Opinião - Bráulio Borges: Mais armas, mais violência! Menos impostos sobre elas?

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No final do primeiro semestre deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei complementar 68/2024, que regulamenta alguns aspectos da reforma da tributação indireta aprovada no final do ano passado (emenda constitucional 132/2023).

Apontei em coluna anterior que o Senado deveria evitar a concessão de mais tratamentos favorecidos a alguns produtos, além de reavaliar muitos outros que foram introduzidos pela Câmara —os quais tiveram como resultado uma elevação da alíquota de referência, aplicada a boa parte dos produtos, de 26,5% para cerca de 28%.

Também disse naquela coluna que a lista dos produtos sujeitos ao imposto seletivo (taxação adicional para produtos que geram efeitos nocivos ao meio ambiente, à saúde humana e ao bem-estar) deveria ser ampliada, incluindo armas e munições, alimentos processados e ultraprocessados, apostas online e combustíveis de origem fóssil.

Pois bem, o PLC 68 está em vias de ser aprovado pelo Senado e, infelizmente, além de não ter revertido os favorecimentos introduzidos pela Câmara (vários deles injustificáveis), poderemos ter mais retrocessos. Os refrigerantes foram excluídos da lista de produtos sujeitos ao imposto seletivo, a despeito de ampla evidência de que bebidas açucaradas geram efeitos nocivos para a saúde humana em termos individuais e coletivos, como aponta estudo recente que se debruçou sobre esse tema.

Além disso, a despeito da tentativa de incluir armas e munições na taxação extra do imposto seletivo, isso acabou sendo retirado do texto. O resultado prático é que a carga tributária sobre esses produtos poderá ser menor do que é hoje.

Os políticos que são defensores das armas apontaram que sua inclusão no IS iria gerar um encarecimento relevante delas. Ora, a ideia é exatamente essa, uma vez que, segundo as evidências empíricas mais recentes, o impacto de armas na sociedade é negativo.

Trabalho acadêmico publicado no começo deste ano ajuda a iluminar esse debate. Utilizando dados bastante desagregados para os Estados Unidos entre 2014 e 2023, os autores chegaram à conclusão de que, de fato, do ponto de vista individual, a posse e o porte de armas reduzem o risco de que uma vítima de um crime seja machucada ou morta.

Entretanto, do ponto de vista da sociedade como um todo, da coletividade, o maior número de armas está associado a um número maior de crimes violentos, lesões e fatalidades, tanto das vítimas como dos criminosos. Isso acontece na medida em que a maior oferta de armas aumenta o incentivo e as oportunidades para os criminosos acessarem armas. Isso, aliás, está acontecendo no Brasil, com armas de colecionadores sendo "desviadas" para o crime organizado.

Portanto, temos um caso "clássico" de externalidade negativa, que deveria ser corrigida por regulação (regras restritivas de posse e porte) e taxação (que deveria encarecer esses produtos).

Estamos perdendo a oportunidade de utilizar o imposto seletivo como uma poderosa política pública, que poderia gerar um triplo ganho para a sociedade brasileira: i) redução da alíquota de referência sobre mais de 90% dos produtos; ii) melhoria do bem-estar; iii) redução, no médio e longo prazo, dos gastos públicos e privados com saúde.

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