Ainda impera o vale-tudo nos chamados empréstimos fáceis e rápidos, que não exigem comprovante de renda nem bens em garantia. Eles são sinônimos de juros extorsivos, beirando a agiotagem. E sempre surge uma nova esperteza, como vincular o empréstimo ao celular, que tem várias funções bloqueadas quando as prestações não são pagas. O celular é um bem essencial. Não pode ser bloqueado dessa forma, e as informações não são claras. Defendo que esse tipo de empréstimo seja regulado, a fim de evitar violações ao Código de Defesa do Consumidor e à privacidade.
Isso é cobrança vexatória e coloca o consumidor em desvantagem, afirma meu colega de defesa do consumidor Arthur Rollo, ex-secretário nacional do Consumidor. Segundo ele, é uma forma de crédito irresponsável. "Se a pessoa não tiver renda, nem como dar garantia, o crédito deverá ser negado", observa. Concordo plenamente, porque a falta de renda e de garantias indica que, mais cedo ou mais tarde, haverá inadimplência temporária ou permanente.
O professor e advogado José Luiz Parra Pereira considera que "a prática é abusiva sim, e viola toda a principiologia da Lei do Superendividamento, especialmente o crédito responsável, haja vista a taxa de juros mencionada na reportagem". A taxa de juros a que se refere, mais de 800% ao ano, foi citada em matéria do jornal Fala Brasil, da TV Record.
Já outro colega, o jurista Luiz Antonio Rizzatto Nunes, discorda. Entende que o celular possa ser oferecido em garantia. "Esse consumidor que somente tem um aparelho celular para oferecê-lo em garantia para obter dinheiro emprestado, está literalmente abandonado pelo sistema bancário, e também, estatal. Aliás, está absurdamente abandonado pelos órgãos de proteção ao consumidor públicos e privados."
No já citado Fala Brasil, uma aposentada por invalidez contou que foi depositado um dinheiro não solicitado em sua conta-corrente, com parcelas cobradas como se tivesse contraído uma dívida. Na Justiça, a aposentada conseguiu anulação do contrato, desbloqueio do celular, exclusão do cadastro de maus pagadores e indenização por danos morais.
Mas, convenhamos, ter de recorrer à Justiça contra práticas reiteradas de desrespeito ao CDC e à privacidade é um transtorno para os consumidores, além de implicar custos. É urgente regular essas empresas, a fim de que haja normas legais e éticas que evitem a indução ao superendividamento, bem como o bloqueio abusivo do telefone celular.
Esse tema motivou matéria do UOL, justamente questionando a legalidade ou não do bloqueio de celular associado a dívida de empréstimo.
Continuo afirmando que, além da regulação das finanças populares, falta educação financeira para brasileiros e brasileiras, e, obviamente, crescimento econômico relevante e contínuo que gere empregos formais com melhores salários.