A descarbonização da mobilidade passa pelos lubrificantes. A evolução dos óleos e dos fluidos refrigerantes precisa acompanhar as novas exigências de motores eletrificados, que, no Brasil, podem ser combinados ao etanol.
Fernanda Ribeiro, gerente de produto da Iconic (que controla as marcas Texaco e Ipiranga Lubrificantes), fala do que é preciso considerar no desenvolvimento de produtos para o mercado nacional e dos problemas com falsificações no mercado.
A transição energética no Brasil contempla os biocombustíveis conciliados à eletrificação. Como a indústria de lubrificantes lida com essa especificidade?
Grande parte do desenvolvimento dos lubrificantes não considera os combustíveis brasileiros.
Há pouco eu estava em um workshop do Ministério de Minas e Energia falando justamente da evolução do teor de etanol na gasolina, que traz uma complexidade muito grande para o lubrificante, porque as condições operacionais do motor mudam.
Precisamos olhar para as questões contaminantes dos combustíveis não queimados, a presença de água, a questão da temperatura.
Começamos a pesquisar novos desenvolvimentos pensando justamente na condição brasileira.
O que muda para o setor de lubrificantes com a chegada dos modelos híbridos flex?
É preciso trabalhar com novas matérias-primas, que muitas vezes não estão disponíveis no Brasil, usar óleos básicos de maior qualidade para garantir que atendam às questões da oxidação e, principalmente, dos combustíveis não queimados que vão para o óleo.
Fazemos testes de desempenho ao longo do desenvolvimento para que esse lubrificante atenda às especificações recomendadas pelas montadoras que estão presentes no país.
Os lubrificantes utilizados pelos carros atuais são sempre 100% sintéticos ou ainda há espaço para o óleo mineral?
Quando falamos das novas tecnologias, não tem como fugir de produtos sintéticos. Estamos falando também de uma redução de viscosidade, que traz uma eficiência energética maior para o motor.
O que pode ser melhorado para que o processo de refino do lubrificante seja menos agressivo ao meio ambiente?
A descarbonização neste setor está muito ligada ao quanto a refinaria polui. Esse é um dos pontos, por exemplo, do programa Mover [Mobilidade Verde e Sustentabilidade]. Pensando nos veículos, começamos a fazer uma quantificação do poço à roda, com a análise do modo de produção e dos insumos que fazem parte desses veículos.
Um dos temas que mais falamos no momento, é a questão da reciclagem, da circularidade.
O lubrificante usado é reciclado, retiramos todos os contaminantes e os aditivos que foram consumidos. É possível regenerar esse óleo e utilizá-lo novamente em outro produto verde. Portanto, [o lubrificante] volta para dentro da cadeia e conseguimos reduzir o que chamamos de pegada de carbono do produto.
Hoje, os carros precisam de lubrificantes específicos e mais caros que no passado. O uso de produtos que fogem da recomendação da montadora pode trazer danos ao motor ou aumento do consumo e das emissões. O que é preciso ser feito para que o consumidor entenda essa nova realidade?
Sempre tentamos trabalhar para passar esse tipo de conhecimento para o consumidor final, mas eu costumo dizer que é muito difícil. Quando olho para pessoas que não conhecem nada de lubrificantes, vejo que, geralmente, elas buscam a ajuda de alguém de confiança, que pode ser o mecânico, o frentista ou um amigo.
E muitas vezes completam ou trocam o óleo sem considerar qual é o correto para o seu carro.
Temos trabalhado em iniciativas para instruir melhor o mecânico, que é o profissional de referência. Diferentemente do passado, onde as consequências da utilização do lubrificante errado só apareciam lá na frente, hoje já não é assim. Há muitos ajustes finos, há muita tecnologia embarcada dentro do motor. O uso do lubrificante errado atualmente é muito mais catastrófico.
Às vezes temos contato, por exemplo, com problemas envolvendo produtos de má qualidade no mercado ou falsificados. É algo que está sendo bastante recorrente.
Então a falsificação de óleo é algo comum?
Sim, tem bastante. Atuamos em conjunto com o ICL [Instituto Combustível Legal], que tem trabalhado em ações coordenadas com as forças policiais, a Receita Federal e, muitas vezes, a ANP [Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis]. Vamos a locais que fazem a falsificação de lubrificantes.
Essa falsificação consiste em quê?
Utilizam frascos e rótulos similares [aos originais] e oferecem produtos de má qualidade –muitas vezes um óleo básico, sem ativo. Vendem no mercado a um preço muito menor do que os nossos distribuidores costumam ofertar.
Hoje, o problema do lubrificante esbarra muito na falta de informação, na busca por um produto de menor preço, que muitas vezes não é um produto de qualidade. Isso antigamente não dava problema, mas, com os veículos novos, as falhas aparecem cada vez mais cedo.
Esse é um ponto de atenção porque, por uma economia de alguns reais, falamos de problemas cuja solução pode custar mais de R$ 10 mil, dependendo da tecnologia do motor.
RAIO-X | FERNANDA RIBEIRO, 44
Carioca, é bacharel em química industrial pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e pós-graduada em marketing pela Coppead (e Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração da UFRJ). Gerente de produtos da Iconic, cuida das marcas Texaco e Ipiranga Lubrificantes.