Terapia online beneficiou principalmente grupos privilegiados, apontam estudos

há 2 meses 10

O número de americanos recebendo psicoterapia aumentou 30% durante a pandemia, à medida que as sessões virtuais substituíram as consultas presenciais —mas novas pesquisas diminuem a esperança de que a tecnologia tornará o cuidado com a saúde mental mais acessível para as populações mais necessitadas.

Na verdade, os pesquisadores descobriram que a mudança para a teleterapia exacerbou as disparidades existentes.

O aumento na psicoterapia ocorreu entre grupos que já tinham mais acesso: pessoas em faixas de renda mais alta, vivendo em cidades, com emprego estável e mais educação, dizem os pesquisadores em uma série de estudos, o mais recente dos quais foi publicado na semana passada no The American Journal of Psychiatry.

Entre aqueles que não se beneficiaram do boom, a equipe descobriu, estão crianças de famílias de baixa renda, crianças e adolescentes negros e adultos com "angústia psicológica grave".

"Acho que todo o sistema de cuidados —e talvez a entrega pela internet seja uma parte disso— parece estar se afastando daqueles que mais precisam", diz Mark Olfson, professor de psiquiatria no Columbia University Irving Medical Center e autor principal dos estudos sobre acesso aos cuidados.

"Estamos vendo que aqueles com maior angústia estão perdendo terreno, em termos de sua probabilidade de serem tratados, e isso para mim é uma tendência muito importante e preocupante", ele acrescenta.

Não era para ser assim. Nos anos 1990, a teleterapia foi defendida como uma forma de alcançar pacientes desfavorecidos que vivem em locais remotos onde havia poucos psiquiatras. Uma década depois, foi apresentada como uma alternativa mais acessível às sessões presenciais, que poderia reduzir radicalmente as barreiras ao cuidado.

"A telemedicina não correspondeu às expectativas", diz C. Vaile Wright, diretora sênior do escritório de inovação em cuidados de saúde da American Psychological Association. As razões, ela acrescentou, não são surpresa: muitos americanos não têm acesso a uma banda larga confiável, e os seguradores não reembolsam adequadamente os provedores, que, por sua vez, optam por tratar clientes que pagam privadamente.

"Se você não pode pagar, não importa a modalidade, você simplesmente não pode pagar", diz Wright. Pode ser, ela acrescentou, que sessões semanais de terapia simplesmente não sejam escaláveis para uma população ampla e o campo deve explorar alternativas de baixo impacto, como intervenções de sessão única e terapias digitais.

À medida que as plataformas de telemedicina crescem, elas podem estar atraindo clínicos de ambientes comunitários com a promessa de horários flexíveis e melhores condições, diz Jane M. Zhu, professora associada de medicina na Oregon Health and Science University que estuda a acessibilidade dos serviços de saúde mental.

Selecionando de um grande grupo de pacientes, eles podem optar por tratar pacientes com condições mais leves e mais capacidade de pagamento. "Certamente é algo que devemos saber", diz Zhu. "Deve haver clareza sobre isso. Quem essas empresas estão atendendo? E o que isso significa para os pacientes que mais precisam?"

A porcentagem de americanos recebendo psicoterapia permaneceu relativamente estável, em 3% a 4%, por décadas antes de começar a subir gradualmente, diz Olfson.

Então, dois fatores —a pandemia e a explosão da teleterapia— contribuíram para um aumento acentuado, com o número de adultos recebendo psicoterapia subindo para 8,5% em 2021, de 6,5% em 2018. (Em comparação, a porcentagem anual de adultos tomando medicação psicotrópica permaneceu estável, em cerca de 17,5%.)

Olfson diz que ficou surpreso com a magnitude do aumento. "Não tivemos algo como a Covid antes, e não tivemos essa tecnologia antes", diz Olfson. "Havia muito isolamento social, muita solidão. E essas são coisas que a psicoterapia é projetada para abordar, de uma forma que a medicação não pode."

As descobertas são baseadas na Pesquisa do Painel de Despesas Médicas, que é conduzida pelo governo federal e mede como os civis americanos usam e pagam pelos cuidados de saúde. A pesquisa não inclui aqueles no exército, encarcerados ou em lares de idosos, hospitais ou abrigos para sem-teto.

Estudos anteriores, baseados em dados de seguros, mostraram que os gastos dos americanos com saúde mental aumentaram 54% de 2020 a 2022, em meio a um aumento de dez vezes no uso de teleterapia.

Os novos estudos detalham quais americanos estão recebendo o cuidado. Uma análise de 89.619 adultos publicada no JAMA Psychiatry no mês passado descobriu que o uso de psicoterapia cresceu mais entre os entrevistados mais jovens, entre os mais educados e entre aqueles nos dois maiores grupos de renda.

Uma análise do uso de telemedicina por crianças e adolescentes de 2.445 domicílios chegou a conclusões semelhantes. O estudo descobriu que crianças de famílias mais ricas, usando seguro privado, eram muito mais propensas a usar teleterapia. Crianças em áreas urbanas eram quase três vezes mais propensas a usá-la do que seus colegas rurais.

Durante os anos da pandemia, o uso de serviços de saúde mental por crianças e adolescentes negros diminuiu, caindo para 4% em 2021, de 9,2% em 2019. No mesmo período, o uso de cuidados de saúde mental entre crianças brancas aumentou, para 18,4% de 15,1%, a equipe descobriu em outro estudo.

"O que descobrimos é que parece estar apenas exacerbando as disparidades existentes", diz Olfson. "Acho que há uma necessidade real de tentar resolver isso."

Leia o artigo completo