Após endurecer as regras do BPC (Benefício de Prestação Continuada), o governo não terá como fugir de adotar medidas para o controle da concessão do auxílio-doença.
Não é normal que a quantidade desse tipo de benefício por incapacidade temporária ao trabalho esteja num ritmo desgovernado de alta, que se aproxima hoje de 50% ao ano.
Entre os benefícios da Previdência, é o que, disparado, mais cresce. Enquanto os demais registram um crescimento entre zero e 11,1%, o auxílio-doença avançou 48,8% em maio deste ano em relação ao mesmo mês de 2023.
Especialistas argumentam que a alta não está relacionada apenas a uma aceleração da análise dos pedidos do benefício por meio do Atestmed, sistema usado pelo INSS que dispensa a perícia presencial e que permite a inclusão do atestado médico pela internet.
A desconfiança é que o próprio Atestmed seria uma fonte importante de aumento das fraudes por cibercriminosos, como apontou o ex-presidente do INSS e consultor da Câmara Leonardo Rolim, em entrevista à Folha.
Se Rolim e outros técnicos estiverem certos, o governo precisará urgentemente enfrentar o problema, corrigir os erros, para melhorar o uso do Atestmed, que até agora tem sido vendido pelo INSS como uma arma importante de economia de gastos.
Apesar dos sinais evidentes de problema, há a avaliação de que o saldo do Atestmed será positivo depois de um esforço adicional para coibir as fraudes ainda a ser anunciado.
Não dá mais para esperar.
A escalada dos gastos com os benefícios previdenciários e o BPC é uma dor de cabeça. Como são obrigatórios, o governo não pode simplesmente cortá-los.
A consequência é que o governo terá de passar a tesoura em outras despesas não obrigatórias, como investimento e custeio da máquina, para cumprir o teto de gastos que a nova regra para as públicas —o chamado arcabouço fiscal— estabeleceu.
É comum a avaliação, inclusive entre leitores desta Folha, que o governo deveria se preocupar mais com outros gastos, como o salários dos parlamentares, do que com o auxílio-doença e benefícios sociais.
O argumento é frágil e irresponsável. Se há despesas escorrendo pelo ralo, por que não fechar os vazamentos agora?
Esse mesmo pensamento fomentou a resistência de setores do governo, como no Ministério da Previdência Social, ao programa de revisão de gastos. A demora do presidente Lula em dar sinal verde para agir pelo lado das despesas agravou a situação.
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O aperto começou com o BPC, por meio de duas portarias, que saíram na semana passada. Elas não mudaram as regras do programa. Só fizeram o que já deveria ter feito.
No primeiro semestre, o aumento dos gastos previdenciários e BPC se aproximou de R$ 50 bilhões. Em seis meses, foram R$ 48 bilhões. É um crescimento insustentável.
O governo deixou o problema escalar a ponto de colocar em risco os andamento dos investimentos públicos, considerado a vitrine do governo Lula e ponta de lança do novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
O aumento das despesas obrigatórias levou ao corte de R$ 15 bilhões. Ele vai afetar investimentos, como poderá ser observado nesta terça-feira (30), quando o governo anuncia qual ministério vai, proporcionalmente ao tamanho do seu orçamento anual, pagar a conta.
A conta de negar os problemas está aparecendo. Veremos quem vai pagar mais.