Opinião - Gustavo Alonso: Globo readapta 'Vale Tudo', mas as canções são mais do mesmo

há 6 horas 1

O remake de "Vale Tudo" estreou na Globo há três semanas. Se na teledramaturgia a emissora modernizou a trama, em relação a trilha sonora a Globo continua dando sinais de que parou no tempo.

A trilha sonora de "Vale Tudo" é um show de repeteco. Várias canções foram resgatadas da trilha original de 1988. "Brasil", cantada por Gal Costa, continua sendo a abertura da novela. "Isto Aqui, o Que É", com Caetano Veloso, e "Faz Parte do Meu Show", de Cazuza, artista morto há 35 anos, completam a pasmaceira do repertório.

Não contentes em repetir canções gravadas três décadas atrás, os produtores musicais de "Vale Tudo" se afogaram no saudosismo. "Gente" é uma versão de Xande de Pilares para música de 1977 de Caetano Veloso. "Dindi", gravada no distante 1967 por Tom Jobim e Frank Sinatra, quase 60 anos atrás, cavou mais ainda o buraco da nostalgia da trilha. Vinícius de Moraes e Toquinho entraram com "O Velho e a Flor", canção de 1971.

Entrou também "Olha", versão gravada por Maria Bethânia em 1993, ou seja, 32 anos atrás. Por sua vez, Liniker entrou na trilha com "Barato Total", canção que foi originalmente gravada no disco "Cantar", de Gal Costa, no longínquo ano de 1974. Silva regravou "Preciso Dizer que Te Amo", canção de Cazuza, Dedé e Bebel Gilberto, gravada no primeiro disco de Bebel em 1986.

Lenine e Cristina Braga entraram na trilha com outra canção antiga, "Certas Coisas", composta por Lulu Santos e Nelson Motta em 1984. Ney Matogrosso regravou "Quase um Segundo", canção de Herbert Vianna lançada em 1988 pelos Paralamas. Marília Mendonça e Cristiano Araújo, ambos já mortos, estão na trilha sonora com "De Quem É a Culpa?", canção que já havia sido lançada por Mendonça há oito anos. Por fim, Emicida canta com Zeca Pagodinho "Quem Tem Amigo (Tem Tudo)", gravada há quatro anos. Haja passadismo!

Há algumas exceções ao saudosismo da trilha sonora. Caetano canta ao lado do trio Os Garotin a canção "Nossa Resenha", lançada ano passado, assim como "Se Eu Usasse Sapato", de Anavitória, e "Perdeu", de Anitta e Simone Mendes. É o caso também de "Clichê dos Amores", gravada em 2024 por Gabeu, Gaby Amarantos e Reddy Allor. É pouca novidade diante de tanto saudosismo.

Para se ter uma ideia de como a Globo despreza as músicas atuais neste remake, basta comparar com a versão original de "Vale Tudo". A única canção antiga na novela de 1988 era "Isto Aqui, o Que É", composição de Ary Barroso dos anos 1940. Todas as outras canções haviam sido lançadas então há menos de um ano. O passadismo não dominava e a preguiça não reinava.

Não se pode dizer que a Globo não tenha tido coragem na adaptação de "Vale Tudo". O roteiro sofreu mudanças consideráveis com a inclusão das novas tecnologias na trama. A incorporação de atores negros também denota vontade de se adaptar às demandas atuais. Mas em relação às músicas, a Globo permanece com a preguiça que vem caracterizando as trilhas sonoras há mais de dez anos.

O curioso é que esta preguiça estende-se apenas às canções nacionais. O repertório internacional é completamente novo em relação à novela de 1988.

As trilhas sonoras nacionais foram fundamentais para a criação da moderna novela brasileira. A Globo fundou a gravadora Som Livre em 1969 para articular produtos audiovisual e musical, dinamizando o mercado. Grande parte da MPB teve na Som Livre uma aliada que fazia suas canções serem ouvidas diariamente na casa de milhões de brasileiros. Alguns artistas, como Djavan e Cazuza, devem sua carreira diretamente à gravadora global, que os lançou.

Hoje em dia, o público assiste cada vez menos novelas. Embora "Vale Tudo" tenha aumentado levemente a audiência em relação à novela anterior, a insossa "Mania de Você", houve certa decepção. A expectativa era de maior alcance. A culpa deve-se, em parte, à incompetência da Globo em renovar a música brasileira na TV. Lamentável.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

Leia o artigo completo