando a imagem de paladino do romance. Numa fase de pouco sucesso comercial e prestígio da indústria, ele parece uma escolha um tanto datada para o Rock in Rio. Mas quem estiver por lá vai notar que o artista sabe liderar multidões. Ele interage, conta causos da carreira, explica as músicas e, ao fim do show, cheio de sensualidade em "Shape of You", ainda soa como o mesmo eter- no enamorado que vivia paixões sem limites e restrições.