Enquanto ChatGPT, Dall-E, DeepSeek e Gemini são as caras conhecidas da IA, são os datacenters a infraestrutura de telecomunicação que dá vida e escala a esses serviços. É neles que não só os dados ficam armazenados mas também são processadas as tarefas mais complexas, aquelas que o celular não dá conta.
E, por mais que a internet não tenha fronteiras, guardar informações mais próximas de onde elas são consumidas faz diferença na hora de diminuir o tempo de resposta para algumas atividades, como transmissões ao vivo ou cirurgias remotas.
A alta demanda é um dos motivos que fazem a indústria brasileira de datacenters tratar o momento atual como uma janela de oportunidades —eu e Diogo Cortiz falamos sobre isso no episódio de Deu Tilt da semana passada. As empresas da área têm capacidade limitada para atender todos os pedidos. Tanto é que:
- A Elea, dona de nove datacenters, vai destinar quase R$ 1,7 bilhão (US$ 300 milhões) para ampliar suas instalações em São Paulo e transformá-las para a era da IA. Já a...
- ... Tector possui um cabo submarino ancorado em Fortaleza e um datacenter na cidade. A empresa da V.tal, que comprou os ativos da Oi, reservou R$ 5,7 bilhões (US$ 1 bilhão) para expansão. A primeira nova central de dados, o Mega Lobster, terá capacidade de 200 Megawatts e será inaugurado em São Paulo no segundo semestre. No Rio Grande do Sul...
- ... A Scala já anunciou uma "cidade dos datacenters". Com investimento inicial de R$ 3 bilhões e capacidade de 54 MW, ficará em Eldorado do Sul. Há a possibilidade de expandir para 4.750 MW, o que consumirá R$ 500 bilhões. No Ceará...
- ... A Casa dos Ventos, empresa de energia renovável, promete destinar R$ 50 bilhões a um datacenter de 876 MW a ser instalado no Complexo Portuário do Pecém. Também há estrangeiro chegando, pois...
- ... A alemã DE-CIX, maior operadora de PTT (ponto de troca de tráfego) do mundo, estreou no Brasil nesta semana. E...
- ... O que ela faz é construir infraestrutura física para a troca de tráfego entre provedores e redes de internet e plataformas de conteúdo. Os dois pontos de interconexão, no Rio e em São Paulo, ficarão nos datacenters de Elean, Ascenty e Equinix. Mal comparando...
- ... Um PTT funciona como um aeroporto de grandes dimensões, com voo direto entre terminais menores e possibilidade de viagem para a Europa, lar da DE-CIX. Só que...
- ... Substitua os passageiros por dados, que saem de uma rede e caminham para outra, e pense nos aviões como porteiros entre essas redes. A DE-CIX possui quatro desses "aeroportos" (Nova York, Lisboa, Madri e Frankfurt). Esses "voos diretos"...
- ... Reduzem a latência, o tempo de resposta para uma aplicação retornar com o conteúdo acionado pelo usuário. Ainda que a velocidade da conexão seja estupenda, se a latência for alta, a experiência de algumas atividades pode ser arruinada, como os vídeos ao vivo ou os games online, ou significar a vida e morte, como as decisões de um carro autônomo ou cirurgias remotas. Em sua passagem por São Paulo...
- ... Ivo Ivanov, CEO da DE-CIX, comentou que a latência da Netflix, por exemplo, é de 65 milissegundos. Ok para filmes e séries, mas reprovável para uma luta ao vivo do Mike Tyson -o ideal seriam 25 ms. Como serviços da internet buscam replicar interações das pessoas com o mundo real, o alvo, diz ele, deve ser latência de 1 ms. Sem os tais "voos direitos" fica difícil, pois...
- ... Os dados saem do seu celular e precisam pegar diversas rotas até chegar ao destino final antes de voltar ao seu aparelho.
Vemos que a principal mudança no jogo [no Brasil] é uma dinâmica diferente no mercado que começou a ocorrer há dois anos, quando investimentos em dados apareceram. Também vemos esse dinamismo nos provedores internacionais de serviço, que aumentaram sua presença aqui. O momento agora é maduro o suficiente para nós também. E haverá todo tipo de oferta, desde o tráfego entre nuvens até o roteamento das inferências de IA, e diferentes aplicações como as da Office 365, da Microsoft, coisa que não ocorria há dois anos. Companhias da Fortune 500 com presença no Brasil começam a repensar em mudar sua estratégia para construir suas próprias redes aqui, o que demanda o tipo de serviço que fornecemos
Ivo Ivanov, CEO da DE-CIX
Por que é importante?

A indústria não possui um único motivo para encarar o momento atual como uma janela de oportunidades. Essas razões podem ser divididas em duas frentes. A primeira é a da demanda aquecida, graças a serviços de:
- Cloud: são os pacotes fornecidos por empresas como Amazon, Microsoft e Google ou os serviços de companhias como Meta que exigem essa estrutura. Atualmente, 70% dos aplicativos acessados pelos brasileiros na nuvem estão em outros lugares, como os EUA;
- Inteligência artificial: a perspectiva é que a exigência dos consumidores por latência baixa force chatbots a rodarem a partir do país.
Todos nós [operadores de datacenter] juntos não conseguimos alimentar o que o que eles quatro [Amazon, Microsoft, Google e Meta] precisam
Alessandro Lombardi, presidente da Elea
A segunda frente é a dos fatores estruturais do Brasil e da conjuntura internacional:
- Energia renovável e disponível: a matriz energética brasileira é baseada em hidrelétricas com um avanço importante da energia solar e eólica, algo único no mundo, o que empurra a fronteira da capacidade de geração de eletricidade com menores riscos ao meio ambiente;
- Guerra da Ucrânia: o conflito prejudicou o fornecimento energético na Europa, que passou a reconsiderar a destinação de energia a datacenters --países como Holanda pausaram a abertura de novas centrais de dados;
- Transformação digital: o cálculo feito na indústria é que só 30% das empresas brasileiras hospedam seus dados em datacenters de terceiros.
O Brasil passou a ser visto pelo mundo como um potencial candidato a receber essas cargas [de dados] que exigem mais energia. A gente tem uma grande oportunidade de receber investimentos maiores do que a nossa parcela de consumo
André Busnardo, Diretor comercial da Tec.to
Não é bem assim, mas tá quase lá
Na visão dos executivos da indústria, a oportunidade diante do Brasil será aproveitada de qualquer maneira. O que está em jogo é a intensidade com que isso irá acontecer.
Para o momento ser explorado ao máximo, dizem, é preciso superar alguns gargalos, como a alta carga tributária destinada à importação de equipamentos e a liberação demorada de licenças para empreendimentos. O governo federal está trabalhando em um plano, que deverá tratar desses temas, sem deixar de fora incentivos para a indústria local e uma visão de longo prazo para a estratégia.
Ainda não se sabe a forma do projeto, mas o Congresso Nacional já sinalizou que o assunto é prioritário.
Ao final deste ano, precisamos conseguir oferecer à sociedade brasileira algum avanço, seja na política de data centers, seja política de inteligência artificial, seja na energia para os data centers e assim ampliar a inteligência artificial
Ricardo Barros (PP-PR), Novo presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação da Câmara dos Deputados
DEU TILT
Toda semana, Diogo Cortiz e Helton Simões Gomes conversam sobre as tecnologias que movimentam os humanos por trás das máquinas. O programa é publicado às terças-feiras no YouTube do UOL e nas plataformas de áudio. Assista ao episódio da semana completo.

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Reportagem
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