Opinião - Flavia Boggio: Trabalhe enquanto seu patrão dorme

Caros leitores, venho por meio deste espaço manifestar minha indignação sobre essa tal de PEC do fim da escala 6x1. Sou empresário, pagador de impostos, cidadão de bem que gera empregos. Como vou manter meus restaurantes, se meus funcionários folgarem dois dias por semana? Dizem que eles precisam descansar. E meus clientes que descansam vários dias? Quem vai servi-los?

Nós não vivemos em um país livre? O cidadão tem liberdade para trabalhar todos os dias por semana ou não. E o patrão é livre para demitir quem não quiser e folgar quando der na telha. É a mão livre do mercado. Ela faz carinho em alguns poucos e dá porrada em outros muitos. Há gente reclamando que o trabalhador precisa folgar no final de semana para ver a família. Que bote toda a família para trabalhar também. Aí ninguém precisa se ver.

Outros falam que, com o tempo livre, as pessoas podem estudar e se aprimorar. Aí vão pedir aumento, promoção, e eu saio duas vezes prejudicado.

Eu trabalho 7x0. Só paro quando tenho algum compromisso, como meu treino de hipismo, minha aula de vinho à tarde. Ou quando dou uma das minhas palestras para pessoas que não trabalham todos os dias sobre a importância de fazer os funcionários trabalharem todos os dias.

Também trabalho quando vou à academia, onde trabalho meus bíceps. E na praia sempre peço uma caipirinha e posto no Instagram com a legenda "abrindo os trabalhos".

Não tem aquele negócio de "trabalhe enquanto eles dormem"? Eu tenho vários funcionários trabalhando em minha casa enquanto eu durmo. São seguranças, faxineiros, copeiros —porque posso precisar beber água à noite. Eles amam o que fazem. Quem diz o contrário, eu já mando achar outro amor por aí e não voltar. Isso é liberdade. Se acabarem com a escala 6x1, quem vai preparar minha comida nos finais de semana?

Quem vai limpar meu banheiro? Eu? Minha mulher?

E depois? Essas pessoas vão querer o quê? Ter momentos de lazer? Construir uma família? Um círculo de amigos? Ter saúde mental? Fazer coisas absurdas como se divertir? Viver? É o que me faltava.

P.S.: Gostaria de agradecer à colunista que cedeu o espaço para esta carta. Como ela está exausta com sua carga de trabalho, não se opôs à ideia de escrever um texto por ela. Sem a escala 6x1, isso não seria possível.