Opinião - Rodrigo Zeidan: Inflação pessoal é diferente da oficial e nem sempre maior

há 4 meses 14

A sua inflação pessoal é sempre diferente da oficial, mas isso não quer dizer que o IPCA ou o IGP-M sejam manipulados. Hoje, a inflação está razoavelmente controlada e o trabalho do novo presidente do Banco Central parece que não será muito difícil.

As expectativas são de que o IPCA vá terminar este ano pouco acima de 4%, caindo para 3,5% em 2025 e 2026. Mas inflação previsível não significa estabilidade para todos. Sempre há gente com perdas maiores do que os índices oficiais. É da natureza do indicador.

Para muitos, a preocupação com a inflação supera a de qualquer outro indicador econômico. O impacto psicológico da volatilidade dos preços, a aversão à perda e a distribuição desigual dos choques inflacionários continuam a afetar a opinião pública, a ponto de ainda ter gente com medo de que a hiperinflação volte.

Mas por que as pessoas normalmente acham que dados oficiais subestimam a inflação? Será por causa do nosso histórico? Afinal, já tivemos ministros da Fazenda, como Delfim Netto, acusados de manipular índices inflacionários —com boas evidências de que isso tenha mesmo sido feito. Em 1973, o índice oficial foi de 15%, mas deveria ter sido de 26%. Em 1983, chegamos a ter dois índices de inflação, um com trigo e derivados de petróleo e outro sem, já que o governo tinha acabado de tirar o subsídio desses produtos e os preços explodiram.

Entretanto, não precisamos de malícia para explicar o descompasso entre o que sentimos no dia a dia e os dados oficiais. O IBGE e a FGV fazem trabalhos cuidadosos. E, diferentemente da Argentina no passado, que chegou a processar quem publicava índices alternativos, qualquer um pode publicar o que quiser. Não gostou dos dados do governo? Crie o indicador que quiser.

Índices de inflação são médias ponderadas dos preços dos produtos e serviços que consumimos, com pesos maiores para os mais importantes, como aluguel e transporte, e menores para os que nos afetam pouco, como o chuchu. Assim, para que nossa experiência individual seja diferente dos indicadores oficiais, basta que nosso consumo do dia a dia seja diferente da média.

Por exemplo: se nossos gastos estão muito mais ligados à alimentação do que ao transporte e a comida encareceu enquanto os custos de transporte caíram, nossa inflação percebida é maior que a oficial.

Há também um efeito psicológico. Imagine que você entre em um supermercado com três categorias de produtos. Categoria A são os produtos que ficaram mais caros, a B os que ficaram baratos e a C os que mantiveram os preços. É quase certo que vamos prestar muito mais atenção nos produtos da categoria A.

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Tendemos a ignorar valores que sejam iguais aos que achamos no passado. E embora possamos nos surpreender com aqueles que ficaram mais baratos, normalmente achamos que seriam por descontos temporários. Isso se deve ao fenômeno de aversão a perdas, fenômeno estudado pelo recentemente falecido Nobel de Economia Daniel Kahneman. Nosso cérebro valoriza perdas e ganhos de forma assimétrica. Preferimos perder menos do que ganhar mais.

O IPCA não consegue captar as nuances do consumo individual. Essa percepção distorcida contribui para a sensação de que a inflação real é maior do que a divulgada. Mas isso não quer dizer que os dados sejam manipulados.

A hiperinflação acabou há 30 anos. Não vai voltar. E sua inflação pessoal é diferente da oficial. Mas nem sempre é maior. Com certeza.

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