Não há um único fator por trás do aumento nos casos de autismo; entenda

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Quando o presidente eleito Donald Trump falou em entrevista recente entrevista na televisão sobre possibilidade de vacinas causarem autismo, uma teoria que foi desacreditada por dezenas de estudos científicos, pesquisadores nos Estados Unidos suspiraram coletivamente em frustração.

Mas durante a entrevista, no programa "Meet The Press" da NBC, Trump fez um comentário passageiro com o qual eles poderiam concordar: "Quero dizer, algo está acontecendo", disse ele, referindo-se às taxas crescentes de autismo. "Acho que alguém tem que descobrir."

Os diagnósticos de autismo estão inegavelmente em ascensão —cerca de 1 em cada 36 crianças vivem com a condição nos Estados Unidos, de acordo com dados coletados pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças, em comparação com 1 em 150 crianças em 2000— e os pesquisadores ainda não chegaram a uma explicação clara. Eles atribuem a maior parte do aumento à maior conscientização sobre o transtorno e às mudanças na forma como ele é classificado pelos profissionais de saúde. Mas os cientistas dizem que há outros fatores, genéticos e ambientais, que também podem estar desempenhando um papel.

O transtorno do espectro autista, como é oficialmente chamado, é inerentemente amplo, caracterizado por uma combinação de problemas sociais e de comunicação, comportamentos repetitivos e padrões de pensamento que variam em gravidade. Uma criança levemente autista pode simplesmente ter dificuldades sociais, enquanto uma criança com um caso grave pode ser não verbal. Não há teste de sangue ou exame cerebral para determinar quem vive com autismo, apenas as observações de um clínico.

Como não há uma causa singular da condição, os cientistas dizem que não há um único fator por trás do aumento nos casos. Mas no cerne da questão está uma distinção importante: mais pessoas estão exibindo os traços do autismo, ou mais pessoas com tais traços estão agora sendo identificadas? Parecem ser ambos, mas os pesquisadores realmente não têm certeza dessa matemática.

Possíveis causas do aumento de casos de autismo

Mais de 100 genes foram associados ao autismo, mas o transtorno parece resultar de uma combinação complexa de suscetibilidades genéticas e fatores ambientais. O CDC (Centros de Controle e Prevenção de Doenças nos Estados Unidos) tem um estudo em larga escala sobre os fatores de risco que podem contribuir para o autismo, e os pesquisadores examinaram dezenas de potenciais fatores, incluindo poluição, exposição a produtos químicos tóxicos e infecções virais durante a gravidez.

Algumas pesquisas sugerem que bebês nascidos de pais mais velhos —particularmente um pai mais velho— podem ter um risco aumentado de autismo. Outros estudos sugerem que o nascimento prematuro ou o baixo peso ao nascer podem estar associados ao autismo, que muitas vezes está ligado ao alto estresse oxidativo.

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A ideia de que tais fatores também poderiam estar envolvidos no aumento geral do autismo é convincente para Juergen Hahn, professor no Instituto Politécnico Rensselaer que estuda a biologia computacional do autismo, dado que tanto o número de crianças que sobrevivem ao nascimento prematuro quanto a idade média dos novos pais estão aumentando.

Mas testar um possível fator do autismo significaria controlar a lista interminável de outras influências no desenvolvimento precoce e acompanhar a criança até a idade adulta, quando algumas pessoas agora recebem seu diagnóstico.

"Esses são estudos muito complicados de conduzir, especialmente se você quer certeza estatística, e não há respostas fáceis", diz Hahn. "Às vezes, simplesmente temos que dizer que não sabemos. E isso sempre dá espaço para especulação."

A teoria desinformada de que as vacinas estão por trás do transtorno é um desses casos de especulação. Ela ganhou força quando um pesquisador britânico chamado Andrew Wakefield publicou um estudo de 12 crianças no final dos anos 1990, alegando revelar uma ligação entre a vacina contra sarampo, caxumba e rubéola e o autismo.

Muitos estudos maiores desde então desacreditaram a hipótese, incluindo um que inscreveu toda a população infantil dinamarquesa. Independentemente dos tipos de vacinas, dos ingredientes ou do cronograma, os pesquisadores não conseguiram estabelecer uma ligação. O artigo de Wakefield foi retratado, e ele perdeu sua licença médica, mas as sementes haviam sido plantadas no discurso social.

