O sábio malandro Nasreddin Hodja, figura mítica do folclore do Oriente Médio, protagoniza várias histórias tradicionais interessantes. Por exemplo: durante um período de implacável seca, os habitantes de uma aldeia procuraram-no por terem ouvido dizer que ele sabia como fazer chover.
Nasreddin disse que era verdade, e para tanto precisava apenas de uma bacia de água. Água é o nosso problema, disseram as pessoas, mas com esforço conseguiram dar-lhe uma bacia cheia. Para espanto de todos, Nasreddin despiu-se e começou a lavar a sua roupa na preciosa água que lhe tinham dado. No fim, disse: agora preciso de outra bacia de água.
As pessoas perderam a cabeça. Mas, tendo em conta o esforço já investido, reuniram toda a pouca água que lhes sobrava e deram-lhe. Com horror, viram que Nasreddin estava agora a enxaguar, na bacia nova, a roupa que tinha lavado na bacia anterior. Quando as pessoas se revoltaram e quiseram bater-lhe, Nasreddin aproximou-se do estendal, por cima do qual já começavam a formar-se algumas nuvens, e disse: calma. Nunca falha. Sempre que eu estendo roupa, chove.
Não sei se veem onde quero chegar. O raciocínio de Hodja é simultaneamente absurdo e lógico. Na qualidade de estrangeiro, é a impressão que tenho da política brasileira. Fulgurantemente absurda; rigorosamente lógica.
Quando Pablo Marçal foi agredido por Datena com uma cadeira, isso foi absurdo. São candidatos à prefeitura da maior cidade do hemisfério ocidental, e não à administração de um saloon no faroeste, pelo que a agressão à cadeirada não é um talento que se valorize.
No entanto, o incidente é lógico. Quem se lembra que, em dezembro de 2021, na sua fase messiânica, Marçal esteve em Goiânia e tentou curar uma cadeirante tetraplégica, sabia que, havendo justiça, um dia ele teria um justo castigo envolvendo uma cadeira.
Também absurda e lógica é a acusação de Marçal a Guilherme Boulos, do PSOL. Diz que Boulos é drogado e foi preso com droga. Ora, de fato houve um Guilherme Boulos julgado por posse de droga, mas foi Guilherme Bardauil Boulos, do Solidariedade, e não Guilherme Castro Boulos, do PSOL. Portanto, a frase "Guilherme Boulos foi julgado por posse de droga" é fatualmente verdadeira e completamente falsa.
Na Grécia antiga era fácil refletir sobre lógica. Queria ver Aristóteles em São Paulo.