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Em toda temporada de chuvas, a mesma cena se repete: ruas alagadas, motoristas desesperados... e, no meio do caos, lá vai ele - um Fiat Uno valente, rasgando a água como se fosse um barco. Enquanto isso, SUVs novinhos, bem mais caros e até mais altos, ficam pelo caminho. Mas será que o compacto da marca italiana é mesmo mais resistente à água? Ou tudo isso é só um exagero da internet?
A coluna foi atrás de respostas e conversou com o Professor Doutor Fernando Castro Pinto, do curso de Engenharia Mecânica da UFRJ, para entender de onde vem essa fama (quase mitológica) do Fiat Uno.
Meme, sim. Mas com um pé na realidade
Segundo o professor, tudo começou com os famosos Unos de firma - geralmente equipados com escadas no teto, usados por empresas de telefonia ou manutenção. Esses carros simples, baratos e valentes enfrentavam qualquer desafio urbano, de buracos a enchentes.
A realidade é que os motoristas não eram tão cuidadosos assim na forma de dirigir. "Virou um símbolo na internet. Tem até piada dizendo que se o Uno tiver escada no teto, corre mais que Ferrari", brinca Fernando.
Mas por trás da piada, há sim uma base técnica para explicar o porquê de esses carros antigos se saírem melhor em situações de alagamento. O principal fator está no projeto do Uno (e de outros carros antigos como o Gol e o Fusca).
"Esses modelos têm menos eletrônica embarcada, e isso já é uma grande vantagem em áreas alagadas", explica o docente. Isso porque a água e os sistemas eletrônicos modernos não combinam - e mesmo com proteções, uma central encharcada pode parar de funcionar na hora crítica.
Além disso, os carros mais antigos costumam ter componentes vitais (como a admissão de ar e o alternador) posicionados mais acima, dificultando a entrada de água. "Não é que o Uno foi projetado para passar em enchente. Mas o conjunto do projeto acabou favorecendo essa resistência", aponta.
E os carros modernos?
Por outro lado, os veículos atuais priorizam conforto, segurança, eficiência e conectividade. Isso significa mais sensores, módulos eletrônicos e sistemas sensíveis, geralmente posicionados em locais que não lidam bem com água.
Outro ponto importante é que nenhum carro, moderno ou antigo, é feito para virar submarino. "Poças rasas, tudo bem. Mas quando a água chega na grade, tudo começa a depender de três fatores: projeto do carro, proteção da eletrônica e, claro, experiência do motorista", explica Fernando.
Experiência ao volante conta muito
Um detalhe pouco falado: a forma como se atravessa um alagamento faz toda a diferença. A dica? Entrar em velocidade constante, sem pisar fundo e sem tirar o pé do acelerador, de preferência, em primeira marcha.
Se a água entrar pelo escapamento ou pela entrada de ar do motor, o famoso calço hidráulico pode acontecer - e aí, o prejuízo é certo: o motor pode simplesmente quebrar. Por isso, o recomendado é não tentar passar quando a água ultrapassa o meio das rodas, mesmo que esteja de Uno.
A fama do compacto italiano como "anfíbio urbano" tem sim sua razão. Mas ela nasce de uma combinação de projeto simples, menor eletrônica e? coragem do motorista. Como lembra o professor Fernando, "nenhum carro é feito para enchente. O Uno só acabou se dando bem, mesmo sem ter sido planejado para isso".
Ah, e se quiser aumentar as chances, ele ainda dá uma última dica bem-humorada: "quer um carro bom de enchente? Compra um Uno e põe uma escada no teto!"
Reportagem
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