Avanço dos diagnósticos

Um componente no aumento dos casos de autismo é muito mais certo: a ampliação dos parâmetros do espectro.

O autismo apareceu pela primeira vez no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM, na sigla em inglês) em 1980, na terceira edição do guia, mas sua definição mudou em 1987, quando passou a incluir crianças cujos sintomas apareciam em idades mais avançadas —após 30 meses. A nova edição também expandiu os critérios para um diagnóstico de autismo, de seis para 16, e disse que as crianças precisavam exibir apenas metade dos 16 critérios listados, em vez de todos os seis dos critérios anteriores.

Uma quarta edição do DSM, publicada em 1997, incluiu o que então era chamado de síndrome de Asperger, um transtorno social que pode ser marcado por uma preocupação com um único interesse, no espectro do autismo. Isso foi uma mudança significativa, pois significava que pessoas com habilidades intelectuais médias ou até acima da média poderiam receber o diagnóstico.

A quinta edição, lançada em 2013, permitiu que os clínicos dessem um diagnóstico combinado de transtorno do espectro autista e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. Também incluiu o autismo, junto com o que anteriormente era rotulado como síndrome de Asperger e uma condição chamada PDD-NOS —abreviação de transtorno invasivo do desenvolvimento não especificado —sob um único guarda-chuva.

"O que chamamos de autismo mudou para se tornar uma categoria mais ampla", afirma Simon Baron-Cohen, diretor do Centro de Pesquisa de Autismo da Universidade de Cambridge. "Com o crescimento de clínicos privados oferecendo diagnósticos, tornou-se uma indústria."

Maior conscientização

À medida que esses processos clínicos evoluíam, também evoluía a infraestrutura social. Até os anos 1980, muitas pessoas com autismo eram institucionalizadas, então os pais estavam muito menos familiarizados com os traços característicos do transtorno e geralmente não os reconheciam ou buscavam um diagnóstico quando ocorriam em seus próprios filhos.

Então, em 1991, crianças com diagnóstico de autismo começaram a se qualificar para serviços especiais nas escolas, o que deu aos pais um incentivo para buscar e aceitar diagnósticos. Por volta de 2007, a Academia Americana de Pediatria recomendou que todas as crianças fossem examinadas para autismo aos 18 e 24 meses, o que os especialistas acreditam ter levado a um grande aumento na detecção.

Várias mudanças nas tendências populacionais adicionam mais evidências de que a conscientização e a inclusão poderiam estar por trás do aumento. Historicamente, os meninos foram diagnosticados com autismo em taxas muito mais altas do que as meninas, que se acredita "mascarar" seus sintomas de autismo devido às normas sociais. Mas em uma era de maior aceitação da neurodiversidade, a diferença de gênero está diminuindo.

Crianças hispânicas, negras e asiáticas mostraram grande aumento nos diagnósticos de autismo em comparação com crianças brancas entre 2011 e 2022, o que poderia refletir um melhor acesso aos serviços de diagnóstico. E, talvez o mais indicativo, os aumentos relativos nas taxas de diagnóstico de autismo na última década foram maiores não entre crianças, mas entre adultos de 26 a 34 anos, muitos dos quais estavam buscando seu próprio diagnóstico pela primeira vez.

Os pesquisadores também apontam a influência das mídias sociais como "um dos maiores fatores não reconhecidos que impulsionam a explosão de diagnósticos de autismo", segundo Baron-Cohen. Plataformas como o Reddit, diz ele, tornaram-se um espaço "onde pessoas que poderiam se perguntar se elas ou seus filhos eram autistas poderiam se comunicar entre si e sentir um novo senso de pertencimento e identidade".

Ainda assim, para Catherine Lord, psicóloga da UCLA, que desenvolveu ferramentas de diagnóstico e estudos longitudinais para o autismo, a matemática simplesmente não está funcionando. "Parte disso é claramente devido à maior conscientização e inclusão mais ampla", argumenta.

Mas mesmo que esses sejam os maiores fatores que impulsionam o aumento, e mesmo que fatores biológicos e ambientais estejam contribuindo também, Lord ressalta que "parece um pouco exagerado pensar que tudo isso soma ao aumento."

Ela está confiante, no entanto, a partir de dados abundantes tanto nos EUA quanto no exterior, que a maior prevalência de autismo não corresponde às imunizações infantis. "Seja o que for", acrescentou, "não são as vacinas."

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