Parlamentares e lideranças políticas de diferentes países do mundo lançarão nesta sexta-feira (20) uma carta em que condenam a manutenção de Cuba na lista de Estados que, segundo o governo dos EUA, patrocinariam o terrorismo ao redor do mundo.
A iniciativa reúne a assinatura de cerca de 600 representantes de 73 nações diferentes, incluindo o Brasil, que cobram de seus governos esforços diplomáticos em prol de uma reavaliação. Para os signatários, a classificação de Washington é "cínica, cruel e uma clara violação do direito internacional".
A ilha chegou a ser formalmente retirada da lista pelo governo Barack Obama, em 2015, em um passo importante para a retomada dos laços entre os dois países depois de décadas de rompimento. Em 2021, porém, o então presidente Donald Trump voltou a incluir Cuba na relação às vésperas de deixar o cargo.
"Como candidato, Joe Biden prometeu restaurar o relacionamento diplomático fomentado por seu antecessor democrata. Mas, como presidente, Biden renegou [o compromisso]", diz a carta, que foi articulada pela aliança global progressista Progressive International.
Em maio deste ano, os EUA retiraram Havana da lista de Estados que não cooperariam totalmente com a luta contra o terrorismo, em um dos poucos acenos da gestão Biden.
Para os cerca de 600 parlamentares que assinam a carta, a medida é insuficiente. "Cuba continua a sofrer como resultado de sua exclusão cínica, cruel e ilegal da economia internacional", afirmam. O democrata não aliviou as sanções ou o embargo histórico, que já dura mais de 60 anos.
Na avaliação dos signatários, a designação de Cuba como país que patrocina o terrorismo seria cínica porque a ilha comunista tem atuado como mediadora nas negociações de paz entre Colômbia, a guerrilha ELN (Exército de Libertação Nacional) e as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
"As negociações atuais marcam uma década desde que Cuba reuniu os estados-membros da Celac [Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos] para declarar a região como uma zona de paz, 'com base no respeito aos princípios e regras do direito internacional'", diz o texto.
A carta ainda afirma que a classificação também seria ilegal por ferir a soberania cubana e o princípio da solução pacífica de controvérsias internacionais.
"Sublinhamos a urgência de retirar Cuba da lista de 'patrocinadores estatais do terrorismo' em nome da dignidade, decência e da integridade da Carta da ONU —e pedimos aos nossos governos que utilizem todos os meios diplomáticos para corrigir essa grave injustiça em curso", dizem parlamentares e líderes.
Entre os que assinam o documento estão o ex-líder do Partido Trabalhista do Reino Unido Jeremy Corbyn, o líder do partido alemão Die Linke, Martin Schirdewan, a secretária-geral do partido mexicano Morena, Citlalli Hernández, o ex-presidente da Guiana Donald Ramotar, a líder do partido espanhol Podemos, Ione Belarra, o deputado francês Arnaud Le Gall e a senadora colombiana Clara López Obregón.
Do Brasil, assinam os deputados federais Luiza Erundina (PSOL-SP), Sâmia Bomfim (PSOL-SP), Jandira Feghali (PC do B-RJ), Orlando Silva (PC do B-SP), Talíria Petrone (PSOL-RJ), Célia Xakriabá (PSOL-MG) e Jorge Solla (PT-BA), entre outros.
Leia, abaixo, a íntegra da carta:
"Nós, os parlamentares abaixo assinados de todo o mundo, condenamos a designação de Cuba como 'patrocinador estatal do terrorismo' e pedimos aos nossos respectivos governos que tomem medidas imediatas para defender sua remoção.
A designação dos Estados Unidos de Cuba como 'patrocinador estatal do terrorismo' é cínica, cruel e uma clara violação do direito internacional.
A designação, removida em 2015 após uma avaliação minuciosa pela administração Obama, foi reaplicada a Cuba nos últimos dias da presidência de Trump como um ato final em sua campanha de guerra econômica contra a ilha. Como candidato, Joe Biden prometeu restaurar o relacionamento diplomático fomentado por seu predecessor democrata. Mas, como presidente, Biden renegou —mesmo depois que o governo colombiano retirou as acusações de extradição contra membros do Exército de Libertação Nacional (ELN): a justificativa original de Trump para reaplicar a designação de 'patrocinador estatal'.
A designação é, portanto, cínica porque Cuba —longe de patrocinar o terrorismo— tem atuado como um mediador-chave nas negociações de paz entre o governo colombiano, o ELN e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). As negociações atuais marcam uma década desde que Cuba reuniu os estados-membros da Celac para declarar a região como uma Zona de Paz, "com base no respeito aos princípios e regras do Direito Internacional".
A designação é cruel porque visa maximizar o sofrimento do povo cubano, estrangulando sua economia, deslocando suas famílias e até restringindo o fluxo de ajuda humanitária. Segundo especialistas das Nações Unidas, a designação prejudicou 'direitos humanos fundamentais, incluindo o direito à alimentação, direito à saúde, direito à educação, direitos econômicos e sociais, direito à vida e direito ao desenvolvimento'.
Finalmente, a designação é ilegal porque mina 'o princípio da igualdade soberana dos Estados, a proibição de intervir nos assuntos internos dos Estados e o princípio da solução pacífica de controvérsias internacionais', segundo especialistas jurídicos da ONU. As sanções extremas e extraterritoriais desencadeadas pela designação, portanto, marcam uma clara violação do direito internacional.
Em maio de 2024, o Departamento de Estado dos EUA finalmente retirou Cuba da lista de estados que 'não estão totalmente cooperando' com os Estados Unidos em esforços de contraterrorismo. Mas isso não é suficiente. Cuba continua a sofrer como resultado de sua exclusão cínica, cruel e ilegal da economia internacional.
Com esta carta, sublinhamos a urgência de retirar Cuba da lista de 'patrocinadores estatais do terrorismo' em nome da dignidade, decência e da integridade da Carta da ONU —e pedimos aos nossos governos que utilizem todos os meios diplomáticos para corrigir essa grave injustiça em curso."
com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH