O romance best seller "É assim que acaba", de Colleen Hoover, que recentemente foi adaptado para os cinemas, trata da questão de violência contra a mulher. O livro foi baseado em experiências intergeracionais de violência doméstica na família da autora, destacando como esse ciclo, se não interrompido, tende a se perpetuar e normalizar a violência entre as gerações.
Fora das telas, uma conhecida minha, inteligente e extrovertida, casou-se com vinte e poucos anos. Inicialmente, o relacionamento parecia saudável, até que soubemos que ela apanhava do marido.
A situação veio à tona após uma vizinha ouvir os distúrbios e compartilhar suas preocupações com a diarista, que por sua vez informou os pais da minha conhecida. Assim que souberam, os pais conversaram com ela que, muito relutantemente, confirmou a situação. Os pais imediatamente a aconselharam a sair de casa e se divorciar.
A sorte da minha amiga é que a vizinha e a diarista não se calaram. Este caso reflete a importância de desafiar o ditado "em briga de marido e mulher ninguém mete a colher", pois muitas vítimas se sentem envergonhadas e ocultam seu sofrimento.
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No Brasil, os números sobre violência doméstica —um tipo de violência que ocorre principalmente contra as mulheres— impressionam. De acordo com o Atlas da Violência de 2024, do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), 65,2% de todas as notificações de violência contra mulheres são classificadas como domésticas. Os tipos de violência mais conhecidos incluem a física e a sexual, mas a Lei Maria da Penha também identifica outras categorias, como a violência financeira, psicológica, moral e patrimonial.
O Instituto Maria da Penha, criado em homenagem à sua fundadora, trabalha para dar visibilidade ao assunto, monitorar e auxiliar no desenvolvimento de políticas públicas eficazes. Além disso, o instituto realiza, em parceria com a UFC (Universidade Federal do Ceará), pesquisas de campo sobre violência doméstica, coordenadas pelo professor José Raimundo Carvalho (CAEN-UFC).
A coleta de dados e realização de estudos, juntamente com a pressão exercida pela sociedade, desempenham um papel crucial para que a legislação seja cumprida e aprimorada, e que políticas de combate a essa violência, como a criação de abrigos e as delegacias especializadas no atendimento à mulher, sejam implementadas.
Os motivos que levam a um episódio de violência podem ser aleatórios, como uma frase mal interpretada ou uma derrota do time de futebol do agressor. Alguns trabalhos relacionam jogos de futebol ao aumento da violência contra a mulher. A dissertação de Isadora Árabe, aluna de doutorado da LSE (London School of Economics), mostra que em dias de jogos de futebol há um aumento nas denúncias de violência doméstica.
Segundo a literatura, os danos causados pela violência doméstica podem afetar não somente a mulher, mas também seus filhos. Dados preliminares da tese de doutorado de Giovanna Úbida, do Insper, mostram que filhos de mulheres que sofrem violência doméstica, especialmente a física, apresentam déficits em habilidades socioemocionais.
A vergonha frequentemente atua como um obstáculo significativo para que vítimas de violência rompam o ciclo abusivo. Nesse contexto, a intervenção de terceiros e o apoio familiar são fundamentais para ajudar a superar essas barreiras e encerrar esse ciclo. A sociedade não pode se omitir diante dessa brutalidade, e é crucial que cada um esteja atento e disposto a intervir para proteger as vítimas.
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