Opinião - Deborah Bizarria: Revisão de gastos precisa de uma frente ampla

há 2 meses 1

Segundo o último relatório do Instituto Fiscal Independente, o endividamento público brasileiro deve aumentar em 12,4 pontos percentuais ao longo do atual mandato presidencial, podendo atingir 84,1% em 2026. Diante desse cenário alarmante, é imprescindível mobilizar uma ampla frente para revisar e aprimorar a qualidade dos gastos públicos, garantindo sustentabilidade fiscal e desenvolvimento social.

A equipe econômica, liderada pelo ministro Fernando Haddad, está preparando um pacote de medidas para cortar entre R$ 30 bilhões e R$ 50 bilhões em despesas. Entre as propostas estão alterações nas políticas de proteção ao trabalhador, como ajustes no seguro-desemprego cuja demanda tem aumentado apesar dos níveis altos de emprego. Além disso, o ministério tem apoiado projetos de lei para limitar os supersalários, acima de R$ 44 mil, no funcionalismo público.

No entanto, a efetividade dessas iniciativas enfrenta obstáculos. Lobbies poderosos e segmentos da classe política, tanto dentro quanto fora do governo, têm atuado contra essa agenda. Um exemplo claro é o projeto de lei dos supersalários. Conforme destacado pelo economista Bruno Carazza no Valor Econômico, dados do Conselho Nacional de Justiça revelam que 93% dos magistrados brasileiros receberam, no ano passado, salários acima do teto constitucional, resultando em um excedente de R$ 8 bilhões. Se estendermos essa análise a outros órgãos do Executivo, Legislativo e Ministério Público, o montante pode ultrapassar R$ 20 bilhões.

Apesar disso, o PL dos Supersalários, que poderia corrigir essas distorções, foi desfigurado. Com 32 exceções inseridas, o projeto mantém privilégios que permitem a continuidade dos vencimentos acima do teto. Em vez de cortar despesas, o texto, se aprovado como está, legalizará os penduricalhos e tornará ainda mais difícil a reforma administrativa no futuro.

Paralelamente, a economista Laura Machado aponta que ajustes no Bolsa Família poderiam reduzir significativamente a pobreza e ao mesmo tempo gerar uma economia de até R$ 100 bilhões. O atual modelo, ao oferecer um valor fixo de benefício, desestimula a declaração correta de renda e a busca por emprego formal. Caso seja redesenhado como complementação de renda, o programa incentivaria a inclusão produtiva, criando uma rampa no valor do auxílio conforme a renda das famílias até atingirem a linha de pobreza, sem penalizá-las por aumentos modestos em sua renda.

Ainda, há subsídios e renúncias fiscais que às vezes beneficiam poucas empresas em detrimento da sociedade como um todo. Em junho, o TCU apontou que os subsídios somaram R$ 646 bilhões, representando um aumento de 8% em relação ao ano anterior. Ou seja, há espaço para um grande pente fino sobre a eficiência e equidade desse tipo de programa.

É necessário reconhecer que recursos são escassos e que o dinheiro dos pagadores de impostos precisa ser melhor utilizado. Esse esforço não pode ficar restrito a um ou dois ministérios, é crucial formar uma frente ampla que reúna governo, sociedade civil e setor privado, superando entraves de interesses particulares e lobbies influentes. Realocar recursos significa investir onde faz diferença, promovendo o desenvolvimento para todos e não o enriquecimento de alguns.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

Leia o artigo completo