O que é pejotização? Entenda por que Gilmar Mendes suspendeu ações no STF

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Trabalhadores e empresas que debatem na Justiça a legalidade dos contratos PJ (pessoa jurídica) vão ter de esperar por uma decisão final do STF (Supremo Tribunal Federal) sem que haja movimentação nos processos em curso.

O ministro Gilmar Mendes, relator do caso no Supremo, suspendeu todas as ações que tratam de pejotização no Judiciário até que a corte tome uma decisão final. O julgamento do Tema 1.389 tem repercussão geral e valerá para todas as ações do tipo na Justiça.

A pejotização é uma forma de contratação na qual o profissional abre uma empresa e presta serviço para outra, sem que haja vínculo trabalhista pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

Segundo especialistas ouvidos pela Folha, a contratação PJ em si não é barrada na CLT, mas pode ser considerada ilegal caso seja usada pelo empregador para burlar a legislação trabalhista.

"Esse instrumento, no qual uma empresa contrata outra para prestar serviços, é aceito na Justiça, porque entende-se que as partes, caso não haja hipossuficiência, têm liberdade", diz o advogado e mestre em direito do trabalho, Luiz Eduardo Amaral de Mendonça, do Fas Advogados, membro do Getrab-USP (Grupo de Estudos de Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social da Universidade de São Paulo).

Dados da Justiça trabalhista mostram que o número de ações questionando a pejotização vem crescendo. Só nos dois primeiros meses deste ano, foram abertos 53.678 processos por "reconhecimento de relação de emprego".

Esse subgrupo envolve não só processos relacionados a contratos PJ, mas também trabalhadores com carteira assinada e, em alguns casos, até trabalho análogo à escravidão. Em 2022 foram abertos 153.198 processos, contra 180.642 em 2023 e 285.055 em 2024.

Os processos por "reconhecimento de relação de emprego" são o 15º assunto mais tratado no Judiciário do Trabalho neste ano. Os temas mais recorrentes são adicional de insalubridade, verbas rescisórias e multa de 40% sobre o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).

O advogado Arnaldo Pipek, sócio do Pipek Advogados, afirma que a pejotização começou a ganhar força no Brasil a partir do início dos anos 2000, especialmente em setores de tecnologia e consultoria, "tomando tração a partir de 2010".

"A contratação como PJ traz vantagens tributárias para ambas as partes, e, como principal desvantagem para os prestadores de serviços, a inexistência de direitos trabalhistas, tais como férias, 13º salário e FGTS."

"Há juízes que dão pejotização como legal e outros como fraude; é importante que haja essa unificação e que também tenha um debate no Supremo nesse sentido. Nós, da UGT, enxergamos que há muitas fraudes", diz Ricardo Patah, presidente da UGT (União Geral dos Trabalhadores).

O que o STF vai decidir sobre pejotização?

O plenário do STF deve se reunir, ainda sem data marcada, em julgamento do tema 1.389, que tem repercussão geral, para definir:

  1. De quem é a competência para julgar casos em que se discute a fraude no contrato de trabalho por meio da pejotização, se da Justiça do Trabalho ou da Cível
  2. Se a contratação de trabalhador autônomo ou pessoa jurídica para a prestação de serviços é lícita ou ilícita, tendo como base o que já decidiu o próprio STF na ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 324, que reconheceu a validade constitucional de diferentes formas de divisão do trabalho e a liberdade de organização produtiva dos cidadãos
  3. Quem deve provar que houve fraude na contratação civil, o empregado ou o empregador, e de quem é a responsabilidade ao firmar esse tipo de contrato

Qual foi a decisão do ministro Gilmar Mendes sobre os processos envolvendo contratos PJ?

O ministro Gilmar Mendes determinou a suspensão nacional de todos os processos que se é lícito ou não contratar por meio da pejotização, contrato usado em diversos setores, como representação comercial, corretagem de imóveis, advocacia, saúde, artes, tecnologia da informação e entrega por motoboys, entre outros.

Para o ministro, há uma controvérsia sobre a legalidade desses contratos, que tem sobrecarregado o STF diante do elevado número de reclamações contra decisões da Justiça do Trabalho. O Judiciário trabalhista tem decisões a favor e contra a pejotização. Já o STF não vê problemas nos contratos PJ.

"O descumprimento sistemático da orientação do Supremo Tribunal Federal pela Justiça do Trabalho tem contribuído para um cenário de grande insegurança jurídica, resultando na multiplicação de demandas que chegam ao STF, transformando-o, na prática, em instância revisora de decisões trabalhistas", afirmou.

As ações do tipo no país ficam paradas, até que o STF julgue o tema, o que não tem data para acontecer. O advogado e mestre em direito do trabalho, Luiz Eduardo Amaral de Mendonça, do Fas Advogados, membro do Getrab-USP (Grupo de Estudos de Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social da Universidade de São Paulo), diz que há muitas dúvidas sobre o alcance da decisão.

Essa suspensão é para processos em qual fase? Os que já transitaram em julgado (chegaram totalmente ao final) e estão esperando só o cálculo também vão ser suspensos? E quem ganhou ação por meio de liminar, em fase de execução provisória, deve ter a decisão paralisada?

Outro ponto apontado por ele são as ações de fiscalização do Ministério Público do Trabalho. Como dizer se o contrato é ilícito, se o STF ainda não decidiu isso?

O que é e como funciona o contrato PJ?

Um contrato PJ é um tipo documento de prestação de serviços firmado entre uma empresa e um profissional ou outra empresa, que atua como pessoa jurídica, sem vínculo de emprego previsto pela CLT, com direitos constitucionais como 13º salário, férias, FGTS e multa na rescisão sem justa causa.

Quais os riscos de contratar PJ?

O principal risco na contratação de PJ permanece a possibilidade de reconhecimento do vínculo empregatício e no pagamento de todos os direitos decorrentes de uma relação de emprego, explica o advogado Arnaldo Pipek, sócio do Pipek Advogados.

Quem já tem contrato PJ será afetado pela decisão de Gilmar Mendes?

Não há, por ora, qualquer reflexo nos contratos vigentes com PJs, afirma Pipek. A suspensão se refere apenas às ações judiciais nas quais se discutem a descaracterização da prestação de serviços por meio de PJ e o reconhecimento do vínculo de emprego.

Após a decisão final do STF, se abrirá um horizonte mais claro a respeito da segurança jurídica nesta forma de contratação tanto para empregados quanto para empregadores.

Como um profissional prova que a contratação PJ está errada e deveria ser pela CLT?

Advogados que atuam em causas relacionadas ao direito dos trabalhadores à carteira assinada em vez da contratação PJ dizem que a relação do trabalho se dá, conforme a CLT, quando há quatro requisitos básicos:

  1. Não eventualidade, ou seja, trabalho constante, com horário de entrada e de saída controlados pelo empregador
  2. Subordinação: quando há um chefe e o trabalhador não tem independência de decidir sobre suas ações, seus dias e horários de trabalho e suas funções, ou seja, não pode tomar decisão sozinho
  3. Onerosidade, que é o pagamento de um salário pelo trabalho realizado de forma habitual
  4. Pessoalidade, nos casos em que só aquele trabalhador pode fazer determinado tipo de trabalho

Outros especialistas, no entanto, afirmam que essas definições são ortodoxas e já estão sendo flexibilizadas no Judiciário. Mesmo no TST (Tribunal Superior do Trabalho), os ministros têm entendido que contrato PJ pode ter os quatro requisitos acima, desde que isso fique claro na contratação, e que o trabalhador seja "hipersuficiente, ou seja, não seja carente.

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