Como "reforma", porém, as medidas anunciadas podem até significar um retrocesso. Para começar, se todo reforma deve começar pela simplificação, esta vai na direção da complicação, tal as exceções e critérios específicos de que lança mão. Depois, o conjunto é qualquer coisa menos integrado e estrutural, o que pode significar a necessidade de correções complexas no futuro.
Em relação às contas de chegar mencionadas, a primeira delas limitou a isenção do IR a faixas mais baixas da tabela progressiva do IR, sem considerar o "progressivo" da tabela. A isenção alcançou integralmente rendas até R$ 5 mil e parcialmente, de R$ 5,001 mil a R$ 7 mil, com rendimentos acima de R$ 7 mil excluídos do benefício. Com o artifício, incomum no mundo da tributação do IR, foi possível limitar as perdas de arrecadação a R$ 25 bilhões em 2026 e R$ 28 bilhões em 2027.
Se, ao determinar isenção para rendas até R$ 5 mil, fosse aplicada normalmente a tabela progressiva, a própria Receita calcula que a perda de receitas chegaria a R$ 120 bilhões em 2026. A diferença de R$ 90 bilhões é o montante de uma dessas contas de chegar. O mesmo ocorreu no lado da taxação compensatória de altas renda.
A taxação de altas rendas, conforme estimativas da Receita, será também próxima a R$ 25 bilhões em 2026. Para isso, vários limites de tributação e abatimentos foram mantidos. Também foram mantidas isenções de IR sobre papéis financeiros — letras imobiliárias e do agronegócio, por exemplo — e outras rendas — ganhos de capital, heranças e doações. Sobrou mesmo o início, necessário, da tributação de lucros e dividendos.
Não seria necessárias as voltas ao mundo que o projeto do governo dá para restringir perdas tributárias — restringindo também as compensações, se não houvessem restrições políticas tão potentes a reformas no injusto e ineficiente sistema tributário brasileiro.
A simples correção monetária da tabela progressiva do IR promoveria a isenção de rendas até R$ 5 mil, mantendo a desejável progressividade da tributação das diversas faixas de rendas. Nem se está falando na criação de mais uma ou duas faixas de renda, com alíquotas acima da de 27,5% hoje máximo, entre 30% e 35%, por exemplo, que talvez já compensasse as perdas de arrecadação, sem falar na tributação de ganhos hoje isentos, como lucros e dividendos.