O possível retorno do horário de verão no Brasil, como um recurso para ajudar na operação do sistema elétrico nacional, tenderia a provocar efeitos distintos sobre outras atividades econômicas, devendo agradar o setor de bares e restaurantes mas causar um problema logístico para companhias aéreas, ao forçar uma reprogramação principalmente de voos internacionais.
O horário de verão, criado há mais de 90 anos para economizar energia elétrica e extinto em 2019, voltou à pauta do governo devido à seca severa deste ano, que tem prejudicado a fonte hidrelétrica. Nesta semana, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que a volta dessa política passou a ser uma "realidade muito premente".
No setor de energia, a percepção é de que o adiantamento dos relógios em uma hora pode ajudar a reduzir a pressão sobre o sistema elétrico no fim da tarde, quando as usinas solares deixam de gerar ao mesmo tempo em que o consumo está no pico.
É essa dificuldade de "atendimento de ponta" que tem levado o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) a acionar mais termelétricas, aumentando os custos na conta de luz.
Porém, os ganhos ao sistema elétrico com o retorno do horário de verão podem não ser tão relevantes assim, uma vez que ele garante uma hora a mais de geração solar no momento do dia em que os níveis de insolação já são menores.
Folha Mercado
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"É uma tentativa que tem potencial de ter resultados positivos, embora não sejam claros os benefícios de consumo na ponta com a adoção do horário de verão", afirma Fernando Borborema, gerente de Estudos Energéticos no grupo Delta Energia.
Antes, o horário de verão também deslocava o consumo em momento de pico, mas agora a avaliação é de que, com a maior demanda de aparelhos de ar condicionado, o total demandado de energia não se altera de forma significativa ao longo do dia, um dos argumentos para acabar com a política em 2019.
O ONS apresentará na quinta-feira (19), em reunião extraordinária do CMSE (Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico), um plano de contingência para o setor elétrico enfrentar a seca, incluindo um estudo técnico sobre potenciais efeitos da volta do horário de verão. É com base nesse estudo que o governo encaminhará a discussão sobre retorno ou não da política.
Mesmo ainda sem definição sobre o tema, outros setores econômicos se mobilizam a favor e contra a medida.
A Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) enviou nesta semana uma carta ao ministro Alexandre Silveira em defesa do horário de verão, citando benefícios ao comércio, serviços e turismo de se ter mais horas do dia com luz natural.
Segundo estimativas da entidade, um maior movimento em bares e restaurantes entre 18h e 20h durante a semana pode elevar em até 50% a receita dos estabelecimentos neste período do dia, trazendo aumento de 10% a 15% no faturamento mensal médio do setor.
"Entendemos que os brasileiros são beneficiados, em vez de correr para casa você pode reunir os amigos e tomar um chopp no bar, socializar, praticar esportes e outras atividades de lazer que a iluminação natural permite, dá mais segurança e facilita a mobilidade", afirmou Percival Maricato, diretor institucional da Abrasel-SP.
A carta da Abrasel menciona ainda uma pesquisa realizada pela entidade sobre o tema nos dias 11 e 12 de setembro com 3.000 usuários do site Reclame Aqui. Segundo o levantamento, 54,9% dos respondentes se disseram totalmente ou parcialmente favoráveis à volta do horário de verão.
Setor aéreo
Por outro lado, o adiantamento dos relógios em uma hora afetaria toda a programação atual de voos das companhias aéreas, sobretudo para o exterior, levando a ajustes nos horários de partida e chegada e conexões, com custos adicionais para realocar equipes e tripulantes.
Segundo uma fonte do setor aéreo, que pediu para não ser identificada, o retorno do horário de verão no fim deste ano teria invariavelmente impacto para as empresas e consumidores, uma vez que o calendário internacional de "slots" nos aeroportos é definido com vários meses de antecedência.
A fonte afirma que a programação de voos dos próximos seis meses já está fechada, acordada, e diz que a alocação de slots nos aeroportos é feita com antecedência para dois períodos do ano, que correspondem às temporadas de verão e inverno no hemisfério norte. O calendário da próxima temporada de verão se inicia no fim de março, quando a estação termina no Brasil.
Segundo essa fonte, o tema do horário de verão já chegou a ser discutido em meados deste ano em reunião do Conaero (Comissão Nacional de Autoridades Aeroportuárias).