Eu tive o privilégio de implementar e coordenar cursos de graduação cujos modelos pedagógicos são inteiramente baseados em metodologias ativas, especialmente problemas e projetos.
Os alunos são divididos em turmas menores e alocados em tutorias mais personalizadas para cada projeto. Após quase 10 anos trabalhando com essa abordagem, os ganhos são inegáveis.
No entanto, a grande dificuldade da personalização do ensino em larga escala está na implementação e nos altos custos.
É neste momento que a IA generativa surge como uma inovação que pode habilitar novos casos de usos, que podem variar de uma implementação mais sofisticada de um tutor customizado para cada estudante até o uso das ferramentas de IA na própria sala de aula.
Por exemplo, a Unesco lançou um guia de uso de IA generativa na educação. O material apresenta uma série de casos de usos para ensinar professores a utilizarem chatbots (como ChatGPT, Gemini ou Claude) em sala de aula como um objeto de aprendizagem.
Entre as diferentes situações que o documento descreve, vou destacar duas para ilustrar o potencial do uso de IA.
Um dos casos é o uso de chatbots como um "motor de possibilidades". Os alunos são estimulados a usar a ferramenta para gerar formas alternativas de expressar uma ideia ou conceitos.
Outro caso de uso é o "Oponente Socrático". A IA atua como um desafiante para ajudar os alunos a melhorar um argumento ou sua habilidade de debatedor.
Quem nunca simulou debates na escola? Como as turmas são grandes, nem sempre todo mundo consegue participar. Mas com o uso de IA, esse é um problema que fica para trás.
A maravilha e o desafio da IA é que estamos falando de uma tecnologia de propósito geral. Podemos usá-la para tantas tarefas diferentes e de maneiras tão diversas que seria impossível listarmos todas as possibilidades.
E é essa natureza da tecnologia que pode complicar o seu uso na educação.
Apesar da potencialidade do uso, precisamos reforçar a todo o momento que a ferramenta não é mágica. Se for mal implementada, ela pode trazer mais problemas do que benefícios.
Recentemente, li o relato do professor Eric Klopfer do MIT. Ele decidiu entender como a IA poderia ajudá-lo a ensinar uma linguagem de programação que os alunos desconheciam.
Para isso, ele separou a turma em três grupos. O primeiro grupo poderia usar o ChatGPT como quisesse, o segundo poderia usar um IA focada mais em programação e o terceiro grupo poderia usar apenas o buscador do Google.
Como vocês podem imaginar, o grupo do ChatGPT foi o que conseguiu resolver os problemas mais rapidamente, enquanto o grupo do Google demorou muito mais.
Só que quando os alunos foram avaliados, o professor notou que a turma do ChatGPT "não lembrava nada e todos os estudantes falharam".
Enquanto isso, quem usou apenas o buscador do Google passou no teste.
Esse experimento é uma importante lição educacional.
O poder conversacional dos chatbots é incrível por sempre dar uma resposta pronta, o que também pode ser um problema.
Além da possibilidade de o conteúdo estar errado, os alunos podem ficar cada vez mais preguiçosos para conseguir os resultados que precisam.
Toda nova tecnologia surge como um potencial e uma ameaça para a educação. Sempre foi assim e sempre será.
Quando a Internet começou a se popularizar, o debate era parecido com o que estamos tendo com a IA. Porém, esse experimento mostra que faz sentido comparar as duas tecnologias somente até certo ponto.
Os alunos que usaram o buscador do Google foram aprovados porque precisavam interpretar diferentes informações para criar um sentido e, assim, aprenderam sobre o assunto.
Já no caso da IA, ela entregou tudo pronto e mastigado.
O nosso desafio como educadores é encontrar o caminho para que a IA seja uma ferramenta de transformação na educação.
A tecnologia precisa servir para ajudar os estudantes a desenvolverem habilidades em vez de atrofiá-las.
Eu continuo sendo otimista sobre o uso da IA na educação, mas vamos precisar enfrentar um grande inimigo em um mundo em que a IA pode fazer muitas coisas por nós: a preguiça humana.
Opinião
Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.