A atriz cubana Lisandra Silva, de 37 anos, compartilhou em suas redes sociais que precisou ser levada às pressas ao hospital após usar Ozempic.
A princípio, a semaglutida —nome científico da molécula que é o princípio ativo do Ozempic— foi estudada e aprovada como um tratamento contra o diabetes. Mas logo os cientistas começaram a observar um "efeito colateral" muito interessante dela: a perda de peso.
Foi assim que o Ozempic começou a ter o chamado uso off-label (fora das recomendações de bula) alardeado por algumas pessoas como uma forma de eliminar os quilos extras.
Mais recentemente, surgiu a versão do medicamento específica para o tratamento da obesidade, como a marca Wegovy.
"Meu açúcar caiu tanto que eu tive ligar para o pai das crianças quando senti que estava desmaiando e meus filhos estavam dormindo ao meu lado. Graças a Deus não aconteceu nada, mas senti que estava morrendo e cheguei na clínica em cadeira de rodas", contou a atriz no Instagram.
Lisandra disse ter comprado o remédio por orientação médica e abandonado a estratégia depois do susto.
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A Novo Nordisk Brasil, responsável pelo medicamento, afirmou à reportagem que não recebeu relato em seu SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor) brasileiro sobre o caso envolvendo a atriz cubana Lisandra Silva.
"Porém, tomando conhecimento do mesmo via imprensa, será feito uma submissão à agência sanitária brasileira, Anvisa, como é o procedimento em casos semelhantes e parte de suas práticas de farmacovigilância."
A empresa enfatizou que Ozempic é aprovado para o tratamento de diabetes tipo 2, e tem a segurança e a eficácia amplamente demonstrada em estudos clínicos rigorosos.
"O medicamento deve ser usado, em conjunto com dieta e exercícios, para tratar pacientes adultos com diabetes tipo 2 não satisfatoriamente controlada (nível de açúcar no sangue permanece muito alto), sendo vendido apenas sob prescrição médica por se tratar de um produto com tarja vermelha."
Efeitos colaterais
Os efeitos colaterais mais comuns com o uso do Ozempic incluem náusea, diarreia, dor abdominal, vômito e constipação.
A hipoglicemia (queda de açúcar no sangue) citada pela atriz, é um dos "efeitos colaterais graves" citados no site oficial do medicamento.
"Os sinais de alerta de hipoglicemia podem surgir repentinamente e podem incluir: suor frio, pele fria e pálida, dor de cabeça, batimentos cardíacos rápidos, sensação de enjoo (náusea) ou muita fome, alterações na visão, sensação de sono ou fraqueza, nervosismo, ansiedade ou confusão, dificuldade de concentração ou tremor", descreve a bula do remédio.
A mesma bula cita o efeito colateral como "muito comum" quando o Ozempic for usado com outro medicamento que possa causar hipoglicemia, como sulfonilureia ou insulina. Não há menções do quão comum ou raro o efeito colateral é para quem não usa estes outros medicamentos.
A lista de efeitos colaterais no site oficial também inclui os quadros listados abaixo e o que se deve fazer no caso do aparecimento deles:
- Pancreatite (inflamação do pâncreas): Interrompa o uso e contate seu médico imediatamente caso tenha dor intensa no abdômen que não passa, com ou sem vômito.
- Alterações na visão: Informe seu médico se notar mudanças na visão durante o tratamento.
- Problemas renais: Diarreia, náusea e vômito podem levar à desidratação e piorar problemas renais. Mantenha-se hidratado para reduzir esse risco.
- Reações alérgicas graves: Suspenda o uso e procure ajuda médica caso apresente sintomas como inchaço no rosto, lábios, língua ou garganta, dificuldade para respirar ou engolir, erupção cutânea intensa, tontura ou batimentos cardíacos acelerados.
- Problemas na vesícula biliar: Informe ao seu médico caso tenha dor abdominal, febre, pele ou olhos amarelados, ou fezes esbranquiçadas.
- Tumores de tireoide, incluindo câncer: Informe seu médico caso perceba um caroço ou inchaço no pescoço, rouquidão, dificuldade para engolir ou falta de ar. Estes podem ser sinais de câncer de tireoide. Em estudos com roedores, Ozempic e medicamentos similares causaram tumores de tireoide. Não se sabe se Ozempic causará tumores de tireoide em humanos.
Um estudo recente —não citado no site oficial do remédio— associa o uso do Ozempic ao risco aumentado de doença ocular grave, mas não pode ser considerado conclusivo.
Devido ao pequeno número de pacientes afetados pela doença ocular no estudo —que podem não ter tomado a medicação conforme as orientações em bula, por exemplo— as estatísticas sobre o risco não são precisas.
A Novo Nordisk, farmacêutica responsável pelo Ozempic, argumenta que o estudo não levou em consideração se os pacientes fumavam ou há quanto tempo tinham diabetes —outros fatores que podem afetar a visão. O laboratório também apontou problemas na identificação precisa de casos de doenças oculares entre os pacientes avaliados.
A ação do remédio
Como o Ozempic é capaz de gerar emagrecimento?
A médica Simone Van de Sande Lee, diretora do Departamento de Obesidade da Sbem (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia), diz que ele produz três efeitos no organismo.
Isso porque a semaglutida "imita" a ação de um hormônio fabricado no intestino: o GLP-1.
"O principal mecanismo de ação desse remédio, que pertence à classe dos análogos de GLP-1, acontece no sistema nervoso central. Ele viaja pela corrente sanguínea e chega às regiões do cérebro que controlam a sensação de fome e o gasto de energia", explica ela.
"E isso gera um sinal de saciedade ao resto do organismo, o que faz o indivíduo ter uma ingestão menor durante as refeições", complementa a endocrinologista, que também é professora da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). O resultado prático disso é justamente o emagrecimento.
Outro efeito da semaglutida é o de estimular a liberação de insulina pelo pâncreas.
Esse hormônio é responsável por retirar da circulação sanguínea o açúcar obtido dos alimentos e colocá-lo dentro das células, onde será usado como fonte de energia.
Por fim, o fármaco também retarda o esvaziamento do estômago —como a comida fica nesse órgão por um tempo maior, a sensação de barriga cheia acaba se prolongando.
A semaglutida para tratamento da obesidade é injetável (ela vem numa espécie de caneta, com uma agulha fina na ponta), e deve ser aplicada uma vez por semana.
Nos estudos que serviram de base para a aprovação do medicamento, a perda de peso média entre os voluntários foi de 17% — porcentagem que supera o obtido com outras opções farmacológicas disponíveis.
"As medicações que tínhamos até então chegavam, no máximo, a 10%", estima o endocrinologista Bruno Halpern, presidente da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade).
O texto foi publicado originalmente aqui.