Com a expansão de marcas orientais mundo afora nas últimas décadas (primeiro as japonesas, depois as sul-coreanas e, em breve, adivinhe quem vem...), o mercado mundial, que permanece estacionado entre 90 e 95 milhões de unidades por ano há um bom tempo, tem sido repartido em fatias menores para cada fabricante. Sabe o que isso provoca? Medo de errar!
Lançar um projeto muito ousado, hoje em dia, pode custar caro a qualquer montadora. A atual lógica da indústria automobilística mundial uniformiza cada vez mais as plataformas, o conteúdo mecânico e os estilos dos carros em nome da racionalização de custos. E o mandamento é não correr nenhum risco. Lançar um carro que não seja SUV, hatch, sedã ou picape... é agir de forma arriscada.
Foto de: Motor1.com
As exceções confirmam a regra, mas a cartilha é a seguinte: “Faz aí a plataforma de um compacto, com opções hatch e sedã. E não esquece de desenhar também um ‘hatch altinho’, que o mercado vai acatar como SUV. E nem tenta fazer outra carroceria, que ninguém vai comprar mesmo...”
Já ouviu falar da história de opções de cores do Ford Modelo T, mais de um século atrás? “Temos todas, desde que seja preto”. Hoje a lógica é mais ou menos essa. “Sempre ouvimos nosso cliente para produzir o carro que ele quer – desde que seja um daqueles quatro”.
Foto de: Motor1.com
Nos anos 60 e 70, fase de ouro da criatividade dos designers, tínhamos enorme pluralidade de opções, tanto de design como de receitas mecânicas. Partia-se do princípio de que as pessoas não eram iguais... por que os automóveis deveriam sê-las? Mas era um mercado mundial que crescia ano após ano.
Com a recente estagnação mundial das vendas, ocorreu que se tornou caro ter diversas ferramentas de peças estampadas para gerarem carros diferentes, bem como equipamentos, motores e acessórios, motivo pelo qual as marcas foram recuando, agrupando projetos nas mesmas plataformas e, hoje, virou isso daí que você vê nas ruas.
Foto de: Volkswagen
VW Passat Variant
VW Eos
Lembra da Volks de 15 anos atrás? Gol, Voyage, Parati, Saveiro, Fox, SpaceFox, Polo, Polo Sedan, Golf, Bora, Jetta, Eos, New Beetle, Passat, Passat CC, Passat Variant, Tiguan, Touareg...e Kombi. Eram 19 carrocerias. Hoje? Apenas 8.
Esse empobrecimento de opções é causado, dentre outros fenômenos, pela “SUVização” do mercado mundial. Antigamente, você tinha sedãs, cupês, wagons, picapes, hatches, fastbacks, roadsters, cabrios, utilitários... E todos com portes compactos, médios e grandes. Hoje? Por isso propus esse texto. Acho interessante enaltecer (e lembrar) as poucas montadoras que ainda têm a coragem de oferecer “carros diferentes” no mercado brasileiro. Quais são eles?
Audi RS6 Avant
Meu primeiro destaque é óbvio: Audi RS6. Ah, doutor, que sensacional saber que ainda há quem valorize o consumidor de peruas. E que perua... São mais de 600 cv de potência que rendem um desempenho inigualável para qualquer carro “familiar”. Ainda que você tenha SUV´s tão velozes como a RS6, tal como um RSQ8, nenhum deles tem o comportamento dinâmico exemplar da station. E nem a capacidade do porta-malas (545 litros). E nem é tão bonito como ela. O desaparecimento das peruas é a maior perda da indústria automotiva moderna.
O segundo destaque é bem recente. Nem chegou ainda ao país, mas a menção é mais do que justa: Porsche 911 Carrera T. A nova geração, que desembarca no Brasil em 2025, virá 100% equipada com câmbio manual na versão T. O intento não é comparar eficiências de sistemas de transmissão, mas valorizar montadoras que ainda ouvem seu público. E é óbvio que há, sim, clientes de 911 que prefiram a transmissão manual!
Porsche 911 Carrera T
Mudando radicalmente de segmento, mas mantendo o desempenho esportivo: Ranger Raptor. Ave Maria. Uma picape a gasolina que possui performance acentuada tanto no off-road como nas rodovias, visto que é servida por uma suspensão diferente das demais (amortecedores Fox e molas helicoidais na traseira) e por um V6 de quase 400 cv. É um veículo único, de tão divertido e versátil.
E que tal o Honda Civic Type-R? Nunca guiei, confesso. Já conversei com mais de uma dezena de coleguinhas da imprensa automotiva, no entanto, que aclamam o Type-R como um dos automóveis mais divertidos de pilotar. Seria a quebra de paradigma de ter quase 300 cv com tração dianteira? Não só isso. Mas isso, também. E com câmbio manual, tá?
Ford Ranger Raptor
Honda Civic Type R
Também quero incluir a Jeep Gladiator. Qual o grande destaque? A performance off-road. “Ah, mas você tem outras picapes muito boas no fora de estrada...” Sim, só que a Gladiator não é uma picape para usar no off-road, e sim um jipe 4x4 com carroceria de picape. O princípio é bem diferente.
Kia Carnival. O preço de mais de R$ 650 mil explica o porquê de ter se tornado um carro raro nas ruas. Além da Spin, que eu falo logo abaixo, ela é a única minivan do mercado nacional, e isso depois de termos convivido com Renault Scénic, Citroën Picasso, Chevrolet Meriva e Zafira, (...), Chrysler Grand Caravan, Mercedes Classe B, Nissan Livina. Sobrou a Carnival. Mas que ótimo que pelo menos uma tenha sobrevivido, pois nenhum SUV é tão confortável para acomodar 7 pessoas, aliás são 8 na Carnival, como uma minivan conceitualmente construída para isso.
Jeep Gladiator 2024
Kia Carnival 2025
Pra finalizar, eu trago (finalmente) dois modelos mais acessíveis: o Suzuki Jimny (único jipinho dessa categoria de entrada no país) e a Chevrolet Spin, que a GM insiste em descaracterizar como minivan. Mas que é, é.
E eu acho sensacional que ainda exista um modelo como esse, principalmente com 7 lugares, que se torna uma opção acessível ao bolso de quem não pode buscar os SUVs grandões – ou a própria Carnival. E mesmo para segmentos específicos, caso de taxi, ela é imbatível na sua faixa de preços. Tente ir ao aeroporto com a família e as malas em qualquer SUV...
Suzuki Jimny Sierra 2025
Chevrolet Spin 2025
Claro que eu esqueci de algum modelo. Talvez o Toyota Corolla GR ou o VW Jetta GLi. Qual você acrescentaria?