O Ministério da Cultura bloqueou recursos do comitê de cultura do Amazonas após Anne Moura, atual secretária nacional de Mulheres do PT, ter sido acusada de tentar usar a verba pública do comitê para promover sua campanha eleitoral para vereadora em Manaus, no ano passado. O bloqueio foi feito no dia 21 de fevereiro, segundo o MinC.
As acusações vieram à tona após a publicação, no jornal O Estado de S. Paulo, de gravações de uma conversa de Moura com um ex-chefe do comitê, na qual ela afirma que ele não estaria a ajudando em sua campanha.
No áudio, ela relata um suposto diálogo que teria tido com Roberta Martins, secretária dos comitês de cultura do MinC. Moura diz que Martins teria perguntado se o comitê de cultura a estava ajudando em sua campanha eleitoral, como estariam fazendo outros comitês pelo país, e a então candidata lamenta que não.
Moura chama as acusações feitas pelo ex-chefe do comitê do Amazonas de "declarações distorcidas com a única finalidade de macular a minha imagem perante a opinião pública". Já o Ministério da Cultura diz estar apurando o caso, afirma não ter encontrado irregularidades até agora e que a suposta conversa relatada na gravação, entre Moura e Martins, nunca ocorreu.
"Anne Moura não é membro do comitê de cultura do Amazonas, nunca integrou sua equipe e não participou de qualquer processo relacionado ao Ministério da Cultura ou à seleção do edital de projetos", afirma o ministério, em nota.
A Folha apurou que Moura conversava com Marcos Rodrigues, ex-diretor presidente do Instituto de Articulação de Juventude da Amazônia, o Iaja, que foi desligado da instituição em fevereiro deste ano. Ele afirma que todas as ações da instituição tinham o aval de Moura nos bastidores e que as acusações de assédio moral são um desentendimento pessoal entre os dois.
Durante a corrida eleitoral do ano passado, o perfil oficial do comitê repostou, no Instagram, vídeos da campanha de Anne Moura para vereadora. Rodrigues afirma que a coordenação de comunicação do comitê de cultura do Amazonas tinha autonomia na decisão das postagens das redes sociais da organização.
Procurado, o jornalista responsável pelas redes do Iaja disse que as postagens foram um erro. Por ser um profissional que atua como pessoa jurídica, ele atende vários clientes e postou na conta errada, diz.
Comitês de cultura são núcleos que promovem a divulgação de políticas culturais, atividades de mobilização social e formação em direitos e políticas culturais, além de apoio à elaboração de projetos e parcerias. São geridos por entidades privadas escolhidas por meio de editais e, segundo as diretrizes, os conteúdos publicados devem ter apenas caráter educativo, não político-partidário. Apesar de não poderem ser considerados órgãos governamentais, os comitês ficam sob o guarda-chuva do Ministério da Cultura.
A entidade privada que venceu o edital para executar as atividades do comitê de cultura do Amazonas foi o Iaja, fundado por Moura. Os comitês integram o Programa Nacional de Comitês de Cultura (PNCC), instituído pelo governo Lula em 2023. O programa seleciona organizações em todos os estados brasileiros e distrito federal. A previsão é que o custo do programa, entre 2024 e este ano, chegue a R$ 58,8 milhões.
Brasília Hoje
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Moura e Rodrigues eram aliados políticos desde a época em que ambos participavam da Juventude do PT, mas romperam a relação de amizade no fim do ano. A conversa teria sido gravada durante a corrida eleitoral do ano passado.
Moura afirma, em nota, que se reuniu "com este senhor [Marcos Rodrigues], mas nunca no sentido de interferir na condução administrativa do comitê de cultura."
Segundo ela, o ex-chefe tratou o projeto "de forma personalista e inconsequente, tomando decisões sem consultar os demais membros do Iaja e do próprio comitê de cultura, não se reportou ao conselho fiscal, sendo por isso questionado pelos associados e por mim".
Ela diz que esse comportamento foi um dos motivos que levaram o ex-presidente a ser destituído do cargo, além disso ele teria sido alvo de denúncias de assédio moral a membros associados e colaboradores de projetos.
Marcos afirma que todas as decisões no Iaja tinham que passar pelo aval de Anne, nos bastidores, e que a acusação de assédio moral na verdade foi um desentendimento pessoal entre os dois.
Depois de o episódio vir à tona, o Tribunal de Contas da União abriu uma representação sobre suposto uso indevido de recursos públicos do Programa Nacional de Comitês de Cultura em candidaturas eleitorais.
O deputado Kim Kataguiri entrou com representação, nesta segunda (10), pedindo que o Ministério Público Federal apure possíveis ilícitos cometidos por Anne Moura. Ele pede ainda auditoria imediata nos gastos do Programa Nacional de Comitês de Cultura (PNCC).