Opinião - Rodrigo Zeidan: A recessão de Donald Trump

há 3 horas 1

A latino-americanização dos Estados Unidos continua de vento em popa. Trump está causando recessão somente por sua inconsistência. Ao prometer uma coisa e mudar de ideia, ameaçar com tarifas e voltar atrás e demitir funcionários somente para recontratá-los uma semana depois, o governo Trump joga as expectativas no fundo do poço, de onde vai demorar para a economia americana sair. O modelo do Federal Reserve de previsão do PIB já aponta contração de 2,4% para o primeiro semestre.

Esse tipo de incerteza é bem comum no Brasil. Políticas que são anunciadas, mas ficam marinando no Congresso, ou ações revertidas rapidamente tornam investimentos de longo prazo menos atrativos.

No caso americano, muitas empresas americanas estão paralisadas. E isso depois de gastarem rios de dinheiro se preparando para medidas que foram canceladas. Foram milhares as reuniões em multinacionais para organizar cadeias de produção com mudanças tarifárias. A perda em eficiência vai contaminar toda a economia. E isso sem contar no freio do consumo.

"Quando fizer o bem, faça-o aos poucos. Quando for praticar o mal, é fazê-lo de uma vez só." Há uma razão para qual o famoso conselho de Maquiavel continue atual. Economias modernas funcionam em grande parte à base de expectativas. Quando a sociedade espera maldades, mas não sabe o tamanho ou quando elas vão vir, consumo e investimento travam. As medidas de incerteza de política econômica estão maiores do que no começo da pandemia. Ou seja, Trump parece mais caótico do que um vírus que parou a economia global por meses.

Mais de 200 mil dos 3 milhões de funcionários públicos federais já foram demitidos. O problema é ninguém saber quantos mais vão perder o emprego. O governo anunciou que metade dos funcionários do Departamento de Educação será demitida. Mas será realmente esse número? Mais? Menos? Ninguém sabe.

Assim, em vez de uma redução de consumo de parte da força de trabalho, é possível que a maioria dos 3 milhões de funcionários esteja segurando as contas, com impactos gigantescos sobre economias locais. Combinado com as empresas multinacionais segurando investimentos, pois não sabem como se proteger das disrupções das cadeias globais de valor, a recessão é certa.

A crise já chegou às empresas de setores não relacionados com as medidas de Trump. A Delta Airlines foi clara no seu anúncio mais recente para investidores: os lucros serão menores por causa do aumento da incerteza econômica generalizada. Nem sempre dá para afirmar por que o mercado acionário desabou, já que sempre há dezenas de choques, positivos e negativos, afetando a economia simultaneamente. No caso da queda recente dos mercados globais, só há uma razão: aumento dramático da incerteza sobre a economia americana.

O mais engraçado é ver Trump repetindo a palestrinha de presidentes latino-americanos, de que mercados financeiros estão exagerando e não importam muito. Bolsas importam porque sinalizam expectativas de investimentos. Essa ladainha e o descaso com políticas consistentes ao longo do tempo são o que mantêm a região firmemente presa na armadilha da renda média.

Os EUA vão pegar uma gripe. E nós? É melhor nos prepararmos para não pegarmos pneumonia.

Folha Mercado

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