O banqueiro Ricardo Lacerda, fundador do banco de investimento BR Partners, considera que a vitória de Donald Trump na eleição presidencial dos EUA pressiona o presidente Lula a mudar o discurso e, efetivamente, acelerar o corte de gastos.
Para ele, o resultado das eleições dos EUA e o das eleições municipais no Brasil têm muitos pontos em comum: eleitores insatisfeitos que não percebem mais ganhos em um "estado-empresa".
De que forma a vitória de Trump muda a economia brasileira?
Primeiro, foi uma vitória surpreendente, esmagadora do ponto de vista dele Trump ter ganhado o voto popular e também nos sete estados pêndulos, algo que não acontecia há muitas décadas. Isso mostra uma determinação da classe média, principalmente, de ter uma mudança na economia, de ter menos governo e mais liberdade.
De uma certa maneira, a gente percebe algo parecido com as eleições municipais na medida em que as pessoas querem menos assistencialismo, menos benefícios e mais liberdade, mais empreendedorismo, mais possibilidade de prosperar economicamente. É uma agenda semelhante.
Isso pressiona o governo, então?
Sim. Isso coloca uma pressão muito grande no presidente Lula para mudar o discurso, promover um ajuste fiscal mais rigoroso. Não acredito em grandes alterações em termos de fluxo de capitais ou em termos de uma desvalorização muito grande do real, além do que a gente já viu. Mas há uma pressão em cima do governo atual para melhorar a política econômica.
O corte de gastos ganha urgência?
Muita coisa ficou fora do arcabouço e ele meio que caiu em descrédito, principalmente porque você não pode ter uma política fiscal que não tenha nenhuma redução de gastos. Isso é uma coisa muito básica, seja para um governo, empresa ou para uma família. O equilíbrio das contas tem que vir com uma combinação de aumento de receita e redução de gastos. Então, o que antes era recomendável e esperado, agora se tornou obrigatório.
O dólar rompeu R$ 6. Essa pressão é passageira?
Houve uma desvalorização geral de todas as moedas em relação ao dólar, mas o Brasil bem menos do que as outras. É um componente externo muito maior. A maior parte desse movimento reflete uma expectativa de juros no mercado americano. Óbvio que ainda vamos precisar ver o que Trump pretende fazer. Será mais protecionista, vai fortalecer mais o dólar? Isso tudo tende a afetar negativamente um país como o Brasil, que é um país que precisa de superávit comercial, investimento direto.
O ajuste é o que o governo pode fazer para amenizar esse impacto, então?
Sem dúvida, porque o Brasil hoje já tem o juro real mais alto do mundo. Então, se você tiver um pacote fiscal que seja crível ao longo do tempo, isso pode trazer um alívio muito grande para juros e para câmbio. Não tenho a menor dúvida. Então, eu acho que faz-se urgente esse ajuste.
Raio-X | Ricardo Lacerda
É sócio-fundador e presidente do BR Partners, foi chefe do banco de investimentos do Citi na América Latina (2007-2009) e no Brasil (2005-2009). No Goldman Sachs, foi diretor-presidente no Brasil (2001-2005) e vice do banco de investimento em NY (1996-2001). Tem graduação em administração e mestrado pela Universidade Columbia.