Opinião - Reinaldo José Lopes: Ema, ema, ema também resolve problema

há 1 mês 6

Até agora, emas, avestruzes e sua parentela costumavam ser vistos com certa comiseração pelos pesquisadores que estudam as capacidades cognitivas das aves. Aquela coisa de olhar para os bichos e pensar "ô, coitados".

Se corvos e papagaios frequentemente encantam os cientistas com sua capacidade de usar ou mesmo fabricar as próprias ferramentas, para não falar de sua sofisticada cognição social (ou, sendo menos generoso, malandragem), as aves grandalhonas e de hábitos terrestres, que pertencem ao grupo das paleognatas, pareciam ser as alunas mais atrasadas da classe, por assim dizer.

Em parte, a suposta falta de esperteza poderia ser atribuída ao tamanho do cérebro proporcionalmente menor nas paleognatas, quando comparado à massa encefálica de suas primas. E isso, por sua vez, teria alguma relação com o fato de que o grupo foi o primeiro a divergir dos demais na trajetória evolutiva das aves ainda vivas hoje.

De fato, as paleognatas, que incluem ainda bichos de tamanho mais modesto, como os inhambus, têm mais semelhanças anatômicas com os dinossauros ditos "não avianos" (ou seja, aqueles que não pertencem ao grupo das aves). Há quem imagine que essa semelhança se estende também ao comportamento e à cognição, fazendo delas bons modelos para imaginar como seria um dino vivo. E dinossauros, apesar da famosa Blue e dos demais Velociraptor dos filmes com "Jurassic" no título, não costumam ser sinônimo de inteligência.

Mas talvez faltasse dar mais chances de provar seu valor às paleognatas, e foi isso o que fizeram as autoras de um estudo publicado na semana que passou. Uma equipe da Universidade de Bristol, no Reino Unido, tinha à sua disposição algumas emas, avestruzes e emus (sim, o nome confunde, mas é uma espécie bem diferente da que conhecemos, oriunda da Austrália). E resolveu testar sua capacidade de resolução de problemas para descolar comida.

Para ser exato, os "alunos" eram três emus, duas emas e quatro avestruzes do zoológico Noah’s Ark Zoo Farm. A equipe, liderada pela psicóloga comparativa Fay Clark, bolou uma geringonça simples formada por uma espécie de pratão redondo com divisórias internas. Em cima desse prato havia um disco de acrílico com um buraco redondo em uma de seus cantos.

O disco, como talvez você tenha imaginado, podia girar. Para ter acesso às guloseimas (uma porção de alface, veja só, que esses bichos parecem adorar), a ave precisava aprender que, girando o disco, o buraco ficava alinhado com as divisórias do prato e se tornava possível enfiar o bico lá dentro.

Bem, tanto os três emus quanto uma das emas aprenderam o truque sem precisar quebrar muito a cabeça (os avestruzes, por sua vez, não tiveram sucesso, coitados). A ema mais esperta, aliás, descobriu ainda um método alternativo: arrancar o parafuso que prendia o disco de acrílico ao prato, desprendendo-o e, assim, ganhando acesso a toda a alface. Mas ela abandonou esse estilo mais casca-grossa depois que aprendeu a girar o disco.

A equipe diz que ainda é preciso cautela para interpretar os dados: o sucesso pode ser apenas resultado de tentativa e erro simples. Ainda assim, faz sentido concluir que os boatos sobre a cabeça oca das emas eram, no mínimo, exagerados.

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