O MPF (Ministério Público Federal) abriu uma investigação para apurar a conduta do Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo) em uma ofensiva contra médicos do Hospital Maternidade Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte da capital paulista, que realizaram abortos legais em mulheres vítimas de estupro.
Ao menos três profissionais estariam sendo perseguidos pelo Cremesp, que chegou a decidir pela suspensão cautelar de duas médicas que realizaram aborto legal na unidade.
Também está em curso no MPF uma investigação criminal para apurar se houve acesso ilegal do Cremesp a prontuários de pacientes que fizeram aborto na unidade. "As investigações estão em andamento, não sendo possível fornecer mais detalhes", afirmou o MPF, em nota.
Procurado pela reportagem, o Cremesp não se pronunciou até a publicação deste texto. Também não respondeu se os médicos alvo de sindicância seguem trabalhando ou foram afastados.
Questionada sobre a entrega das informações dos pacientes ao conselho, a Secretaria Municipal da Saúde afirmou que "atendeu à disposição legal do Conselho Regional de Medicina, após fiscalização, no cumprimento da Lei 3.268/57, o que resultou na entrega dos prontuários garantido o sigilo médico e em meio adequado, nos termos do Código de Ética Médica".
Segundo noticiado pela Folha em abril, no entendimento de integrantes do Cremesp, os profissionais teriam praticado tortura, tratamento cruel, negligência, imprudência e assassinato de fetos —ainda que embriões não tenham direitos previstos pela Constituição e que todos os procedimentos estivessem dentro da lei, respeitando as práticas médicas indicadas.
Atualmente, o aborto é considerado legal no Brasil em três casos: gravidez decorrente de estupro; feto anencéfalo; e quando há risco de morte materna, não sendo estabelecido, em lei, um limite gestacional para o procedimento. Os atendimentos feitos pelos profissionais do Hospital Vila Nova Cachoeirinha estavam relacionados a mulheres vítimas de violência sexual e com gestações superiores a 22 semanas.
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Em dezembro de 2023, o hospital Vila Nova Cachoeirinha, até então referência no serviço de aborto legal, encerrou os atendimentos de interrupção da gravidez.
Na ocasião, a justificativa foi de que era necessário dar espaço a uma demanda reprimida de cirurgias envolvendo a saúde da mulher e que o hospital seria o mais adequado para operações de endometriose. Hoje, mesmo com a fila da endometriose zerada, porém, não há previsão de que o serviço de aborto legal seja retomado na unidade.
De acordo com a Secretaria Municipal da Saúde, o Hospital Vila Nova Cachoeirinha "neste momento está referenciado para a realização de cirurgia intrauterina (cirurgia no feto por questões congênitas) e de procedimentos voltados à saúde da mulher na cidade".
A pasta afirmou ainda que os abortos previstos em lei são oferecidos no hospital Dr. Cármino Caricchio (Tatuapé), Hospital Municipal Dr. Fernando Mauro Pires da Rocha (Campo Limpo), Hospital Municipal Tide Setúbal e Hospital Municipal e Maternidade Prof. Mário Degni (Jardim Sarah).
Na avaliação de especialistas, contudo, a manutenção do serviço de aborto legal não atrapalharia o fluxo de cirurgias no Vila Nova Cachoeirinha.