A chuva pode ter sido um ingrediente essencial para a origem da vida, de acordo com um estudo publicado na quarta-feira (21).
A vida hoje existe como células, que são sacos cheios de DNA, RNA, proteínas e outras moléculas. Mas quando a vida surgiu há cerca de 4 bilhões de anos, as células eram muito mais simples. Alguns cientistas investigaram como as chamadas protocélulas surgiram pela primeira vez, tentando recriá-las em laboratórios.
Muitos pesquisadores suspeitam que as protocélulas continham apenas RNA, uma versão de fita simples do DNA. Tanto o RNA quanto o DNA armazenam informações genéticas em suas longas sequências de "letras" moleculares.
Mas o RNA também pode se dobrar em formas intrincadas, transformando-se em uma ferramenta para cortar ou juntar outras moléculas. As protocélulas poderiam ter se reproduzido se suas moléculas de RNA capturassem blocos de construção genéticos para montar cópias de si mesmas.
Um desafio para construir protocélulas é escolher com o que envolvê-las. As células modernas são envolvidas por membranas, barreiras que controlam rigorosamente como as moléculas entram e saem. Mas esse arranjo teria representado um problema para as protocélulas. Elas não teriam sido capazes de absorver as moléculas necessárias para crescer ou expelir resíduos.
Alguns cientistas consideraram se as protocélulas se formaram sem uma membrana. Eles se inspiraram em experimentos químicos de um século atrás, nos quais pesquisadores misturaram produtos químicos em um líquido. Em alguns casos, alguns dos produtos químicos se condensaram em gotículas que flutuavam na mistura. Será que as protocélulas começaram como gotículas flutuantes sem membrana?
Nos últimos anos, pesquisadores exploraram essa possibilidade criando gotículas com RNA contido dentro. Agitar as gotículas era suficiente para dividi-las em duas. Isso poderia ter sido um precursor simples de como as células se dividem ao se reproduzir.
Mas as gotículas de RNA não conseguiam permanecer distintas como as células. As fitas de RNA rapidamente se deslocavam de uma gotícula para outra, e com o tempo todas as gotículas se fundiam, como bolhas de óleo se unindo em uma película sobre a água.
Em 2018, Aman Agrawal, um engenheiro químico, descobriu uma solução potencial para esse problema. Mas levaria três anos para ele perceber o que havia encontrado.
Na época, Agrawal era um estudante de pós-graduação na Universidade de Houston, estudando gotículas feitas de produtos químicos sintéticos. Ele esperava transformar gotículas em fábricas em miniatura para produzir compostos importantes, como insulina.
Para fazer isso, primeiro seria necessário tornar as gotículas mais estáveis. Agrawal ficou impressionado com um estudo de 2015 no qual cientistas suíços conseguiram fazer gotículas durarem seis dias bombeando produtos químicos em canais microscópicos cheios de água purificada.
Agrawal replicou os resultados, mas não conseguiu entender como os canais faziam gotículas tão estáveis. Quatro meses depois, ele encontrou um frasco ignorado do experimento. Ele havia despejado alguns produtos químicos extras e água purificada no frasco, selado e esquecido. Mas agora, olhando para o frasco, ele ficou surpreso ao ver que o líquido tinha uma cor leitosa. Isso significava que as gotículas ainda estavam lá e flutuando dentro.
Agrawal descobriu que a água era responsável por manter as gotículas estáveis. A água incentivava as moléculas na camada externa das gotículas a se ligarem. "Você pode imaginar uma malha se formando ao redor dessas gotículas", disse Agrawal, agora pesquisador de pós-doutorado na Escola de Engenharia Molecular Pritzker da Universidade de Chicago.
Em 2021, a notícia do trabalho de Agrawal chegou a Jack Szostak, um químico da Universidade de Chicago e laureado com o Nobel que trabalhava com protocélulas há mais de 20 anos. Szostak se perguntou se a água poderia tornar as gotículas de RNA mais estáveis também.
Os dois cientistas e seus colegas uniram forças para uma nova rodada de experimentos. Eles combinaram RNA e outros produtos químicos com água purificada. Quando agitaram a solução, ela produziu espontaneamente gotículas de RNA. E essas gotículas permaneceram estáveis por dias, relataram no novo estudo, publicado na revista Science Advances.
Os cientistas especularam que a chuva caindo na Terra primitiva poderia ter fornecido a água necessária para formar gotículas de RNA. Para testar essa possibilidade, Anusha Vonteddu, outra estudante de pós-graduação na Universidade de Houston, colocou frascos do lado de fora durante uma tempestade. Quando ela e seus colegas usaram a água da chuva para realizar os experimentos novamente, as gotículas de RNA provaram ser estáveis mais uma vez.
Mas a chuva na Terra primitiva provavelmente tinha uma química diferente da chuva de hoje, porque se formava em uma atmosfera com um equilíbrio diferente de gases. O alto nível de dióxido de carbono que se acredita estar no ar há quatro bilhões de anos teria tornado as gotas de chuva mais ácidas. Agrawal e seus colegas descobriram que ainda podiam formar gotículas de RNA estáveis com água tão ácida quanto vinagre.
Neal Devaraj, um biólogo químico da Universidade da Califórnia, San Diego, que não esteve envolvido no novo estudo, disse que a pesquisa poderia lançar luz sobre a origem da vida porque os pesquisadores não precisaram fazer muito para criar gotículas de RNA estáveis: apenas misturar e agitar.
"É algo que você pode imaginar acontecendo na Terra primitiva", disse ele. "Simples é bom quando você está pensando sobre essas questões."