Cerca de 4.000 pessoas na arquibancada, com bateria, gritos de torcida e bandeiras, lotaram uma parte do estádio Pacaembu na noite desta sexta-feira (11). O que poderia ser um jogo de um clássico do futebol era, na verdade, o desfile de encerramento da São Paulo Fashion Week. Na passarela —ou no gramado— estava a Piet, uma marca de streetwear que virou febre entre os mais jovens, levando a ideia de desfile de moda ao patamar de um espetáculo.
Além da locação megalomaníaca, havia a presença de Marcelo D2, que cantou ao vivo, o patrocínio de marcas como Oakley, Puma e Levi’s, ações de marketing da Peugeot e celebridades como as atrizes Cleo e Letícia Colin. Somado, isso tudo fez do desfile algo maior do que a simples apresentação de uma coleção.
Ao evocar o imaginário do futebol —uma paixão nacional— e da celebração coletiva, a Piet criou um espetáculo de pertencimento. Assim, a marca conquistou uma legião de fãs com sua identidade que mistura a iconografia do movimento paz e amor, estampada ou bordada em moletons e camisetas, com calças e bermudas puídas ou com aspecto de sujo.
A disponibilização de ingressos gratuitos ao público, em uma atitude de tirar os desfiles de moda de seu lugar elitizado, expôs a imagem democrática que a Piet quer passar —ainda que muitas de suas peças custem o valor de um salário mínimo.
Esse tom teatral na passarela, mesmo que em menor escala, foi reproduzido por pelo menos outras duas grifes nesta edição da SPFW. O estilista João Pimenta optou por um caminho mais íntimo. Sua apresentação na nova Estação CCR das Artes —equipamento gerido pela Fundação Osesp—, que contou com piano ao vivo acompanhando a entrada dos modelos, fez o desfile assumir contornos de concerto.
A apresentação foi a cara do designer, que também já mostrou coleções no Theatro Municipal de São Paulo e no topo do edifício Martinelli, ambos locais que são símbolos da capital paulista. Agora, na Estação CCR das Artes, os modelos saíam por uma entrada lateral próxima ao palco, subiam as escadas e passavam por entre as fileiras onde a plateia estava sentada, antes de retornarem e se colocarem em pé próximos ao palco. Enquanto isso, o pianista carioca Jonathan Ferr, uma revelação do jazz, tocava ao vivo suas composições. O espetáculo era de sutileza —e talvez por isso mesmo tão marcante.
A marca LED, por sua vez, adotou um registro oposto —o do excesso, do pop e do humor. A marca mineira construiu um desfile pautado por referências à cultura de massa brasileira, com memes e marcos da TV traduzidos em looks e trilhas sonoras de clássicos do audiovisual brasileiro. Nas camisetas, as palavras "vale nada", em referência ao remake de "Vale Tudo", agora no ar na TV Globo.
Outro look, em animal print, lembrava os figurinos da personagem Bebel, de Camila Pitanga, em "Paraíso Tropical". Foi um desfile cênico no sentido mais explícito do termo —a passarela virou palco para personagens do nosso imaginário, conectando moda, cultura e afeto.
Esse clima, no entanto, não é novidade para a SPFW. A história do evento, que celebra agora 30 anos, é marcada por momentos emblemáticos que flertam com o espetáculo desde os anos 1990. Quem não se lembra de Gisele Bündchen desfilando com um gatinho nos braços para a Zoomp em 1997? Ou do tributo de Ronaldo Fraga a Zuzu Angel em 2001? Ou ainda do desfile da Forum em 2003 com Adriana Lima em clima de Carnaval? Isso sem contar o retorno de Gisele à Colcci em 2015.
Também não é novidade no mundo da moda de forma geral. Grandes produções de marcas como Louis Vuitton, que levou Pharrell à ponte Pont Neuf em Paris, em 2023, ou o desfile performático da Coperni em 2022, com um vestido pintado ao vivo em Bella Hadid, são momentos que mudaram a história do mundo fashion por sua potência visual e emocional.
Esta edição da SPFW, desta forma, reforçou a ideia de que as semanas de moda tem como fim a apresentação de produtos de forma lúdica, na tentativa de criar no espectador um sentimento de forte identificação com aquilo que vê. Mostrou que um desfile não serve apenas para vender roupa, mas contar histórias, com impacto visual, e emocionar.